O espaço Schengen de livre circulação de pessoas cumpre na quinta-feira 25 anos, efeméride que se assinala da forma mais contraditória possível, com a generalidade das fronteiras entre os Estados-membros da UE reerguidas, devido ao surto de Covid-19.

Um quarto de século volvido sobre a entrada em vigor da primeira versão da Convenção de Schengen, 26 de março de 1995, que abrangia então apenas sete países, entre os quais Portugal, o espaço de livre circulação dentro da Europa, reconhecidamente uma das maiores histórias de sucesso do projeto europeu, está hoje basicamente suspenso, vítima do receio de propagação da pandemia da Covid-19, cujo epicentro atual é precisamente a Europa.

Muitos Estados-membros avançaram para a reintrodução de controlos fronteiriços internos de forma unilateral e descoordenada, apesar dos repetidos apelos da Comissão Europeia para uma abordagem comum e solidária que preservasse o mercado único e os direitos dos cidadãos comunitários, assistindo-se um pouco por toda a Europa a situações de bloqueio nas zonas fronteiriças, que abrangem inclusivamente europeus que tentam simplesmente regressar aos seus países de origem.

Portugal não foge à regra da reintrodução de controlos fronteiriços, mas a decisão de restringir a circulação na sua única fronteira interna, com Espanha, foi tomada de comum acordo entre o primeiro-ministro António Costa o e o presidente do governo espanhol, Pedro Sánchez, e comunicada a Bruxelas, ao contrário do verificado em diversos outros Estados-membros.

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Portugal e Espanha são dois dos países que integram desde o início o espaço Schengen, já que, apesar de o acordo inicial ter sido assinado em junho de 1985, por Alemanha, França, Bélgica, Holanda e Luxemburgo — na localidade luxemburguesa de Schengen –, a convenção, assinada cinco anos depois pelos mesmos cinco países, só entrou em vigor em março de 1995, e nessa data também Portugal e Espanha haviam assinado a adesão a esta iniciativa (em junho de 1991).

Esta terça-feira, 25 anos volvidos, mesmo estes sete países do primeiro espaço Schengen têm as fronteiras fechadas entre si, excluindo para deslocações consideradas “essenciais”, de trabalhadores transfronteiriços e para transporte de mercadorias e bens.

Desde 1995, o espaço Schengen foi-se expandindo, tendo o maior alargamento ocorrido em dezembro de 2007, com a supressão dos controlos nas fronteiras com nove países recém-aderentes à UE, apesar de uma nova versão atualizada do Sistema de Informação Schengen [SIS II] ainda não estar funcional — o que era uma condição fundamental, a nível técnico. A antecipação do fim das fronteiras, muito importante também a nível simbólico, para os países do centro e Leste da Europa que haviam aderido à União em 2004, foi possível graças a uma solução técnica engenhosa apresentada pela então presidência portuguesa do Conselho da UE, o “SIS one4all”.

Atualmente, fazem parte da área Schengen 26 países, incluindo quatro países que não pertencem à União Europeia, mas associaram-se ao espaço de livre circulação, designadamente Suíça, Noruega, Islândia e Liechtenstein. Dos 27 Estados-membros da União, não fazem parte de Schengen a Irlanda — por opção [tem um ‘optout’, ou cláusula de renúncia, tal como tinha o Reino Unido, que entretanto deixou o bloco europeu — e ainda Chipre, Croácia, Bulgária e Roménia.

Na segunda-feira, 23 de março, começou também a ser aplicada a restrição de entradas no espaço Schengen e países associados de cidadãos extracomunitários, uma decisão tomada pelos chefes de Estado e de Governo da UE numa cimeira extraordinária celebrada por videoconferência em 17 de março, que vigorará pelo menos durante 30 dias, e que abre apenas exceções para viagens consideradas “essenciais”.

E é neste contexto inédito na “era Schengen” de fronteiras fechadas, na sua esmagadora maioria unilateralmente e sem sentido de União, nem tão pouco com notificações prévias a Bruxelas, que se assinalam os 25 anos de um espaço de livre circulação para cerca de 400 milhões de cidadãos, que a Covid-19 “encerrou” temporariamente, levantando interrogações sobre um direito que muitos davam por adquirido.