Luís Montenegro e Miguel Pinto Luz desembarcaram da viagem das diretas no mesmo terminal, o da derrota. Mas com uma diferença: um apareceu no congresso na zona das partidas, pronto para embarcar num voo de ligação; o outro apareceu na zona das chegadas, conformado com o regresso a casa.

A despedida (antes de se resguardar na qualidade de militante de base) foi longa e penosa, com direito a vaias, a apupos e aos primeiros acordes da música para ajudar à retirada. A sala encheu e parou, gelada, para o ouvir. Nem podia ser de outra maneira. Se há dois anos Luís Montenegro encheu o peito para dizer que não ia pedir licença a ninguém quando quisesse avançar, agora, depois de ter perdido para Rio, teve de se ficar por um difícil exercício de equilibrismo: de um lado, os 47% e os militantes que votaram nele e que esperavam ouvir rugidos de leão; do outro, a necessária humildade que se impõe a quem perdeu o combate. A formulação que encontrou foi algo a meio caminho: ‘vou sair, sim, mas ninguém me vai calar’. E o congresso bem tentou.

Luís Montenegro falou durante 17 minutos — em teoria, os congressistas só têm três para falar, mas, manda a tradição que os candidatos a líder sejam imunes às regras estritas dos tempos. Pediu tolerância à mesa, “pelos motivos óbvios”, mas a mesa, liderada por Paulo Mota Pinto, foi implacável. À medida que os minutos passavam, a plateia ia soltando interjeições e algumas vaias. “Uhhh”, ouviu-se uma vez. “Chega!”, ouviu-se outra. Enquanto isso, Montenegro ia prosseguindo o seu equilibrismo. Deixou recados a Rio — dizendo que “devemos exigir de nós próprios aquilo que exigimos dos outros” no que à unidade e à lealdade diz respeito — ao mesmo tempo que admitiu que o partido “precisa de tolerância e de respirar liberdade”. Fez o seu mea culpa, q.b., mas exigiu o mesmo do outro lado da barricada.

Num tom calmo, pacífico, quase de despedida, Montenegro pareceu disposto a partir em paz (para já). No final, recorreu a Sá Carneiro para dizer que não ia andar por aí, mas que se o vissem por aí, não o iriam ver calado: iria andar “longe dos cargos partidários e públicos, mas sempre perto para ajudar o partido”. “O que não posso, porque não tenho esse direito, é calar-me sob que pretexto for”, disse. Por esta altura já Paulo Mota Pinto lhe cortava a palavra, e já a organização do congresso carregava no play para fazer soar a música que marca a transição entre as intervenções. Luís Montenegro saiu como quis: com o congresso dividido entre vaias e aplausos. A resistência vive.

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Pinto Luz contra os senadores na reserva

Caso diferente foi o de Miguel Pinto Luz, o outro candidato a líder que, com apenas 9% na bagagem (muito longe dos 47% de Montenegro), apareceu no palco do congresso mais solto, e mais leve, para falar. A verdade é que, ao contrário de Montenegro, o autarca de Cascais não tinha partido para as diretas com a obrigação de ganhar. A obrigação era a de conquistar notoriedade, e por isso até pode cantar ‘missão cumprida’. Foi precisamente essa a ideia que Pinto Luz quis levar ao congresso: dizer que ele, ao contrário de outros que se dizem “senadores”, deu o corpo às balas, e essa medalha ninguém lhe tira. “Fui lá, estive lá, disse presente, porque acredito neste PSD, nos seus ideias e valores, tenho um profundo orgulho na nossa história e na capacidade do PSD de reformar o país e melhorar a vida dos portugueses”, começou por dizer, contrapondo depois com “outros que preferiram ficar na reserva”.

A crítica velada era para aqueles que, não tendo ido a jogo agora, ainda sonham secretamente em ir a jogo numa próxima oportunidade. Sem dizer nomes, Pinto Luz teria na cabeça nomes como os de Jorge Moreira da Silva, Miguel Poiares Maduro ou Carlos Moedas, que chegaram a ser falados numa primeira fase, mas não passaram daí. Talvez por saberem que iriam perder.  “Não podemos olhar para esta eleição com olhar cínico e tático, para depois saírem da reserva os que lá se auto-colocaram para apontarem o dedo aos outros que disseram presente. Alguns querem ser senadores sem nunca terem saído da reserva, mas são senadores simplesmente porque entendem que sim”, disse.

Pinto Luz acabou de chegar de uma viagem derrotado, mas, ao contrário de Montenegro, já tem os olhos na próxima. “As eleições já lá vão, Rio foi eleito por isso quero falar-vos de futuro”. Terminou como começou: com os olhos postos no voo de ligação. Estas diretas eram só uma escala, o destino ambicionado é outro.