Sobram seis. Do onze inicial do Ajax que na temporada passada disputou as meias-finais da Liga dos Campeões com o Tottenham, onde acabaram por perder depois de uma reviravolta inacreditável dos ingleses, sobram seis jogadores: o guarda-redes Onana, os defesas Veltman, Blind e Tagliafico, o médio Van de Beek e os avançados David Neres e Tadic. De Jong saiu para o Barcelona, De Ligt para a Juventus, Schöne para o Génova e o Chelsea confirmou esta semana a contratação do marroquino Ziyech. Um assalto ao clube holandês que se pode tornar ainda maior no verão mas que não é inédito.

Onana interessa ao Chelsea, onde Lampard não tem a melhor impressão de Kepa, Van de Beek continua na agenda do Real Madrid e David Neres tem mercado na Europa. Além disso, e no restante plantel, Wöber saiu para o Sevilha, Sinkgraven para o Bayer Leverkusen, Nissen para o Salzburgo e Dolberg para o Nice. Um cenário que recorda o que aconteceu nos anos 90 no Ajax, em 1995 e 1996, anos em que o clube holandês chegou a duas finais consecutivas da Liga dos Campeões (ganhou uma, perdeu outra): nesses dois anos, a equipa de Amesterdão perdeu Seedorf, Rijkaard, Davids, os irmãos Kanu e Reiziger. 15 anos depois, o cenário repete-se no Ajax.

O onze do Ajax nas meias-finais da Liga dos Campeões da temporada passada: Onana e Van de Beek podem ser os próximos a sair

O último a sair, Hakim Ziyech, foi parte importante da equipa de Erik ten Hag que na temporada passada foi a sensação da Liga dos Campeões e ficou a um passo da final europeia que já escapa precisamente desde 1996. Esta quinta-feira, Chelsea e Ajax confirmaram a ida do avançado para a Premier League a troco de mais de 30 milhões de euros, naquela que será a primeira aventura do marroquino de 26 anos fora do país onde nasceu. O mais novo de nove irmãos, Ziyech nasceu em Dronten, na Holanda, no seio de uma família de imigrantes de Marrocos. O pai morreu quando o jogador era ainda criança e o futebol rapidamente se tornou uma possibilidade de futuro para a família — ainda que, na altura, as esperanças caíssem em dois dos irmãos do pequeno Hakim, que jogavam nas camadas jovens de clubes locais.

PUB • CONTINUE A LER A SEGUIR

As carreiras dos irmãos acabaram por não ter grande futuro e Hakim, que entretanto tinha começado a jogar no Reaal e no ASV, teve a primeira grande oportunidade aos 14 anos, quando integrou a formação do Heerenveen. Estreou-se na equipa principal com apenas 19 anos e saltou para o Twente e para a primeira liga holandesa em 2014 (onde se cruzou com o ex-Sporting Castaignos e ainda com Jesús Corona, atualmente no FC Porto). Naquela altura, o Twente atravessava uma crise financeira sem precedentes que deixava o clube à beira da falência — nos dois anos que passou no emblema e com apenas 21 anos, Ziyech acabou por assumir a braçadeira de capitão e ser a cara da equipa, respondendo a perguntas sobre a situação económica e a estratégia desportiva em conferências de imprensa, tomando praticamente o lugar da direção. Uma situação que acabou por revelar-se insustentável.

Figura maior da equipa, tanto dentro do relvado como fora dele, Ziyech acabou por perder a braçadeira de capitão quando criticou publicamente a forma como o Twente estava a ser gerido e exigiu uma transferência. A saída apareceu em 2016, quando marroquino se mudou para um Ajax em processo de transformação. Os primeiros tempos em Amesterdão voltaram a não ser fáceis, com Ziyech a servir de bode expiatório dos adeptos para justificar os desaires do Ajax e a inevitável inferioridade face ao rival PSV, mas as exibições na Liga dos Campeões da época passada e a conquista do Campeonato — para além do atual primeiro lugar que deixa sonhar com o bicampeonato que não acontece há seis anos — tornaram-no um dos favoritos das bancadas da Johan Cruyff Arena. Na temporada passada, marcou 22 golos; este ano, já leva oito: para além de que, em quatro anos, criou mais de 400 oportunidades de golo para o Ajax, mais 134 do que qualquer outro jogador na liga holandesa.

O avançado, que defrontou Portugal na fase de grupos do Mundial 2018, escolheu representar a seleção marroquina depois de ter sido internacional pela Holanda nas camadas jovens. No Chelsea e na Premier League, Ziyech vai tentar ser a necessária fonte de criatividade e dar razão a todos aqueles que disseram que era ele quem permitia a De Jong, De Ligt e companhia brilharem. E também aos que dizem que, aconteça o que acontecer, é “inquebrável”. “Aos meus olhos, ele é inquebrável. Passou por muito na vida dele e depois teve um início difícil no Ajax. Deixou os pés falarem por ele e lidou com tudo ao seu próprio ritmo. Acho que foi isso que o tornou o que é agora”, disse Marcel van der Kraan, um jornalista holandês.