O Ministério Público ameaça faltar à audiência marcada para 6 de maio sobre a deposição dos resíduos perigosos em São Pedro da Cova, Gondomar, caso não estejam reunidas condições de segurança, revela resposta enviada ao tribunal.

“Não estando garantidas estas condições, o Ministério Público não participará na audiência de julgamento”, lê-se na promoção assinada pelo procurador da República, Carlos Teixeira, datada de sexta-feira. à qual a Lusa teve esta segunda-feira acesso

Em causa está a audiência de julgamento que visa a audição de peritos no âmbito do processo crime sobre a deposição de toneladas de resíduos industriais perigosos em São Pedro da Cova, a qual foi marcada para 06 de maio, conforme despacho do Tribunal Judicial da Comarca do Porto com data de terça-feira passada.

Nesse despacho, a juíza responsável pelo processo que agora corre no Tribunal Judicial da Comarca do Porto escreve que “não se mostra imprescindível a presença dos arguidos na audiência de julgamento, a qual tem por única finalidade a audição dos senhores peritos” e que estes “podem ser ouvidos, em simultâneo, através de meios de comunicação à distância adequados”, especificando mesmo a possibilidade de uso do sistema ‘webex’, apontado como “muito semelhante ao ‘zoom’ ou ao ‘teams'”.

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Isto depois de descrever que “os arguidos, atenta a sua idade e eventuais problemas de saúde, podem requerer ou consentir que a audiência seja realizada na sua ausência”.

No entanto o Ministério Público, em resposta, aponta que não aceita que a audiência de julgamento seja feita sem a presença física dos peritos e que só admite a hipótese de participar na audiência presencial se for garantido pelo tribunal o “cumprimento escrupuloso” das orientações do Conselho Superior da Magistratura, citando algumas alíneas de uma orientação que versa sobre a prevenção, contenção, mitigação e tratamento da covid-19.

Assim, o Procurador da República exige que “se garanta que nenhuma das pessoas presentes na sala estão infetadas, ou têm sintomas e ligação epidemiológica” e que “se garanta que há máscaras ou viseiras, luvas, solução antisséptica de base alcoólica disponíveis para o Ministério Público e restantes intervenientes”.

A regra de distanciamento, que conforme é orientação do Conselho Superior da Magistratura corresponde a dois metros entre os intervenientes, também é exigida, sendo que o Ministério Público diz não aceitar que para cumprimento dessa norma altere a sua posição na sala de audiências, admitindo que para “o efeito tenha de se fazer uso de separadores em acrílico”.

Esta audiência de julgamento surge na sequência da decisão do Tribunal da Relação do Porto que em janeiro anulou o acórdão do tribunal criminal de São João Novo que tinha absolvido em abril de 2019 seis arguidos no caso da deposição de resíduos perigosos em São Pedro da Cova, determinando a reabertura do julgamento.

A Relação do Porto considerou que a decisão em primeira instância tinha de ser anulada, devendo ser realizadas novas diligências para “posterior elaboração de novo acórdão”.

Para o coletivo de juízes de São João Novo, tinha ficado por provar a tese segundo a qual os arguidos haviam cometido crime de poluição com perigo comum, nos anos de 2001 e 2002, ao contrário do que se defendia o Ministério Público que recorreu da decisão.

Além do recurso do MP e da União de Freguesias de Fânzeres/São Pedro da Cova, ao processo foi anexado o pedido de aprofundamento de uma perícia feito por um dos proprietários dos terrenos onde foram depositados os resíduos, que começaram a ser removidos entre outubro de 2014 e maio de 2015, quando foram retiradas 105.600 toneladas, faltando ainda cerca de 125 mil toneladas.

O Tribunal da Relação deu razão a essa pretensão, lendo-se no acórdão que “a resposta do colégio de peritos tem pelo menos de ser esclarecida, pois que a sua resposta corta a possibilidade de recurso à ideia de probabilidade racional, ou pelo menos redu-la a uma grandeza equitativa não mensurada nem mensurável”.

Mas, devido à instauração do estado de emergência no país face à pandemia covid-19, a audiência foi sendo adiada até ter ficado marcada para 06 de maio.

A juíza responsável pelo processo considera que “face ao número de intervenientes, será perfeitamente possível manter a necessária distância de segurança”, apontando até a sala escolhida para a audiência, a “UP1”, mas para o Ministério Público considera que “neste processo não estão em causa a vida, a integridade física, a saúde mental, a liberdade ou a subsistência imediata dos intervenientes que impliquem a necessidade de realização do julgamento”.

“Não é manifestamente o caso”, lê-se na resposta do Ministério Público que também lembra que na atual situação de pandemia, “os prazos processuais e os prazos de prescrição estão suspensos” até que seja novo Decreto-Lei.