As multas aplicadas por desflorestação ilegal na Amazónia brasileira estão suspensas desde outubro passado, sob um decreto do Presidente do país, Jair Bolsonaro, denunciou esta quarta-feira a organização não-governamental (ONG) Human Rights Watch (HRW).

Segundo a organização, os agentes do Instituto Brasileiro de Meio Ambiente e Recursos Naturais Renováveis (IBAMA) aplicaram efetivamemte milhares de multas por desflorestação ilegal e outras infrações ambientais, quer na Amazónia, quer em outras partes do Brasil.

Contudo, a partir de outubro, com base num decreto de Jair Bolsonaro datado de abril de 2019, os processos administrativos foram “praticamente todos paralisados”, tendo, no máximo, sido aplicada multa efetiva a infratores em cinco casos, de acordo com informações oficiais obtidas pela HRW. Na prática, estão suspensas milhares de multas contra infratores que destroem aquela que é a maior floresta tropical do Mundo.

“Os agentes ambientais têm trabalhado com afinco, expondo-se frequentemente a riscos consideráveis, para fazer cumprir o Estado de Direito e as leis ambientais do Brasil, mas veem os seus esforços sabotados pelo Governo de Bolsonaro”, disse a diretora da Human Rights Watch no Brasil, Maria Laura Canineu. “As violentas redes criminosas que destroem a floresta Amazónia e o direito dos brasileiros a um meio ambiente saudável não serão dissuadidas por multas que, na prática, não precisam pagar”, acrescentou a diretora.

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A área desflorestada na Amazónia brasileira em abril foi de 529 quilómetros quadrados, representando um aumento de 171% em relação ao mesmo período do ano passado, segundo dados do Instituto do Homem e Meio Ambiente da Amazônia (Imazon).

A informação foi recolhida pelo Sistema de Alerta de Desmatamento (SAD) do Imazon, instituto que não tem ligação ao governo brasileiro, que acrescentou que, entre o período de janeiro a abril de 2020, a desflorestação acumulada foi de 1.073 quilómetros quadrados, num aumento de 133% face ao mesmo período de 2019, quando a desflorestação totalizou 460 quilómetros quadrados.

Os números apresentados pelo Imazon contrastam com os dados divulgados no início do mês pelo Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (INPE, ligado ao Governo Federal), que relatou um aumento de 63,75% em abril, face ao mesmo mês do ano passado.

Em outubro, o executivo de Bolsonaro começou a aplicar o decreto que estabeleceu que as multas ambientais devem ser revistas em audiências de conciliação. Nessas audiências um núcleo de conciliação ambiental pode oferecer descontos ou declarar nulo o auto de infração, segundo a ONG.

O Ministério do Meio Ambiente estabeleceu a suspensão dos prazos para pagar essas multas até que a audiência seja realizada. Antes de outubro, quando os fiscais do IBAMA apanhavam em flagrante uma violação à lei ambiental, emitiam uma multa no local para pagamento imediato.

De outubro passado até ao início do ano, o IBAMA não realizou audiências de conciliação, tendo sido efetuadas apenas cinco de janeiro até abril, informou o órgão do Governo à HRW.

De acordo com a legislação brasileira, as multas prescrevem após cinco anos no âmbito do procedimento administrativo e, em certas circunstâncias, em três anos, período após o qual os os infratores não precisam de efetuar o pagamento.

Segundo padrões internacionais, o governo deve agir contra danos ambientais, o que inclui a adoção de medidas para estabelecer, manter e garantir o cumprimento de marcos jurídicos e institucionais eficazes para garantir um meio ambiente seguro, limpo, saudável e sustentável. As políticas do Governo Bolsonaro desrespeitam essas obrigações”, advogou a ONG.

Além da suspensão efetiva de multas, a HRW denunciou ainda a exoneração de funcionários do IBAMA em “aparente retaliação por uma operação bem-sucedida contra mineração e desflorestação ilegais na Amazónia”, como mais uma das várias medidas do Governo de Bolsonaro “para enfraquecer a aplicação das leis ambientais”.

“Os agentes ambientais do Brasil veem-se cada vez mais ameaçados pelos dois lados — pelas redes criminosas que enfrentam no campo e pelo próprio Governo. Eles temem que, ao fazerem o seu trabalho corretamente, possam perdê-lo”, afirmou Maria Laura Canineu.