A “situação dificílima” de muitas famílias provocada pela pandemia de Covid-19 não tem “fim à vista” e pode ser agravada por um aumento do desemprego a seguir ao layoff, devendo rever-se apoios sociais como o Rendimento Social de Inserção.

As posições foram esta segunda-feira assumidas pela Federação dos Bancos Alimentares e a Caritas Portuguesa, que foram esta segunda-feira recebidas em audiência pelo Presidente da República, Marcelo Rebelo de Sousa, no Palácio de Belém.

Isabel Jonet, que lidera o Banco Alimentar, manifestou as suas preocupações com o que se pode seguir à fase inicial da pandemia, quando se esgotarem as medidas iniciais de apoio do Estado.

“Penso que nós ainda vamos viver tempos difíceis e o meu grande receio é a situação de desemprego após os layoffs. Só tenho feito um apelo às empresas para que não despeçam e para que preservem o emprego. Neste momento o mais importante na sociedade portuguesa é preservar o emprego, seja como for, para que as famílias tenham algum rendimento ou remuneração para levar para casa no final do mês”, disse.

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Eugénio Fonseca, da Caritas, disse que nesta crise nota uma mudança no tipo de pedidos de ajuda que chegam aos centros diocesanos: se na crise de 2012 as pessoas pediam ajuda para procurar e encontrar emprego, agora a necessidade é mais funda e básica e pedem sobretudo alimentação.

Daí que defenda que deve existir um plano articulado de medidas de combate à pobreza, que envolva instituições e organismos oficiais, desde o Governo a autarquias, e que se promovam medidas que vão mais longe das tomadas até agora, propondo a revisão do Rendimento Social de Inserção (RSI), “em metodologia e em valor”.

“Se as pessoas tiverem autonomia financeira já não precisam de recorrer a instituições como a Caritas”, disse, criticando a burocracia que dificulta o acesso a este apoio social, sendo necessário fazer prova de três meses sem rendimentos e depois esperar 45 dias — prazo atual — para receber a primeira prestação.

Por seu lado, Isabel Jonet disse que é preciso “não perder de vista que tudo isto foi um turbilhão, que caiu também em cima do Ministério do Trabalho, da Solidariedade e da Segurança Social”.

As medidas que têm vindo a ser adotadas são muito positivas, mas não são suficientes para as necessidades das famílias. Temos também que ter em conta que este tipo de apoios sai do Orçamento do Estado e há também um enquadramento que é preciso ter em conta. São equilíbrios muito difíceis, que não podemos perder de vista, que é necessário manter, sobretudo quando se perspetiva que esta situação não seja para um ou dois meses. Nós temos aqui tempos longos e as pessoas têm que ser realistas”, disse.

O Banco Alimentar já recebeu 14.962 pedidos de ajuda que abrangem cerca de 59 mil pessoas, estimou Isabel Jonet, que diz que os pedidos chegam a um ritmo de mil por dia.

Na Caritas há 48 mil novas pessoas a precisar de ajuda e Eugénio Fonseca reiterou que as linhas de financiamento de valor global de 130 mil euros criadas pela instituição não vão cumprir o objetivo de chegar até junho, “porque a procura é muita” e os números não revelam toda a realidade, até pela multiplicidade de instituições que estão a prestar apoio.

“Ninguém sabe dizer quanto tempo vai durar, o que ouvimos dizer é que vai durar muito tempo e há que equacionar recursos para darmos o mínimo de dignidade às pessoas”, disse Eugénio Fonseca, que estima que a situação de desemprego se agrave no próximo outono e inverno e se revelou preocupado nos efeitos que a crise possa ter em termos de endividamento e sobre-endividamento das famílias, criando problemas que se podem “tornar insolúveis” para instituições e para o Estado.

Isabel Jonet insistiu que é preciso criar condições para o regresso ao trabalho e de reabertura da economia, e é preciso que reabram serviços que permitem o regresso ao trabalho, como as creches, um dos maiores receios dos pais.

“É preciso devagarinho tirar este medo que nos impede de voltar ao mercado de trabalho, mas sobretudo que nos impede de retomar a economia. Nós não temos poupanças em Portugal, muitas destas famílias não têm poupanças, e portanto não aguentam, não têm almofada de segurança. Muitas das condições de acesso às prestações sociais já foram alteradas e isso é bom, porque não é bom que as famílias não tenham nenhum dinheiro. Isso pode até por em causa alguma segurança e tranquilidade que se vive em Portugal”, disse.

Portugal contabiliza 1.144 mortos associados à Covid-19 em 27.679 casos confirmados de infeção, segundo o último boletim diário da Direção-Geral da Saúde (DGS) sobre a pandemia.

O país entrou no dia 03 de maio em situação de calamidade devido à pandemia, depois de três períodos consecutivos em estado de emergência desde 19 de março.

Esta nova fase de combate à Covid-19 prevê o confinamento obrigatório para pessoas doentes e em vigilância ativa, o dever geral de recolhimento domiciliário e o uso obrigatório de máscaras ou viseiras em transportes públicos, serviços de atendimento ao público, escolas e estabelecimentos comerciais.