O presidente do Ecobank, um um dos maiores bancos africanos, disse esta segunda-feira, em entrevista à Lusa, que os credores privados não devem aceitar um perdão de dívida, defendendo que os países do continente proponham antes uma reestruturação da dívida soberana.

“Se o Fundo Monetário Internacional (FMI) ou o Banco Mundial quiserem participar para aliviar o impacto do coronavírus, ‘então ok’, mas o setor privado representa as poupanças de outras pessoas, poupanças privadas: são o dinheiro que colocamos no banco para ter um futuro melhor, e é isso que estamos a pedir quando falamos de credores privados, e por isso essa é a última coisa que apoio”, disse Ade Ayeyemi.

Em entrevista à Lusa por telefone a partir da sede do banco, em Lomé, no Togo, Ade Ayeyemi argumentou que “há vida depois do vírus” e acrescentou que os países que entrem em Incumprimento Financeiro (default) hoje vão ver que é mais difícil depois ter acesso ao mercados financeiros, porque não se pode ter os investidores internacionais com medo de que os seus investimentos sejam ‘socializados’, senão vai demorar muito tempo até os países conseguirem voltar aos mercados”.

Questionado sobre a diferença de perceção entre as poupanças dos consumidores ou a capacidade financeira dos grandes fundos de investimento, Ayeyemi retorquiu que “qualquer dinheiro que é investido é sempre a poupança de alguém, quer seja uma pessoa rica ou não, isso é irrelevante”.

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É perigoso, salientou, haver medo de investir nos títulos soberanos dos países africanos “porque senão chegará uma altura, outra vez, em que vão dizer ‘somos pobres e não devemos pagar’ e se começamos a incluir isso no preço da dívida, então ela será muito cara e o mercado da dívida ficará inacessível para os países africanos”.

Para Ayeyemi, a solução é negociar um adiamento do pagamento da dívida: “Temos de olhar para o que é devido e empurrá-lo para o futuro, é preciso abordar os detentores de títulos e ter uma conversa comercial e não um ‘default’, que traz muita dor ao longo do tempo, e até porque aquilo que o FMI e o Banco Mundial estão a fazer é suficiente”.

As declarações de Ayeyemi à Lusa surgem na sequência da discussão pública que tem existido nos mercados financeiros africanos sobre como os governos podem honrar os compromissos e, ao mesmo tempo, investir na despesa necessária para conter a pandemia da Covid-19, cujo número de mortos em África se aproxima dos dois mil, em cerca de 50 mil casos registados.

A definição do problema da dívida como uma questão central para os governos africanos ficou bem espelhada na preocupação que o FMI e o Banco Mundial dedicaram a esta questão durante os Encontros Anuais, que decorrem em abril em Washington, na quais disponibilizaram fundos e acordaram uma moratória no pagamento das dívidas dos países mais vulneráveis a estas instituições.

Em 15 de abril, também o G20, o grupo das 20 nações mais industrializadas, acertou uma suspensão de 20 mil milhões de dólares, cerca de 18,2 milhões de euros, em dívida bilateral para os países mais pobres, muitos dos quais africanos, até final do ano, desafiando os credores privados a juntarem-se à iniciativa.

O Instituto Financeiro Internacional (IFI), que junta os credores a nível mundial, anunciou na semana passada a intenção de participar na iniciativa do G20 que propõe a suspensão dos pagamentos aos credores, entre maio e dezembro, embora sem se comprometer com os termos e sem apresentar detalhes, estimando que a dívida soberana e os juros dos empréstimos contraídos pelos países em desenvolvimento e dos mais pobres a pagar este ano rondaria os 140 mil milhões de dólares (127,8 mil milhões de euros).

Além disso, a União Africana e Comissão Económica das Nações Unidas para África (UNECA), entre outras instituições, estão a desenhar um plano que visa trocar a dívida soberana dos países por novos títulos concessionais que possam evitar que as verbas necessárias para combater a covid-19 sejam usadas para pagar aos credores.

Este mecanismo financeiro seria garantido por um banco multilateral com “rating” de triplo A, o mais elevado, ou por um banco central, que converteria a dívida atual em títulos com maturidade mais alargada, beneficiando de cinco anos de isenção de pagamentos e cupões (pagamentos de juros) mais baixos, segundo a UNECA.

Outra hipótese, avançada pelo representante especial da União Africana para a resposta à pandemia, Ngozi Okonjo-Iweala, é este veículo financeiro (“Special Purpose Vehicle”, no original em inglês) poder também ser financiado pelos Direitos Especiais de Saque que as nações mais ricas têm no Fundo Monetário Internacional, e que compõem as reservas do Fundo.

Queremos crescer com o desenvolvimento de Moçambique, revela Ecobank

O presidente do banco africano Ecobank disse esta segunda-feira, em entrevista à Lusa, que o objetivo em Moçambique é tornar a operação lucrativa e que o banco pretende crescer juntamente com o desenvolvimento económico do país.

Continuamos empenhados em Moçambique e temos uma boa operação no país, queremos que a operação se torne lucrativa à medida que o país continua a progredir na trajetória de desenvolvimento económico”, disse Ade Ayeyemi.

O presidente do maior banco africano explicou que o Ecobank “vai beneficiar por ser parte dessa economia que está a melhorar” e acrescentou que a presença no país lusófono insere-se num contexto regional. “Temos filiais nos países vizinhos, no Zimbabué, na Tanzânia, e Moçambique é parte do sistema, do ponto de vista geográfico”, disse o banqueiro.

Moçambique é um dos países lusófonos onde o Ecobank, uma instituição financeira pan-africana está presente, para além da Guiné Equatorial, Cabo Verde, Guiné-Bissau e São Tomé e Príncipe, depois da saída de Angola no final do ano passado.

Angola é uma boa economia africana, tem muitos minerais e está a fazer progressos depois da mudança de Governo, está a ir para onde deve ir, mas nós não temos uma operação lá desde o final do ano passado”, disse o banqueiro.

Questionado sobre a razão da saída, Ade Ayeyemi responde apenas que “foi uma decisão económica, demora tempo… nunca começámos, tivemos licença, conversámos com o regulador, demorou muito tempo até conseguirmos sair, mas saímos e já não somos um banco em Angola”.

Em Moçambique, o Ecobank tem quatro filiais nas maiores cidades, duas no Sul, uma no centro e outra no norte, empregando 118 pessoas. A Lusa questionou o banco sobre os resultados do ano passado, mas uma fonte oficial respondeu que as contas da operação em Moçambique não serão divulgadas antes de auditados.