“É bom mas…”. O Ministério da Saúde anunciou este domingo que já contratou 500 trabalhadores desde 13 de março para reforçar o Serviço Nacional de Saúde no combate à pandemia da Covid-19, em contratos “a termo resolutivo certo por um período de quatro meses que podem ser eventualmente renovados”. Em entrevista à Rádio Observador, Ana Rita Cavaco, bastonária dos Enfermeiros, não deixou de reconhecer o esforço que tem vindo a ser feito pela tutela mas apontou outros problemas que carecem ainda de solução a curto prazo. “É uma altura de reflexão e não de bater palmas, não só aos enfermeiros mas a todos os profissionais de saúde”, diz.
Governo contratou meio milhar de enfermeiros para reforçar combate à pandemia
“Temos estado a colaborar com o Ministério da Saúde, os apelos que a Ordem dos Enfermeiros faz são combinados com o Ministério e procuram desempregados, enfermeiros com experiência em cuidados intensivos, Linha de Saúde 24, diálise e inclusive enfermeiros do privado em que as suas instituições entraram em lay off. As maiores dificuldades nestes apelos é que estão a trabalhar já há muitas horas, em turnos espelhos de 12 horas seguidas, muitos 24 horas”, começou por referir, antes de apontar dois problemas em específico.
“Nos dias em que ficam em casa após uma semana ou 15 dias de trabalho, os hospitais pedem para que tirem dias de férias e isso é algo que não foi ainda resolvido pelo ministério. Depois, os contratos que estão a oferecer para quem entra de novo são de quatro meses e com o mesmo valor por hora. Eles vão arriscar a sua vida, muitos estão a trabalhar para além das suas horas e ainda exigem que gastem dias das suas férias ou gastem horas que deram a mais ao Serviço Nacional de Saúde. Depois, olham lá para fora e veem os outros países a recompensar os seus profissionais de saúde, não só os enfermeiros. O Ministério deve refletir sobre isso”, apontou.
[Ouça aqui a entrevista à Rádio Observador de Ana Rita Cavaco, bastonária dos Enfermeiros]
Ana Rita Cavaco pede “recompensas” ao Governo, “porque só palmas não chegam”
Explicando que existem nesta altura 352 enfermeiros infetados e 1.750 em casa – que, por não haver testes com uma maior periodicidade, podem estar em casa “sem a possibilidade de irem ajudar os seus colegas” não estando infetados –, Ana Rita Cavaco referiu que já tinham respondido a um inquérito da Ordem até sexta-feira desde o início da semana 19 mil dos 43 mil enfermeiros, um inquérito que poderá continuar a ser lançado na medida em que “devido às subnotificações, como é normal, os dados avançados são abaixo do que existem”.
“Entrámos nesta pandemia com um rácio de enfermeiros por cada mil habitantes abaixo da média da OCDE. A OCDE tem um rácio de 9.2 e nós em Portugal tínhamos 6.7. Já partíamos em desvantagem. Tem vindo a ser feito um esforço grande por parte do Ministério da Saúde em contratar, é verdade, o problema são as condições. Tem de haver alguma forma de incentivo. Os enfermeiros não recebem nenhum subsídio de risco, já não recebiam antes, e o que vai acontecer é que cada vez vão responder menos aos apelos”, salientou a bastonária.
“Temos reuniões semanais com o secretário de Estado e agradecemos todo o trabalho do Ministério, que tem feito um esforço enorme nos materiais de proteção individual, por exemplo”, voltou a reforçar. “Mas algumas questões tardam em ser resolvidas, como esta do facto de as pessoas com horários em espelho terem de ficar em casa a utilizar as suas férias e as suas horas a mais, além da sobrecarga que têm pela situação que se vive. Não é fácil trabalhar com equipamentos e materiais de proteção individual, os turnos de 12 horas parecem dois dias. Têm de ser estudadas formas de recompensar os profissionais porque só as palmas não chegam”, concluiu.