O acordo já está assinado e o processo de implementação está em curso. A partir de agora, a Nova School of Business and Economics (Nova SBE) – a faculdade de gestão, economia e finanças situada em Carcavelos – vai desenvolver um conjunto de iniciativas de formação em conjunto com o Westmont Hospitality Group, um grupo hoteleiro global com presença significativa na América do Norte, Europa, Ásia e África. O resultado da parceria é o Westmont Institute for Tourism and Hospitality (WITH), instalado numa das alas da faculdade e preparado para influenciar a educação dos estudantes de mestrado da Nova SBE, quadros de empresas da Europa e, a breve prazo, os países africanos de língua oficial portuguesa e inglesa.

Majid Mangalji, presidente e fundador da companhia, e Daniel Traça, diretor da Nova SBE e professor catedrático de economia, consideram que a parceria é pioneira e traz inovação, ao juntar o conhecimento acumulado de hospitalidade e gestão de serviços ao conjunto de saberes teóricos que a faculdade já hoje transmite aos alunos.

Juntos nesta entrevista conjunta, que decorreu precisamente no gabinete de trabalho do diretor da Nova SBE, os dois responsáveis deixam algumas ideias-chave: as empresas precisam de dialogar mais com instituições de ensino, o futuro vai ser disruptivo no mundo dos negócios, só terá sucesso quem estiver preparado para inovar e se adaptar.

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O novo Westmont Institute for Tourism and Hospitality (WITH) já está a funcionar?

Daniel Traça (DT): Já é uma realidade, está em fase de instalação e de lançamento de atividades. Podemos dizer que a primeira e mais relevante dessas atividades vai ser a especialização em hospitalidade e gestão de serviços, que vamos incluir no mestrado em gestão e, futuramente, no curso de formação de executivos. De acordo com os nossos planos, queremos também lançar uma iniciativa na área da hotelaria e hospitalidade em países africanos de língua portuguesa e inglesa. É importante dizer que este acordo nos permitirá juntar uma série de iniciativas relacionadas com turismo e inovação, sempre com o ponto de vista da hospitalidade e gestão de serviços.

Prevê que o WITH vá funcionar durante quanto tempo?

DT: Bem, penso que será para sempre.

Majid Mangalji (MM): O objetivo é esse, que funcione para sempre. Tendo em conta que fará parte da Nova SBE, desejamos que se torne um projeto a longo-prazo.

Em concreto, de que forma vão os estudantes beneficiar desta parceria?

DT: Estamos a falar dos estudantes que já hoje estão connosco e daqueles que teremos no futuro. O impacto na instituição é o primeiro benefício. É importante perceber que quando criámos este “campus”, quando delineámos a nossa estratégia para esta faculdade, tivemos sempre o futuro como horizonte. As mudanças que todos estamos a viver face à tecnologia e à digitalização, face à globalização e às preocupações com a sustentabilidade, essas mudanças exigem que pensemos no futuro e no lugar que ocuparemos. As universidades são, de raiz, por definição, o lugar onde pensamos o futuro em termos de desafios e soluções. Neste contexto, o turismo e a hospitalidade têm um grande papel. O turismo está em crescimento, claro, mas a hospitalidade revela-se ainda mais importante. Hoje todos falamos de dados, tecnologia e digital, mas temos de assegurar que estas ferramentas são úteis para oferecermos experiências únicas e de grande qualidade aos nossos clientes e ao público. Temos de ter em conta a qualidade do serviço. No futuro, o serviço terá de ser ímpar, menos preocupado com o preço baixo ou eficiente e mais com a qualidade da experiência emocional. Neste momento, a hospitalidade é a indústria mais avançada do mundo no que a estes desafios diz respeito. Quando entramos num hotel de alta qualidade, todas as pessoas – desde aquela que atende o telefone até à que faz a limpeza do quarto – têm de estar focadas em proporcionar uma experiência única, inesquecível e que dê felicidade ao cliente. No futuro, o mesmo vai acontecer nos centros comerciais, nos bancos, nos hospitais, em qualquer área que presta um serviço.

Foi esse ponto de vista que levou a Nova SBE a firmar o acordo?

DT: Precisamente. No futuro, o digital e a tecnologia serão fundamentais, sim, mas mais do que isso teremos de ter a capacidade de servir, de criar experiências singulares e com impacto emocional nos nossos clientes. Será um fator decisivo para o êxito. Este acordo vem ajudar-nos a trazer para a Nova SBE, de forma inovadora, todas as competências da indústria da hotelaria e da hospitalidade para que as possamos levar para as outras áreas: retalho, banca, saúde. É aí que, no futuro, a experiência “offline” terá de ser excecional.

Como descreveriam o “estado da arte” da indústria do turismo e da hospitalidade?

MM: Diria que a hospitalidade é um conceito integrado na indústria da hotelaria, enquanto o turismo é o conjunto de experiências e atividades periféricas que têm a hospitalidade como ferramenta. No âmbito da parceria com a Nova SBE, vamos cobrir ambas as áreas. Queremos levar para as outras indústrias os conhecimentos da hospitalidade e da gestão de serviços. A hospitalidade fornece abordagens inovadoras. O turismo vai um pouco além disto, mas também está incluído. O turismo inclui os hotéis, as viagens, as visitas guiadas, etc.

Já hoje há outras indústrias de serviços a seguir o padrão da hospitalidade?

MM: Sem dúvida. O Daniel já referiu algumas, desde os cuidados de saúde à banca, passando pelos aeroportos. Muitos negócios estão a adotar estas abordagens inovadoras e daí a nossa convicção de que esta parceria é realmente pioneira. O futuro passará pela inclusão da hospitalidade em quase todos os negócios.

