O advogado de Armando Vara aproveitou o seu momento para explicar ao juiz Ivo Rosa por que não deve levar o seu cliente a julgamento para mandar alguns recados ao procurador do Ministério Público (MP). Rosário Teixeira alegou na última sessão, ao longo de cerca de quatro horas, e esta sexta-feira não está presente na sala de audiências do Campus de Justiça em Lisboa. Mas está o colega, o procurador Vítor Pinto.

“As alegações do senhor procurador denotam uma grande pessoalização neste processo”, disse o advogado Tiago Rodrigues Bastos que lembrou, também, ao magistrado que “ele representa a atuação da justiça e não se pode anular de acordo com os seus gostos”. Em defesa de Armando Vara, o advogado também mostrou não ter gostado que o procurador referisse o processo “Face Oculta”, no qual Vara está a cumprir uma pena de cadeia, durante as suas alegações finais — em que o MP pediu que o caso seguisse para julgamento por ter muitas provas que não foram mostradas nesta fase.

“O que espero do tribunal é que se vá aplicando o direito, a evocação que foi aqui feita no Face Oculta é que o direito conta pouco. Nós não gostamos de Armando Vara, não gostamos do engenheiro Sócrates … Eu diria que em cada momento, em cada processo, em cada decisão, fazemos uma opção pelo tipo de sociedade em que estamos a viver”, alertou.

Para depois se virar para o juiz Ivo Rosa com uma demonstração e confiança. “Confio na sua capacidade e resiliência para não deixar passar este ato que é da maior razoabilidade”, disse.

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Armando Vara é acusado de um crime de corrupção passiva um crime de corrupção passiva em regime de coautoria com José Sócrates, de dois crimes de fraude fiscal qualificada e de dois crimes de branqueamento de capitais. Segundo  acusação, Vara terá falado com o então primeiro-ministro José Sócrates sobre a possibilidade da CGD vir a fazer o financiamento de um empreendimento em Vale do Lobo, no Algarve. Diz o Ministério Público que Vara transmitiu, por isso, a José Sócrates que, caso a CGD fizesse o financiamento, os investidores Diogo Ferreira e Rui Horta e Costa estava dispostos a pagar uma contrapartida, que dividiriam entre os dois. José Sócrates terá respondido a Vara que o apoiaria o investimento politicamente (até junto da restante administração, se fosse necessário). “A acusação a momento algum descreve como foi traduzido esse apoio político”, criticou o advogado.

“O crime de corrupção não tem ponta por onde se lhe pegue”, alega o advogado, que lembra que Sócrates nem sequer estava de acordo com a escolha de Armando Vara para a Caixa Geral de Depósitos, contestando assim a tese que o lugar ocupado por Vara não partiu de um plano traçado entre dois.

Armando Vara está a cumprir pena no Processo Face Oculta, mas prestou declarações durante a instrução do processo

Usando também uma expressão usada por Rosário Teixeira ao definir o papel do vice-presidente do Grupo Lena no processo, chamando-o de “estúpido útil”, por ter aberto contas nas Suíças para que outros ali movimentassem dinheiro, o advogado de Vara disse não se sentir “estúpido útil por não ter utilidade nenhuma”, mas admitiu ter “um sentimento estúpido porque Rosário Teixeira também não percebe o que está na acusação”.

Tiago Rodrigues Bastos, que foi breve nas alegações, aproveitou mais uma vez para falar na questão da distribuição do processo em 2014 a um juiz de instrução, no caso Carlos Alexandre. “O processo é do Ministério Público e não da instrução criminal”, considerou. Já no requerimento de abertura de instrução o advogado defendeu que o processo não podia estar nas mãos de um juiz nesta fase, mas que devia ser distribuído a cada vez que era preciso o juiz intervir. “Nós temos  o direito um juiz que nos calhe na rifa, que nos calhe na sorte”, disse, lembrando notícias recentes que dão conta de problemas ainda maiores, referindo-se aos acórdãos do Tribunal da Relação cuja distribuição está sob suspeita.

