Deputados pró-democracia de Macau criticaram esta sexta-feira veementemente o cancelamento de uma exposição sobre o movimento democrático chinês que resultou no massacre de Tiananmen, denunciando que se tratou de uma decisão política e de um ataque à liberdade de expressão.

“Verificamos que, se calhar, já não temos o direito e a liberdade de comemorar publicamente o 4 de junho em Macau”, afirmou o deputado pró-democracia Sulu Sou durante um debate na Assembleia Legislativa (AL), denunciando que a decisão teve por base razões políticas com o objetivo de “atacar a liberdade de expressão com meios administrativos”.

O deputado mais jovem de Macau, que envergava uma t-shirt branca em que se podia ler em chinês “As pessoas não esquecerão”, foi ainda mais longe nas acusações e disse: “Não sei se isto se deveu a algum sabichão e à adulação dos governantes de Macau para mostrar a sua lealdade ou a ordens de uma entidade hierarquicamente superior”.

O Instituto para os Assuntos Municipais (IAM) de Macau revogou, na semana passada, a permissão da realização da “Exposição Fotográfica do Movimento de Democratização de 1989”, alegando medidas de prevenção face à Covid-19 e ainda, explicou o deputado pró-democracia Au Kam San, devido à “revisão dos critérios de apreciação e autorização dos pedidos de empréstimo de recintos para a realização de atividades”.

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Esta sexta-feira na AL, Au Kam San, um dos organizadores da exposição que tem “como função principal a educação cívica”, criticou que as justificações dadas são “absurdas” e por isso “não se pode deixar de questionar esta decisão ridícula do IAM”.

Durante um debate aceso, vários deputados nomeados pelo chefe do Executivo mostraram-se favoráveis a esta decisão. Lao Chi Ngai chegou mesmo a dizer que a exposição representa uma violação da lei básica e de Um país, Dois sistemas.

Em junho passado cumpriram-se 30 anos do massacre de Tiananmen, um acontecimento que até hoje o Pequim continua sem reconhecer.

Minutos depois na AL de Macau também o deputado nomeado Wu Chou Kit afirmou: “A liberdade de expressão é um direito fundamental, mas não é um valor absoluto, tem limites”. A maioria dos argumentos a favor da decisão do cancelamento tiveram por base a prevenção da Covid-19.

Uma justificação que o deputado pró-democracia Ng Kuok Cheong, também um dos organizadores da exposição, refutou por completo: “há mais de 30 dias que não há casos, as escolas primárias e secundárias até já reiniciaram as aulas, e como neste tipo de exposições não há concentração de pessoas, não se prejudica a prevenção”, afirmou.

Na sequência do cancelamento da exposição os responsáveis da organização estão expectantes para saber se a vigília em Macau para assinar o massacre de Tianamen, no dia 4 de junho, pode também ser proibida.

Quanto à ‘vigília do 4 de Junho’, que se mostra na Exposição, aguarda-se a comunicação da PSP, nos termos da lei, para negociar as medidas para prevenção da epidemia”, afirmou Ng Kuok Cheong.

Na segunda-feira, o deputado Au Kam San, em declarações enviadas à Lusa, disse que se o IAM não aprovar a vigília, a organização vai pedir à polícia o direito a reunião e, se esta não concordar, os organizadores “insistirão em sentar-se, pois não há regulamentação para que um cidadão não possa sentar-se numa área pública”.

Em 1989, em Pequim, o exército chinês avançou com tanques para dispersar protestos pacíficos liderados por estudantes, causando um número de mortos nunca oficialmente assumido. Algumas estimativas apontam para milhares de mortos.

Macau e Hong Kong são os dois únicos locais da China onde Tiananmen pode ser publicamente recordado e nas duas cidades realizam-se anualmente vigílias para lembrar as vítimas do massacre, de 4 de junho.