A formação do WITH inclui todos os estudantes da Nova SBE?

DT: O WITH é um conceito genérico para o conjunto de atividades e conhecimentos que vamos implementar em diferentes dimensões. Para já, como referi no início, vamos incluir o mestrado em gestão. Estamos a pensar também noutros mestrados que já temos ou que poderemos vir a criar. O importante é sublinhar que os conhecimentos de hospitalidade são transversais à gestão, às finanças, à economia. O WITH será capaz de permear quase toda a nossa oferta educativa. Esta é a primeira dimensão. Numa segunda dimensão, o WITH dará início a componentes formativas autónomas viradas especificamente para os profissionais, com programas de formação, empreendedorismo, inovação. Portugal tem hoje uma indústria de turismo e hospitalidade em franco crescimento. Seremos relevantes no nosso país, mas também a nível europeu. A terceira dimensão do WITH relaciona-se com África, o que já hoje constitui um compromisso muito forte do grupo Westmont e também da Nova SBE – temos presença em Angola e Moçambique, por exemplo. Resumindo, o WITH é um chapéu virtual para todas as atividades da Nova SBE na área específica da hospitalidade, do turismo e da gestão de serviços. Foi por tudo isto que o diálogo com o grupo Westmont se tornou tão frutífero. A instalação do Imamat Ismaili e a presença cada vez mais importante de Aga Khan em Portugal – porque o Westmont faz parte desta comunidade –, mostraram-nos que havia aqui um perfeito alinhamento. O que eles querem fazer e o que os preocupa é o que nós queremos fazer e o que nos preocupa.

MM: A família que fundou o grupo Westmont é originária de África, só depois é que nos estabelecemos no Ocidente, a começar pela América do Norte. Estamos na indústria da hospitalidade há cerca de 45 anos. Aprendemos muito e de certa forma queremos devolver conhecimento à sociedade, o que faz ainda mais sentido se o fizermos através de uma faculdade. Poderíamos ter contactado outras instituições, mas a Nova SBE tem um projeto único, está num país fortíssimo na indústria do turismo e da hospitalidade, partilha connosco ideias de inovação, liderança, empreendedorismo. A nossa abordagem é ensinar a pescar, em vez de dar o peixe. Aqui podemos ajudar as pessoas a ganharem competências, a desenvolverem as suas capacidades.

É comum as empresas fazerem parcerias deste nível com instituições de ensino superior?

MM: Há alguns exemplos, mas não se tornou ainda comum, sobretudo porque exige às empresas um esforço significativo. No nosso caso, percebemos que ao dar as mãos à Nova SBE estaríamos a criar um projeto muito especial. No Ocidente há excelentes escolas de hospitalidade, é verdade, mas o foco em Portugal e em África é perfeitamente novo.

E nas universidades portuguesas: a colaboração com o setor privado tem sido fácil?

DT: Tem sido menos comum do que o desejável. Estas parcerias requerem duas coisas. Por um lado, empresas com visão, com o compromisso de devolverem valor à sociedade. No passado, as empresas sabiam que ficava bem aproximarem-se do ensino, era bom para a imagem. As coisas estão a mudar. O grupo Westmont tem o compromisso de fazer a diferença, de melhorar o mundo, é a filosofia deles, não se trata de marketing. Por outro lado, é necessário que as universidades entendam que o mundo dos negócios exige ação, rapidez, eficiência. As instituições de ensino precisam de visão, porque atrás disso vem a paixão e a determinação para superar obstáculos e concretizar. A Nova fez um esforço de angariação de fundos que permitiram a sua criação, habituámo-nos a falar com as empresas. Por isso, estamos mais preparados para dialogar com o mundo dos negócios de forma rápida e incisiva. Sabemos que os tempos de resposta não podem ser os normais no mundo académico, temos de ser muito mais ágeis.

MM: A maior parte das escolas de hotelaria e hospitalidade tem um ensino vocacional, ensinam os alunos a adquirir determinada competência, mas para que os negócios tenham sucesso é necessário que se combine uma formação sólida de base, como aquela que a Nova SBE tem. No fundo, o WITH oferece o melhor de dois mundos.

Quais são neste momento os grandes desafios do mercado do turismo, da hotelaria e da hospitalidade?

MM: É um setor em profunda transformação, é uma indústria globalizada, que permite que pessoas formadas num determinado lugar exerçam do outro lado do mundo. Os desafios, hoje, relacionam-se com as profundas alterações na forma de fazer reservas, na maneira como as pessoas vivem a experiência de alojamento. Há cada vez mais pessoas a viajar, cada vez mais soluções, como, por exemplo, o Airbnb. Temos de nos manter na frente e a inovação é um fator-chave.

DT: Insisto neste ponto: futuro. A hospitalidade é a melhor montra do que vai acontecer em todas as outras áreas nos próximos anos. Aqui entra a disrupção. A maneira como pensamos as coisas, como supomos que elas funcionam ou devem continuar a funcionar, os concorrentes, as respostas que temos… Em dez anos, tudo terá mudado. Ninguém tinha pensado no Airbnb até ele ter aparecido e virado tudo do avesso. A mudança vai acontecer e não vem de onde esperamos, mas precisamente de onde não estamos à espera. A única forma de lidar com um mundo assim é as organizações estarem preparadas para mudar mais depressa do que o ecossistema. Quem tem de fazer pressão somos nós, sobre nós mesmos.