Que papel teve, de facto, Donald Trump na obtenção de um acordo histórico para o corte da produção mundial de petróleo que juntou a OPEP, liderada pela Arábia Saudita, e a Rússia?

Uma investigação da agência Reuters revela que o presidente americano fez um telefonema ao príncipe saudita no dia 2 de abril, dez dias antes do anúncio do acordo. Na conversa com Mohammed bin Salman, terá deixado o aviso: se a Organização dos Países Produtores de Petróleo não cortasse a sério a produção, ele seria impotente para travar o congresso americano de aprovar legislação para a retirada das tropas americanas do país.

A ameaça de pôr fim a 75 anos de aliança estratégica entre os dois países foi central na campanha de pressão que os americanos fizeram para conduzir a um acordo de redução da oferta em 9,7 milhões de barris e que foi anunciado no dia 12 de abril.

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De acordo com a Reuters, que conta a história por detrás deste acordo, o príncipe saudita ficou tão abalado com a ameaça que até pediu aos seus conselheiros que abandonassem a sala para prosseguir a conversa com Donald Trump em privado, revela uma fonte americana citada pela agência.

Por trás do murro na mesa dado pelo Presidente dos Estados Unidos, país que é tradicionalmente contra o cartel da OPEP, esteve a preocupação de Trump em salvar a indústria do petróleo e gás de xisto (shale gas and oil) americana que não é viável com preços do petróleo tão baixos. E há milhares de produtores em risco de insolvência em estados americanos que são cruciais para uma vitória republicana nas próximas eleições presidenciais.

Questionado diretamente numa entrevista à Reuters sobre a ameaça que terá feito ao líder da Arábia Saudita, Donald Trump confirmou a conversa telefónica com o príncipe Mohammed, mas acrescentou que não foi necessário dizer-lhe que os Estados Unidos poderiam retirar as suas bases militares do país.

“Achei que ele e o Presidente Vladimir Putin foram muito razoáveis. Eles sabiam que tinham um problema e isto aconteceu”.

A pandemia do Covid-19 e as medidas adotadas para travar a sua propagação conduziram à paralisia das economias, especialmente sentida no setor dos transportes. Com a queda da procura mundial, os preços começaram a cair, mas em vez de cortes na produção, aconteceu o contrário. A Arábia Saudita, que estava a medir forças com a Rússia (o maior exportador fora da OPEP), resolveu produzir ainda mais, o que conduziu a um crash no mercado petrolífero.

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Se é certo que o acordo de 12 de abril foi um passo na direção do reequilíbrio do mercado, não foi de todo o suficiente para travar a derrocada das cotações do petróleo. Até porque um corte de 9,7 milhões na oferta mundial não chega para acomodar o excesso de oferta que resulta de uma queda de 30% na procura mundial, e que corresponde grosso modo a 30 milhões de barris por dia. E foi esse excesso de oferta, combinado com o esgotamento da capacidade de armazenamento mundial, que levou o petróleo a negociar em valores negativos na semana passada nos Estado Unidos.

Já esta semana, as cotações têm vindo a recuperar, o Brent está na casa dos 25 dólares por barril e o WTI americano seguia a 18 dólares, animadas com a reabertura progressiva das atividades económicas na Europa e também em alguns estados americanos.