O ministro das Finanças do Gabão anunciou esta segunda-feira que está em conversações com todos os credores multilaterais do país relativamente a uma moratória ou cancelamento de algumas obrigações financeiras devido aos efeitos da pandemia e do petróleo barato.

Em declarações à agência de informação financeira Bloomberg, Jean-Marie Ogandaga explicou que já enviou cartas aos parceiros chineses e ao Banco de Exportações e Importações Africano (Afreximbank) argumentando que precisa de um adiamento ou de um cancelamento da dívida antiga “que está a ser paga há vários anos”, tornando-se assim o segundo país africano, a seguir à Zâmbia, a pedir oficialmente uma reestruturação da dívida.

“Se de repente uma pessoa passar a ganhar metade do salário, como é que pode continuar a pagar a dívida normalmente”, questionou o governante, salientando que “o Estado não funciona de forma diferente do que as pessoas em casa“.

O Gabão, o segundo mais pequeno produtor de petróleo na Organização dos Países Exportadores de Petróleo (OPEP) começou o ano fazendo a primeira emissão de dívida soberana do continente, colocando mil milhões de dólares nos mercados a uma taxa de juro de 6,625%.

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Em fevereiro, Ogandaga dizia que o país podia fazer uma nova emissão ainda este ano, esperando um crescimento de 5%.

Poucos meses depois, os juros subiram para 10,2%, acima dos 10% considerados pelos investidores como sintomático de um país em dificuldades financeiras, e a perspetiva de evolução da economia desceu para entre 0,3% e 0,5%, disse o ministro, apontando também que a previsão de preço do petróleo desceu de 57 dólares para 26 dólares por barril.

Devido a estas dificuldades, o Fundo Monetário Internacional (FMI) aprovou uma ajuda de emergência no valor de quase 150 milhões de dólares para o país fazer face à quebra da receita petrolífera e ao aumento da despesa com a pandemia da Covid-19.

O anúncio do ministro das Finanças do Gabão surge na mesma altura em que a Comissão Económica para África das Nações Unidas vai reunir-se com os ministros das Finanças africanos, na sequência da discussão pública que tem existido nos mercados financeiros africanos sobre como os governos podem honrar os compromissos e, ao mesmo tempo, investir na despesa necessária para conter a pandemia da Covid-19, cujo número de mortos em África já ultrapassa os dois mil, em mais de 50 mil casos registados.

A assunção do problema da dívida como uma questão central para os governos africanos ficou bem espelhada na preocupação que o Fundo Monetário Internacional e o Banco Mundial dedicaram a esta questão durante os Encontros Anuais, que decorrem em abril em Washington, na quais disponibilizaram fundos e acordaram uma moratória no pagamento das dívidas dos países mais vulneráveis a estas instituições.

Em 15 de abril, também o G20, o grupo das 20 nações mais industrializadas, acertou uma suspensão de 20 mil milhões de dólares, cerca de 18,2 milhões de euros, em dívida bilateral para os países mais pobres, muitos dos quais africanos, até final do ano, desafiando os credores privados a juntarem-se à iniciativa.

Além disso, a UNECA, entre outras instituições, está a desenhar um plano que visa trocar a dívida soberana dos países por novos títulos concessionais que possam evitar que as verbas necessárias para combater a Covid-19 sejam usadas para pagar aos credores.

Este mecanismo financeiro seria garantido por um banco multilateral com rating de triplo A, o mais elevado, ou por um banco central, que converteria a dívida atual em títulos com maturidade mais alargada, beneficiando de cinco anos de isenção de pagamentos e cupões (pagamentos de juros) mais baixos, segundo a UNECA.

No domingo, o presidente em exercício da União Africana, o chefe de Estado da África do Sul, Cyril Ramaphosa, defendeu que a suspensão dos pagamentos da dívida deve vigorar durante dois anos e não apenas até dezembro.

O número de mortos da Covid-19 em África subiu hoje para os 2.290, com mais de 63 mil infetados em 53 países, segundo as estatísticas mais recentes sobre a pandemia naquele continente.

De acordo com o Centro de Controlo e Prevenção de Doenças da União Africana (África CDC), nas últimas 24 horas, o número de mortos subiu de 2.223 para 2.290, enquanto os infetados com Covid-19 passaram de 60.657 para 63.325. O número total de doentes recuperados aumentou de 20.792 para 21.821.

A nível global, segundo um balanço da agência de notícias AFP, a pandemia de Covid-19 já provocou mais de 280 mil mortos e infetou mais de quatro milhões de pessoas em 195 países e territórios. Mais de 1,3 milhões de doentes foram considerados curados.