Gravações inéditas ao vivo de Amália Rodrigues em Paris serão editadas em julho, quando passarem cem anos sobre o nascimento da fadista, no âmbito do projeto de edição da sua discografia completa, liderado pelo musicólogo Frederico Santiago.

O investigador disse à Lusa que a edição da caixa com cinco CD está prevista para 23 de julho, data do aniversário oficial de Amália.

Apenas o material de um CD é já conhecido. Trata-se da gravação do espetáculo no Olympia, em 1956, remasterizado a partir das bobinas originais. O restante material, entre 1957 e 1965, inclui gravações ao vivo e em estúdio na Rádio France, dois espetáculos completos, novamente no Olympia, em 1967 e em 1975, e ainda uma atuação para emigrantes portugueses em 1964, “um exemplo de como Amália não só atuava nas grandes salas como, muitas vezes graciosamente, cantava para associações de portugueses”, disse Frederico Santiago à Lusa.

Apesar das longas digressões que já tinha feito, desde os anos 1940, pelo Brasil, Estados Unidos ou pelo México, e das atuações na Europa nos espetáculos do Plano Marshall, em 1950, Paris ou, mais concretamente, o Olympia foram, na opinião de Santiago, fulcrais para a carreira de Amália, que em várias entrevistas se referiu à capital francesa como a rampa de lançamento do seu prestígio internacional. “De Paris parti para o mundo”, afirmou a fadista numa das entrevistas que deu.

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Foi o triunfo parisiense, em 1956, que fez o mundo de então reconhecer em Amália uma das maiores cantoras do século”, disse Frederico Santiago. “O êxito foi estrondoso. No final da primeira série de apresentações foi imediatamente convidada para o espetáculo seguinte, proeza inédita no Olympia”, e, “passados oito meses, em janeiro, voltou como ‘vedeta principal'”, afirmou.

Nesta altura, em 1956, “a magia é puramente musical e pessoal”. “Não havia portugueses na sala” da rue des Capucînes, e praticamente ninguém entendia o português. É por isso comovente, no espetáculo de 1975, “ouvir pela primeira vez esses mesmos emigrantes misturados no público do Olympia”.

Entre os temas que se encontram nestas gravações, Santiago referiu o “Fado Madragoa” (José Galhardo/Raul Ferrão), e o fado “Sempre que Lisboa Canta” (Aníbal Nazaré/Carlos Rocha), que Amália não voltou a gravar, e também o “Fado do 31” (Pereira Coelho/Alves Coelho), um dos extras do recital de 1975, bem como “uma extraordinária interpretação do ‘Cansaço’, de Luís Macedo e Joaquim Campos”.

Nas sucessivas digressões a Paris, Amália foi acompanhada por diferentes músicos: nos primeiros anos, Domingos Camarinha, na guitarra portuguesa e Santos Moreira, na viola; entre 1962 e 1965, Domingos Camarinha e Castro Mota; em 1967, pelo Conjunto de Guitarras de Raul Nery e, em 1975, por Fontes Rocha e Carlos Gonçalves, na guitarra portuguesa, Francisco Perez Andión ‘Paquito’, na viola, e Joel Pina, na viola baixo.

A edição da Valentim de Carvalho conta ainda com um “booklet” com textos de Frederico Santigo e Jorge Muchagato, e com uma detalhada cronologia das presenças de Amália na capital francesa, desde 1949 até 1999, quando foi foi homenageada na Cinemateca Francesa, sem esquecer a primeira atuação no Olympia, em abril de 1956, num espetáculo de despedida de Josephine Baker.

Amália voltou várias muitas noites ao Olympia, até ao final da sua carreira, tendo sido a artista estrangeira que mais vezes cantou neste palco, “conquistando ao mesmo tempo outras salas da capital francesa”, recorda o investigador. “Mas nunca esse patamar de vedetismo lhe subirá à cabeça”, conclui.