O pedido de desculpas está feito e a ilustração foi retirada. Vinte e quatro horas depois das acusações de racismo, a autarquia de Martinica — ilha nas Pequenas Antilhas, no Caribe, e região ultramarina da França — anunciou a sua decisão no Twitter.
A polémica começou quando, na mesma rede social foi publicado um cartaz a apelar ao distanciamento social. Até aqui, tudo bem, o problema é que o metro de distância era ilustrado como correspondendo a cinco ananases. Isso levou a uma onda de críticas no Twitter e de acusações ao autarca Stanislas Cazelles de racismo e de revivalismo do colonialismo francês.
“Acabámos de remover a ilustração publicada ontem sobre o distanciamento físico. Pedimos desculpas se atingiu algumas pessoas. O único objetivo era mostrar a importância do distanciamento da epidemia”, lê-se na publicação.
Nous venons de retirer l'illustration publiée hier concernant la distanciation physique. Nous présentons nos excuses si elle a pu heurter certains d'entre vous. L'unique objectif était de montrer l'importance de la distanciation face à l'épidémie. Bien cdt. Service communication.
— Préfet de la Martinique (@Prefet972) May 23, 2020
Entre os vários críticos, surge Jean-Luc Mélenchon, líder do partido de extrema esquerda França Insubmissa, que considerou o cartaz uma vergonha. “O autarca dirige-se aos habitantes da Martinica e o estado publica este cartaz?”, escreveu no Twitter.
Le préfet s'adresse aux habitants de la Martinique et l'Etat édite cette affiche ? La macronie c'est cette honte aussi. pic.twitter.com/L1PELXAgnY
— Jean-Luc Mélenchon (@JLMelenchon) May 23, 2020
Uma outra publicação é do jornalista Taha Bouhafs, nascido na Argélia, e conhecido militante antirracista franco-algeriano. “Isto é uma piada ?! Portanto, a autarquia de Martinica aconselha os martinicanos a respeitar uma distância social de 5 ananases entre eles??”, escreveu na mesma rede social.
C’est une blague ?!
Donc la préfecture de Martinique conseille aux martiniquais de respecter une distance sociale de 5 ananas entre eux ???????? ??#RépubliqueColoniale https://t.co/W670Dr10Uk
— Taha Bouhafs (@T_Bouhafs) May 23, 2020
A maioria das publicações que surgiram no Twitter de naturais de Martinica são contra o conteúdo do cartaz, mas também há quem não tenha encontrado qualquer problema na imagem.
“Explicam-me onde está o problema, por favor? É apenas uma maneira divertida de passar a mensagem. E eu sou de Martinica antes que alguém venha dizer que sou racista ou algo assim”, escreve um utilizador.
Já outra utilizadora ironiza e escreve que “aparentemente os habitantes de Saint Etienne desconhecem o racismo e o neocolonialismo dos quais são vítimas”. A ilustrar a publicação, utiliza uma imagem de um cartaz onde a distância de um metro e meio é medida exatamente em ananases.
#martiniquais apparemment les habitants de saint Étienne sont pas au courant du racisme et du néocolonialisme dont ils sont victimes ???????????? pic.twitter.com/DbOCn0iObF
— Karlii Kréyol (@FrAntillaise) May 23, 2020
Sobre a escolha dos ananases, um outro utilizador argumenta que esse não é o problema fundamental. “O problema não é tanto o ananás (perguntei a um amigo de Martinica). Vejam a diferença para este poster da Polinésia. Reparem também que 23 de maio não é uma data trivial nas Antilhas.”
Na ilha, a data de 23 de maio está relacionada com a abolição da escravatura.
Le problème n’est pas tant les ananas (j’ai posé la question à un ami, Martiniquais). Voyez la différence avec l’affiche en Polynésie. Notons également que le 23 mai n’est pas une date anodine aux Antilles. pic.twitter.com/Q5gXVUO5dS
— TenaheFt (@jtenahe_f) May 23, 2020
A um jornal francês, a autarquia argumentou que várias regiões personalizaram os seus cartazes com o ambiente local, sem qualquer polémica.
Por exemplo, na Austrália há vários cartazes oficiais com a distância em cangurus e na Flórida, EUA, usaram-se jacarés. No Canadá, a distância é ilustrada com um taco de hóquei, e na Alemanha com 18 copos de vinho.
Em Portugal, nos Açores, o Partido Socialista ilustrou a distância com uma vaca.