“Disseram-me que só tinha 45 segundos aqui em cima, que são mais 45 segundos que o Senado deu ao John Bolton esta semana”. Foi com um uma referência irónica ao processo de impeachment contra o presidente norte-americano Donald Trump que Brad Pitt aceitou o primeiro Óscar que venceu enquanto ator.

John Bolton era conselheiro de segurança nacional de Donald Trump e, nos rascunhos de um livro que publicará e a que o The New York Times teve acesso, admite ter recebido ordens diretas do presidente dos Estados Unidos para telefonar a Volodymyr Zelensky e pressionar a Ucrânia para investigar os democratas em maio do ano passado.

O problema, como apontou Brad Pitt, é que, apesar disso, ninguém o chamou a depor no Senado, que acabou por decidir pela desistência do impeachment.

Sabia-se que, se Brad Pitt vencesse o Óscar de Melhor Ator Secundário, a entrega do prémio viria com um bónus: um discurso inspirado e humorístico, como os que o ator norte-americano já tinha feito noutras cerimónias de reconhecimento da sétima arte. As piadas não foram tão imediatas (nem tão inspiradas) como nos Globos de Ouro, mas haviam de chegar.

PUB • CONTINUE A LER A SEGUIR

Antes, no entanto, a mensagem política de Brad Pitt foi recebida com aplausos. E perante o entusiasmo do público, lançou um desafio ao realizador de “Era Uma Vez… em Hollywood”, o filme que lhe valeu uma segunda nomeação vitoriosa nos Óscares: “Estou aqui a pensar que talvez o Quentin faça um filme sobre isso. E, no fim, os adultos fazem a coisa certa”.

As críticas à falta de mulheres nomeadas nos Óscares

Foi uma mensagem que começou na passadeira vermelha e se prolongou ao longo de toda a cerimónia, com mais ou menos humor, mas sempre em tom de crítica.

Natalie Portman foi a anfitriã do movimento. A atriz norte-americana com raízes israelitas recordou os nomes de realizadoras que não foram nomeadas para os Óscares. É o caso de Lorene Scafaria, que fez “Hustlers”, Lulu Wang, realizadora de “A Despedida”, e Greta Gerwig, que fez “Mulherzinhas”, nomeado para Melhor Filme.

A mesma chamada de atenção foi dada por Steve Martin e Chris Rock na atuação de abertura da cerimónia dos Óscares. Quando o ator de “Cruel Shoes” comentou que havia “tantos grandes realizadores nomeados este ano, mas há alguma coisa que está a falhar”, Chris Rock aproveitou a deixa e deixou uma pergunta no ar: “Vaginas?”.

O tema foi recordado novamente pelo ator Mark Ruffalo, que lembrou que muitos dos filmes que fizeram o ano de 2019 foram “realizados ou co-realizados por mulheres”.

Antes, no entanto, a grande interpretação de Maya Rudolph e Kristen Wiig, que não se limitaram a introduzir a categoria de Melhor Guarda Roupa. Depois de longos segundos a simularem estar chateadas e amarguradas, as duas mudaram de semblante e ironizaram: “Sabem o que estamos a fazer? A atuar. Somos atrizes. E não fazemos apenas comédia. E como aqui há tantos realizadores…”.

Joaquín Phoenix apelou ao “amor e compaixão”

Após ter ganho o Óscar de Melhor Ator Principal graças à interpretação em Joker — foi o segundo ator a ganhar a estatueta após dar vida à personagem da DC Comics — Joaquín Phoenix falou durante longos minutos sobre todos os problemas que assolam a sociedade. Agradeceu a oportunidade de “usar a voz pelos que não a têm”, criticou a forma como os seres humanos se “desconectaram do mundo natural” e com a sua “visão egocêntrica” acreditaram que são “o centro do universo”.

Apesar de concordar que há várias comunidades pelo mundo preocupadas com assuntos diferentes, desde as alterações climáticas aos direitos civis, o ator diz encontrar um elo que as liga a todas: “Quer estejamos a falar de género, de desigualdades, de racismo, do que for, estamos a falar de lutas contra injustiças”, resume, apelando a que se use “o amor e compaixão como princípios”.

E fala contra ele próprio, alerta: “Tenho sido egoísta, tenho sido cruel por vezes, alguém com quem é difícil trabalhar e que não é grato. Mas muitos de vocês nesta sala deram-me uma segunda oportunidade”. No fim, citou uma letra escrita pelo ator River Phoenix, o irmão de Joaquín Phoenix que morreu em 1993, aos 23 anos.