O foco de contágio na zona da Azambuja voltou a ser um dos temas principais da conferência de imprensa que a Direção-Geral da Saúde faz diariamente com o Ministério da Saúde. No último sábado, Marta Temido já tinha feito uma caracterização dos recentes surtos na região de Lisboa e Vale do Tejo, responsáveis pela maior concentração do números de novos casos nesta região do país. Este domingo, os números chegaram via Graça Freitas.

A diretora-geral da Saúde fez saber que, à última atualização, são 109 os casos positivos entre os trabalhadores do entreposto da Sonae, na Azambujanúmero que começou por ser 70, na passada quarta-feira –, e que apenas uma pessoa se encontra hospitalizada, porém em enfermaria e com uma “situação estável”. Os restantes encontram-se assintomáticos, outros apresentam sintomas leves.

O que se passa na Azambuja?

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Graças Freitas falou ainda em casos positivos noutras duas empresas da mesma zona — dois numa, e três numa terceira, números que não têm registado evolução, segundo a diretora-geral da saúde. Autoridades de saúde, autarquias e empresas têm sido convocadas, segundo a diretora-geral da Saúde, para a resolução do problema.

Relativamente às entidades empregadoras, há reuniões no sentido de estas organizarem as pausas dos trabalhadores, os circuitos de entradas e saídas e dentro das empresas e a utilização dos espaços comuns”, reforçou Graça Freitas.

Também a ministra da Saúde voltou ao tema já abordado no último sábado, quando apontou os momentos de relaxamento, os almoços, as mudas de roupa e o método de transporte para o trabalho como origens prováveis dos surtos identificados na região de Lisboa e Vale do Tejo. Questionada sobre a responsabilidade das empresas na prevenção e gestão destes mesmos, Marta Temido esclareceu que os intervalos enquanto momentos de relaxamento fazem parte do “período normal de trabalho”.

Quando referimos alguma descontração que as vezes é tida, isso não significa que haja uma desresponsabilização das entidades que coordenam o local de trabalho. Obviamente que os contactos que estão a ser feitos são com as entidades empregadoras”, assinalou a ministra da Saúde.

“Há momentos ao longo do nosso dia em que todos tendemos a aligeirar os nossos gestos, os nosso comportamentos, a nossa disciplina sobre os mesmos. A mim acontece-me diversas vezes ser chamada à atenção: ‘cuidado, não esquecer disto’. É com esta simplicidade que abordámos ontem o tema das pausas, dos intervalos, e não procurando desculpar ninguém ou isentar de responsabilidades os próprios indivíduos”, disse.

R 1,01 e o relatório semanal da epidemia em Portugal

No dia em que deu conta de mais 14 mortes e 152 novos casos, Marta Temido apresentou um balanço semanal da evolução da pandemia no país. O famoso R — número médio de casos secundários a que cada caso dá origem — é agora de 1,01, com base nos dados de 17 e 21 de maio. Este é um importante indicador para medir o ritmo a que o vírus se está a propagar.

Além da média nacional, a ministra deu a conhecer as oscilações entre regiões, também elas apuradas pela Unidade de Investigação Epidemiológica do Instituto Nacional de Saúde Doutor Ricardo Jorge — 0,97 no Norte e 1.02 no Centro e em Lisboa e Vale do Tejo. Desde o início da pandemia que o indicador variou entre 0,81 e 2,33.

Covid-19. Contágio em Lisboa (e Vale do Tejo) quatro vezes mais rápido do que a média nacional

Lisboa e Setúbal são, por esta altura, os distritos com mais novos casos, com 55% e 13%, respetivamente. Tendo em conta os dados da última semana, é ainda possível apontar que metade dos novos casos eram assintomáticos e que mais de um terço das novas infeções são pessoas entre os 2o e os 39 anos. Quanto ao meio em que se dá o contágio, foi possível apurar que 45% dos novos casos foram transmitidos entre coabitantes, 19% decorreram em ambiente laboral, 11% em lares de idosos e 10% em contextos sociais. 

Os novos ventiladores, os testes e as avaliações feitas “com calma”

Temido informou ainda que chegaram 60 novos ventiladores, resultado de uma encomenda feita pelo SNS, e que estes estão agora a ser verificados e testados. “Equipamentos anteriores de outro modelo, submetidos a este tipo de procedimentos, revelaram características que tiveram de ser revistas tecnicamente, sendo este um processo agora em curso”, concluiu.

A ministra lembrou que Portugal, até agora, ainda não precisou de usar nenhum dos novos ventiladores comprados, uma vez que a capacidade do país tem sido suficiente. Por isso, a avaliação pode ser feita “com calma”. “Em ambiente normal encontram-se falhas, mas são situações que são corrigidas e ultrapassadas”, referiu.

Infarmed proíbe distribuição de testes que já estão a ser usados em lares e creches. Parecer positivo foi recusado

Marta Temido recorreu ao mesmo argumento —  de que a descoberta de falhas deve levar à “tranquilidade de que quem tem a função de avaliar o está a fazer” — quando confrontada com a notícia do Observador da proibição, por parte do Infarmed, da distribuição do kits de teste à Covid-19 que já estão a ser usados em lares e creches. “A circunstância de nós termos as nossas autoridades reguladoras a referirem que determinados artigos ainda não estão em condições de serem comercializados é apenas sinal de que estão a funcionar e a fazer o seu papel”, adicionou.

O hospital de Loures e as visitas à família

Em relação à reportagem emitida este sábado pela RTP sobre a situação do hospital Beatriz Ângelo, em Loures, segundo a qual há doentes com Covid-19 a ficar internados por não terem para onde ir, a ministra reagiu dizendo que o problema em questão não é novo e também se relaciona com o facto de o SNS não abandonar ninguém “à sua sorte”.

“Há circunstâncias em que os utentes que aguardam em ambiente hospitalar não são utentes à espera da resposta da rede nacional de cuidados integrados, mas sim à espera da resposta social”, explicou. “As soluções poderão envolver quer a deslocação de utentes para outros hospitais quer o encaminhamento para estruturas específicas”.

Ainda sobre o Serviço Nacional de Saúde, também a retoma de consultas a cirurgias esteve em cima da mesa. “O plano ainda está a ser desenhado”, segundo a ministra, que adiantou que os principais focos continuam a ser a dermatologia, ortopedia e oftalmologia, por serem as especialidades que continuam com listas de pedidos pendentes mais longas, mas também a neurocirurgia, que inclui procedimentos que só podem ser realizados no SNS. “Ate ao final da semana passada, mais de 30% da atividade de consultas e cirurgias que havia sido suspensa já estava remarcada”, adicionou.

Sobre um possível relaxamento dos cuidados em plena fase de desconfinamento, ambas as intervenientes deixaram alertas nesta conferência de imprensa. Marta Temido apelou à responsabilidade individual como alternativa a uma “sociedade extraordinariamente normativizada”.

Já Graça Freitas ficou-se no caso específico de visitas entre famílias e amigos em casa, já que os coabitantes representam, neste momento, a grande fatia de novos casos de infeção. “Se não tiverem regras de distanciamento físico, método de proteção de barreira, higienização das mãos, potenciam o aumento do número de casos. Cuidado com esta nossa vontade de voltar a ver os nossos familiares e os nossos amigos em ambiente domiciliário, pode estar a fazer aquilo a que se chama cruzamento de infeção”, rematou a diretora-geral da Saúde.