O juiz do Supremo Tribunal Federal (STF) brasileiro Alexandre de Moraes autorizou esta terça-feira uma investigação aos protestos contra a democracia no país realizados no domingo, coorganizados por deputados federais, e nos quais participou o Presidente, Jair Bolsonaro.

Alexandre de Moraes aceitou um pedido de inquérito apresentado na segunda-feira pelo procurador-geral do Brasil, Augusto Aras, para investigar uma “possível violação da Lei de Segurança Nacional” em atos que exaltaram a ditadura militar no país (1964-1985), assim como a organização e financiamento dos protestos, indica o STF em comunicado.

Na sua decisão, o juiz salientou que o “facto, tal como narrado por Augusto Aras, revela-se gravíssimo, pois é atentatório ao Estado democrático de Direito brasileiro e suas instituições republicanas”.

O magistrado frisou ainda “ser imprescindível a verificação da existência de organizações e esquemas de financiamento de manifestações contra a democracia”, porque, lembrou, a Constituição brasileira “não permite o financiamento e a propagação de ideias contrárias à ordem constitucional e ao Estado democrático”.

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São inconstitucionais e não se confundem com a liberdade de expressão as condutas e manifestações que tenham a nítida finalidade de controlar ou mesmo aniquilar a força do pensamento crítico indispensável ao regime democrático”, advogou Alexandre de Moraes.

Segundo o juiz, também “ofendem os princípios constitucionais” as condutas que pretendam destruir as instituições republicanas, “pregando a violência, o arbítrio, o desrespeito aos direitos fundamentais”. “Em suma, pleiteando a tirania”, acrescentou.

A decisão de Moraes determina que a investigação seja realizada sob sigilo, tal como foi pedido por Augusto Aras.

Em causa estão iniciativas realizadas em todo o país, no domingo, em que manifestantes pediram o encerramento de instituições democráticas, como o Congresso Nacional e o STF.

Nas manifestações que tiveram lugar em Brasília, o Presidente da República, Jair Bolsonaro, discursou para as centenas de apoiantes que se aglomeraram para pedir uma intervenção militar e o fim do isolamento social face à pandemia do novo coronavírus.

“Nós não queremos negociar nada. Nós queremos é ação pelo Brasil. O que tinha de velho ficou para trás, nós temos um novo Brasil pela frente. (…) Acabou a época da patifaria. É agora o povo no poder”, disse o chefe de Estado à multidão, que levantava faixas em defesa de uma intervenção militar, sem o uso de máscaras ou qualquer proteção contra a Covid-19.

Em frente ao quartel-general do Exército, em Brasília, Bolsonaro subiu para uma carrinha, no dia em que foi celebrado o Dia do Exército, onde falou para centenas de apoiantes que contrariaram as orientações da Organização Mundial da Saúde (OMS), e do próprio Ministério da Saúde brasileiro, de evitar aglomerações de forma a impedir a disseminação do vírus.

Entre as faixas que a multidão erguia podiam ler-se frases como “intervenção militar já!”, “o povo é quem manda”, “Bolsonaro no poder”, “fechem o Congresso” ou “fora Maia”, numa referência a Rodrigo Maia, presidente da Câmara dos Deputados do Brasil, com quem Bolsonaro se tem confrontado nas últimas semanas.

Os manifestantes pediram ainda o encerramento do STF e o regresso do “AI-5”, o Ato Institucional n.º 5, que foi decretado no Brasil, em 1968, no auge da ditadura militar, e revogou direitos fundamentais e garantias constitucionais como o habeas corpus, instituiu a censura prévia e também deu ao Presidente o direito de cessar mandatos de parlamentares e intervir em cidades e estados do país.

Na segunda-feira, um dia após ter discursado nos protestos, Jair Bolsonaro negou ser contra a democracia e afirmou querer que os poderes legislativo e judiciário sejam abertos e transparentes.

“Aqui não tem de fechar nada (…). Aqui é democracia, aqui é respeito à Constituição brasileira. E aqui é a minha casa, é a tua casa. Então peço, por favor, que não se fale isso aqui. Supremo aberto, transparente. Congresso aberto, transparente”, afirmou Jair Bolsonaro aos seus apoiantes, à saída do Palácio da Alvorada.