A celebração do 25 de Abril vai decorrer pela primeira vez sem ações de rua, devido ao surto da Covid-19, mas com a sessão solene, que já falhou em quatro dos 44 anos da Assembleia da República.

A sessão que assinala a Revolução dos Cravos no parlamento não se realizou em apenas quatro dos 44 anos da Assembleia da República nascida das eleições de 25 de abril de 1976, data da entrada em vigor da Constituição democrática. Em 1983, em 1993 e em 2011 não houve sessão evocativa no parlamento e em 1992, por proposta do então Presidente Mário Soares, a celebração transferiu-se para a zona de Belém, numa tentativa de a tornar mais apelativa e sensibilizar os mais jovens para as conquistas democráticas.

Em 1983, a sessão no parlamento não se realizou por haver eleições legislativas no próprio dia 25 de abril; em 2011, por a assembleia se encontrar dissolvida; e em 1993, quando os órgãos de comunicação social decidiram em bloco boicotar todos os trabalhos parlamentares em protesto contra a limitação da circulação dos jornalistas no edifício de S. Bento, em Lisboa. Como não haveria cobertura, decidiu-se cancelar a sessão no parlamento.

Desta vez, o parlamento, que está a funcionar em regime de “serviços mínimos” desde a instauração do estado de emergência em 19 de março, decidiu realizar a sessão com a garantia de que seriam cumpridas as normas da Direção-Geral de Saúde para manter o distanciamento social e prevenir o contágio do novo coronavírus.

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A sessão irá realizar-se com menos de um terço dos deputados e poucos convidados. A mesa da assembleia estima que vão estar menos de 100 pessoas no hemiciclo, contra mais de 700 na cerimónia do ano passado.

A realização da cerimónia evocativa da Revolução dos Cravos tem suscitado acesa polémica, sobretudo nas redes sociais e nos setores mais à direita da sociedade portuguesa, apesar de ter reunido a aprovação de partidos que representam mais de 90% dos votos saídos das últimas legislativas (PS, PSD, BE, PCP, PEV).

Ferro Rodrigues. “Então nós íamos mascarados para o 25 de Abril?

Em diferentes entrevistas, às rádios TSF e Antena1 e ao jornal Público, o presidente da Assembleia da República, Eduardo Ferro Rodrigues, considerou absurda a hipótese de o parlamento estar de portas abertas, designadamente para aprovar os decretos presidenciais do estado de emergência, e depois fechar as portas no 25 de Abril, precisamente quando se celebra a democracia, cujo símbolo máximo é o parlamento.

O Chega, único partido conotado com a extrema-direita no parlamento português, e que conta apena com um deputado, criticou fortemente a sessão, bem como o líder do CDS-PP, considerando “um péssimo exemplo para os portugueses” o parlamento estar a realizar uma sessão numa altura em que se pede aos portugueses para se isolarem em casa, de modo a protegerem-se do contágio com o novo coronavírus.

Apesar da polémica, que preencheu mais as redes sociais do que as intervenções dos principais partidos, o presidente da Assembleia da República, Eduardo Ferro Rodrigues, e os maiores partidos portugueses decidiram levar a sessão por diante, acertando os pormenores de logística com a Direção-Geral da Saúde.

Mas desta vez, se tudo correr como pediu o presidente da Associação 25 de Abril, as ações de rua serão substituídos por uma forma original de evocação: os portugueses confinados em casa à janela a cantarem a “Grândola Vila Morena”, de Zeca Afonso, à hora que deveria começar o desfile na Avenida da Liberdade, em Lisboa (15:00).

Vasco Lourenço, um dos promotores do desfile anual, pediu às televisões e rádios portuguesas que façam o mesmo, passando a “Grândola Vila Morena” à hora que deveria iniciar-se o desfile de Lisboa.

Portugal registava na segunda-feira 735 mortos associados à Covid-19 em 20.863 casos confirmados de infeção, segundo o boletim diário da Direção-Geral da Saúde (DGS) sobre a pandemia.

O país cumpre o terceiro período de 15 dias de estado de emergência, iniciado em 19 de março, e o decreto presidencial que prolongou a medida até 2 de maio prevê a possibilidade de uma “abertura gradual, faseada ou alternada de serviços, empresas ou estabelecimentos comerciais”.

Em 25 de abril de 1974, um movimento de capitães derrubou a ditadura de 48 anos, de Marcelo Caetano, chefe do Governo, e Américo Tomás, Presidente da República, um golpe que se transformou numa revolução, a “revolução dos cravos”.