Operação Marquês. Requerimento de Vara pede afastamento Carlos Alexandre

“É uma filha, de 20 anos, a quem o pai pede para figurar na conta bancária”, diz a defesa de Bárbara Vara

Este é o terceiro dia do processo da Operação Marquês no Campus de Justiça, em Lisboa, e arrancou com as alegações finais do advogado de Bárbara Vara. “Aquilo que se passou é aquilo que as regras comuns apontam como normais, é uma filha, de 20 anos, a quem o pai pede para figurar na conta bancária”, disse João Lima Cluny. A filha de Armando Vara foi também a primeira a prestar declarações durante esta fase de instrução, que terminará com a decisão do juiz Ivo Rosa em levar ou não o caso a julgamento. Perante o juiz, Bárbara Vara disse o que já tinha dito em primeiro interrogatório judicial: que confiava no seu pai e nada sabia sobre a origem dos cerca de 2 milhões de euros que ele angariou numa conta bancária na Suíça aberta em nome de uma sociedade offshore formalmente controlada por Bárbara Vara.

“Era o pai que estava autorizado a movimentar a conta e é o próprio Ministério Público que diz que ele movimentou a conta. Sempre”, acrescentou o advogado.

Bárbara Vara é acusada de um crime de branqueamento em coautoria com os arguidos José Sócrates, Carlos Santos Silva, Joaquim Barroca, Armando Vara, Diogo Gaspar Ferreira e Rui Horta e Costa. Mas segundo o advogado, o seu nome é apenas referido nesta parte da acusação, não se especificando depois como foi feito esse acordo — que será  relativo à intervenção da Caixa Geral de Depósitos nos financiamentos ao Grupo Vale do Lobo. Financiamento que terá resultado no pagamento de luvas de dois milhões de euros a dividir por Armando Vara e José Sócrates. Estas compensações foram pagas pelo holandês Van Dooren, passaram por uma conta na Suíça em nome de Barroca e só depois chegaram a uma conta indicada pelo empresário Carlos Santos Silva (que se destinava a Sócrates) e a outra indicada por Armando Vara — que terá sido a da Vama holding.

“A nossa constituinte está aqui apenas por ter aceite figurar na empresa. E só o fez a pedido do pai. E a partir daí não teve qualquer intervenção, nem na conta bancária”, alegou.

A filha de Armando Vara, Bárbara Vara, à porta do Tribunal Central de Instrução Criminal

É também acusada de um segundo crime de branqueamento relativamente a um apartamento que detinha em Lisboa. Diz o Ministério Público que o negócio feito com esta casa serviu para branquear parte do milhão de euros depositado na Vama, mas a defesa garante — no requerimento de abertura de instrução — que a arguida se limitou a permutar o apartamento e a pagar a diferença com um crédito que contraiu na Caixa Geral de Depósitos. Desconhecendo por completo qual a origem do dinheiro que o pai usou para comprar o referido apartamento — uma justificação contestada esta quinta-feira pelo procurador do Ministério Público, Rosário Teixeira que disse que a arguida “tinha perfeita consciência” deste negócio. “Não podemos hoje dizer que a nossa constituinte tinha alguma razão para desconfiar do pai”, disse o advogado.

João Lima Cluny terminou as alegações a pedir ao juiz Ivo Rosa que não leve Bárbara Vara a julgamento, sob pena de se cometer uma “injustiça”.

Operação Marquês. “Há um conjunto de explicações que merecem cabal esclarecimento”, diz procurador

Ex-mulher de Sócrates aceitou proposta de trabalho de amigo

O advogado da ex-mulher de José Sócrates, Paulo Sá e Cunha, falou depois da defesa de Armando Vara. Começou por criticar o facto de o nome de Sofia Fava ser várias vezes referido na acusação, para depois haver poucas explicações do que fez. “Compreendo que seja difícil de escrever e de ler a acusação”, ironizou, para depois dizer que contra a sua cliente “não há indícios de crime”.

