A África do Sul abriu neste sábado parcialmente algumas atividades económicas ao baixar para nível 4 o confinamento de contenção da covid-19, que continua a propagar-se no país acima das 5.643 infeções e 103 mortos, mas “o futuro será complicado”, dizem empresários portugueses.

Em declarações à Lusa, Rui Santos e Mário Afonso, dois empresários portugueses a operar nas duas principais províncias do país – Cabo Ocidental e Gauteng, em setores de atividade económica distintos, como são o naval e o publicitário, consideraram a decisão do Governo sul-africano como acertada, embora possa ser tardia para ultrapassar a contração de 5,8% da economia e o agravamento do desemprego, projetados pelo Tesouro nacional.

“No meu setor, não tenho dúvidas nenhumas de que a recuperação vai ser muito rápida porque é um setor alimentar, 90 por cento dos meus clientes são armadores de navios de pesca e a pesca é um produto alimentar que as pessoas vão ter que consumir todos os dias, poderá ser menor durante a época do vírus, mas tem de ser consumido”, disse à Lusa Rui Santos, da empresa Vouga Marine, que se dedica a reparações navais na Cidade do Cabo.

O empresário português, que emprega cerca de 10 pessoas a tempo inteiro, prevê que após a abertura das fronteiras, “os contentores que estão aqui neste momento em ‘stand by’ vão desaparecer de um dia para o outro porque todo o mundo vai ter que se alimentar”.

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Já a nível nacional, acrescenta Rui Santos, o cenário é “mais complicado” porque a economia irá depender do impacto do novo coronavírus no continente africano.

“Ou seja, esta medida de confinamento [nível 4] pode nos valer um cavalo na guerra, mas se se prolongar por muito tempo, a economia pode cair para níveis muito maus”, salientou.

Rui Santos fez um balanço “extremamente negativo”, em termos económicos, do confinamento de cerca de dois meses, porque foi “péssimo estar parado, enviar empregados para casa” e ter de ficar numa “incerteza muito grande” relativamente ao futuro.

Do ponto de vista da comunidade portuguesa na Cidade do Cabo, considerou à Lusa que “há gente muito mais lesada” do que ele, destacando negócios como “takeaway”, cabeleireiros e restauração, que vão ter de continuar em confinamento obrigatório por tempo indeterminado.

Para fazer face às dificuldades criadas pela doença e às medidas excecionais de contenção aplicadas pelo Governo sul-africano, o empresário disse que teve de pagar 50% dos ordenados e recorrer a um apoio do Fundo de Desemprego (UIG, na sigla em inglês), já aprovado pelo Governo sul-africano.

Já em Joanesburgo, capital da província de Gauteng e motor da economia nacional, onde pelo menos 250.000 pessoas estão agora em risco de ficar desempregadas devido à covid-19, segundo dados avançados pelas autoridades locais, o cenário tende a ser “menos positivo”.

“Eu não vejo nada positivo com isto e não consigo ver nada de positivo que vai sair disto, com muitas companhias a fechar, […] muita gente a ser despedida, e não vejo nada de positivo nisto”, disse à Lusa o publicitário Mário Afonso.

“A única coisa que o Governo diz é que conseguiram manter a curva um bocado baixa, mas de resto não vejo nada positivo a sair disto, isto para a economia é um problema muito grande”, adianta.

O empresário lusodescendente, que emprega cerca de 10 pessoas a tempo inteiro na IdDigital, uma agência de desenho gráfico e publicidade, está convencido que vai ser difícil retomar a normalidade, “pelo menos até ao fim do ano” com as empresas “a perderem tanto dinheiro” em cerca de dois meses de confinamento.

“Neste primeiro mês em que estivemos em ´lockdown´ (confinamento) os nossos funcionários foram pagos normalmente, mas para o mês de maio já tivemos que colocar as pessoas em regime parcial, e julgo que a situação continuará até agosto ou setembro”, adianta.

“Julgo que a intenção do Governo foi boa, mas num país com imensos problemas económicos que estamos a atravessar de momento, não sei se foi a melhor opção que fizeram, é um país com mais de 29% de desempregados que já tínhamos antes de começar a pandemia do novo coronavírus”, declarou.

Dados divulgados esta quinta-feira no parlamento pelo Tesouro nacional da África do Sul, indicam que o impacto da covid-19 na economia do país resultará numa contração de 5,8% este ano, e no agravamento do desemprego com a perda de entre 3 e 7 milhões de postos de trabalho no país, o que levou a oposição a criticar o confinamento total decretado pelo Governo.

As medidas restritivas aplicadas pelo Governo desde meados de março com a ajuda do exército e da polícia, resultou também na vandalização de cerca de 1.000 escolas no país, segundo as autoridades.

A África do Sul é um dos países mais afetados pela covid-19, com 103 mortos e 5.350 casos, segundo dados do Centro de Controlo e Prevenção de Doenças da União Africana (África CDC).

A nível global, segundo um balanço da agência de notícias AFP, a pandemia de covid-19 já provocou mais de 230 mil mortos e infetou mais de 3,2 milhões de pessoas em 195 países e territórios. Cerca de 908 mil doentes foram considerados curados.