A defesa do ex-diretor da Polícia Judiciária militar (PJM) disse esta segunda-feira que a acusação do caso de Tancos é uma “autêntica misturadora” sem sustentação, criticando a junção dos processos do furto com o da recuperação das armas.

Os advogados Rui Baleizão e Manuel Ferrador pediram que Luís Vieira não fosse a julgamento, defendendo que este militar não teve conhecimento da alegada encenação da recuperação das armas, como o acusa o Ministério Público (MP).

“A acusação é uma autêntica misturadora com um grande espírito criador que coloca na mesma sala de audiência quem furtou e quem recuperou o armamento”, disse o advogado de defesa no debate instrutório, que decorreu no Tribunal de Monsanto.

A defesa de Luís Vieira tentou desmontar a acusação que diz não estar sustentada e que fez uma perseguição criminal a quem se esforçou por cumprir o desígnio nacional que era encontrar o armamento de guerra furtado dos paióis nacionais, em junho de 2017.

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Os advogados apontaram várias inconstitucionalidades e a ilegalidade das apensações de dois processos.

Luís Vieira criticou a junção dos dois processos crime — furto e achamento —, o afastamento da PJM das investigações, por determinação da então procuradora-geral da República, Joana Marques Vidal, e ainda o facto de ter sido a Polícia Judiciária a investigar crimes militares.

“O Código militar não permite a conexão de processos militares e civis. A PJ não pode investigar crimes ocorridos em instalações militares”, alegou a defesa.

Para os advogados, durante a investigação houve também uma “flagrante violação do princípio do juiz natural” na deslocalização do inquérito de Santarém [as armas foram encontradas na Chamusca] para o Departamento Central de Investigação e Ação Penal.

E isso só foi possível, dizem, porque foi qualificado um crime de comércio ilícito de material de guerra como terrorismo, cuja investigação é da competência exclusiva da PJ e do DCIAP.

Entendem os causídicos não haver factos que mostrem o envolvimento de Luís Vieira nem que o furto do armamento serviria para perpetrar atos de terrorismo.

“Luís Vieira não ordenou qualquer ato investigatório, como diretor da PJM definia objetivos e por isso desconhecia a circunstâncias da investigação para a recuperação das armas furtadas, não podendo ser responsabilizado por ordens que não deu”, sustentaram os advogados, referindo que quem acompanhava as investigações era o coronel Estalagem, que não foi envolvido neste processo.

Quanto à reunião com o ex-ministro da Defesa e arguido Azeredo Lopes, a defesa refere que Luís Vieira tentou sensibilizar a tutela para a ilegalidade da apensação dos processos e para o afastamento da PJM da investigação.

“Luís Vieira, um militar de mérito limitou-se a agir no estrito cumprimento do dever”, sustentaram.

Sobre a alegada consonância de estratégias dos defensores de Luís Vieira e Azeredo Lopes, como foi dito pela procuradora, os advogados negaram e disseram que a suspeita foi “muito infeliz”.

À saída do tribunal e questionados sobre as alegações da procuradora, que as fez num documento de 750 páginas, os advogados disseram que apenas leram na diagonal, mas consideram que faz “ligações erróneas”.

“Sempre dissemos que a acusação era uma efabulação e hoje, finda a instrução, mantemos essa opinião”, afirmaram.

Luís Vieira está acusado de associação criminosa, tráfico e mediação de armas, falsificação ou contrafação de documentos, denegação de justiça, e prevaricação e ainda favorecimento pessoal praticado por funcionário.

A defesa do coronel Taciano Correia, ex-diretor da direção de Investigação Criminal da GNR, também pediu para que o seu cliente não fosse a julgamento, alegando que este se limitou a cumprir um pedido de colaboração institucional feito pela PJM.

O advogado de Fernando Santos, implicado no furto das armas segundo a versão do MP, pediu a anulação da acusação e disse que no dia do crime o seu cliente estava em Ansião.

Miguel Matias, advogado do arguido Hugo santos, que segundo o MP participou no furto, admitiu que o seu cliente fosse pronunciando pelo tráfico de droga, que o próprio assumiu, mas que o processo fosse separado, negando qualquer envolvimento no furto.

O advogado disse ainda que o MP “não teve uma atuação transparente nem agiu com lisura”.

Aos arguidos são imputados crimes como terrorismo, associação criminosa, denegação de justiça, prevaricação, falsificação de documentos, tráfico de influência, abuso de poder, recetação e detenção de arma proibida.

Nove dos 23 arguidos estão acusados de planear e executar o furto do armamento, e os restantes 14, entre os quais Azeredo Lopes, Luís vieira, Vasco Brazão (PJM) e Amândio Marques (GNR) de estarem envolvidos na encenação que esteve na base da recuperação do equipamento.

O ex-ministro da Defesa está acusado de prevaricação e denegação de justiça, abuso de poder e favorecimento pessoal.

O furto de material de guerra foi divulgado pelo Exército em 29 de junho de 2017 e, quatro meses depois, a PJM revelou o aparecimento do material furtado, na região da Chamusca, a 20 quilómetros de Tancos, em colaboração com elementos do núcleo de investigação criminal da GNR de Loulé, envolvimento que a acusação colocou em causa.

O debate prossegue na terça-feira de manhã, iniciando-se com as alegações da defesa de Azeredo Lopes.