Sofia Fava está acusada de dois crimes: um de branqueamento de capitais e outro de fraude fiscal. No primeiro crime em coautoria com o antigo governante e com Carlos Santos Silva. O Ministério Público diz que ela terá beneficiado de transferências de dinheiro de José Sócrates não declaradas às autoridades tributárias, tendo ainda recebido dinheiro de Carlos Santos Silva para pagar o Monte das Margaridas, verba essa que lhe foi dada após a simulação de uma relação de trabalho com empresas lideradas por este último, como a XLM – Sociedade de Estudos e Projetos Lda.

Mas Paulo Sá e Cunha contesta. Diz que a proposta de trabalho surgiu de uma amigo, pouco depois de ficar viúva do marido que teve depois de se separar de Sócrates. “É nesse contexto que lhe é feito um convite de um amigo para fazer trabalhos na sua área de especialidade . Não há aqui nada de bizarro nem de anormal. Isto é absolutamente comum”, disse. O advogado pede que Sofia Fava não seja levada a julgamento e que, no limite, haja uma suspensão provisória do processo em relação a ela.

Alegações da defesa de Granadeiro ficaram a meio, quase duas horas depois

Antes de começar a alegar, o advogado de Henrique Granadeiro deixou o aviso: normalmente dedica-se a processos cíveis e é raro ter processos criminais. Nuno Líbano Monteiro voltaria a pedir desculpa mais uma vez ao longo das alegações por estar a ser “maçador”.

O antigo presidente da comissão executiva e do conselho de administração da PT é acusado pelo Ministério Público (MP) de ter sido corrompido entre 2006 e 2011 por Ricardo Salgado para beneficiar o Grupo Espírito Santo (GES) na gestão da Portugal Telecom (PT). O MP acredita que este arguido beneficiou de 24 milhões de euros para ser opor à OPA da Sonaecom à principal operadora portuguesa, com o negócio da venda da Vivo e a entrada no capital social da empresa brasileira Oi. E acusa-o de oito crimes: um de corrupção passiva, dois de branqueamento de capitais, um de peculato, um de abuso de confiança e três de fraude fiscal qualificada.

Numa apresentação em PowerPoint o advogado explicou exaustivamente como entre a PT, o BES e a CGD havia uma parceria estratégica, que constava mesmo nos relatórios e contas da empresa. “O tema da OPA foi largamente debatido no Conselho de Administração da PT”, disse. Aliás, este tema foi muito “escrutinado” pela própria opinião pública, argumentou. E depois de ler vários testemunhos que falaram perante o juiz Ivo Rosa, mostrou como  a oposição à OPA se deveu apenas a uma questão: a do preço. “O próprio José Sócrates disse aqui que estava consciente que o preço oferecido não era suficiente”, disse Nuno Líbano Monteiro.

“Não receberam indicações do Governo no sentido de voto. Estavam ali para ganhar dinheiro”, disse.

Já perto das 19h00 o advogado acabaria por pedir ao juiz para continuar a alegar na segunda-feira, uma vez que ainda lhe falta falar sobre o negócio no Brasil e tecer algumas considerações jurídicas. Ivo Rosa concordou.

O MP acusou 28 arguidos, nove dos quais empresas, por 188 crimes. Em causa estão crimes de corrupção passiva e ativa, branqueamento de capitais, falsificação de documento e fraude fiscal qualificada, falsificação de documentos, abuso de confiança e peculato e posse de arma proibida.

O antigo primeiro-ministro José Sócrates, que prestou esclarecimentos adicionais na quarta-feira, é um dos arguidos e está acusado de 31 crimes: três crimes de corrupção passiva de titular de cargo político, 16 de branqueamento de capitais, nove de falsificação de documentos e três de fraude fiscal qualificada.

“Que credibilidade tem uma acusação destas? Bastaria ir ao Google”, disse José Sócrates