Os tempos de espera para as cirurgias eletivas têm vindo a aumentar em Portugal desde 2011. A conclusão é de um estudo da Organização de Cooperação e Desenvolvimento Económico (OCDE), divulgado esta quinta-feira.

O documento, intitulado “Tempos de Espera para os Serviços de Saúde: o Próximo na Lista” (tradução livre de “Waiting Times for Health Services: Next in Line”), dá conta de que, ainda antes da pandemia do novo coronavírus, havia países cujos tempos de espera para as cirurgias eletivas já tinham aumentado, como é o caso de Portugal.

É que apesar de, na década anterior, se ter registado uma diminuição destes tempos de espera — que, de acordo com a OCDE, costumam ser os mais longos —, a partir de 2011 têm vindo a aumentar progressivamente. Esta diminuição deveu-se essencialmente “a políticas de oferta de escolha aos doentes” e ao “envolvimento do setor privado quando este tempos atingissem determinados níveis”, explica a OCDE. Algo que aconteceu tanto em Portugal, como na Dinamarca.

No caso de Portugal, graças ao Sistema Integrado de Gestão de Inscritos para Cirurgia (SIGIC), que foi criado em 2004 e que inclui os vales-cirurgia — que permitem que o doente seja encaminhado para hospitais privados ou sociais, com convenção com o Sistema Nacional de Saúde (SNS), quando o hospital público onde iria realizar a cirurgia não consegue dar resposta em 75% do tempo máximo de espera previsto — a lista de espera para cirurgias diminuiu 39% entre 2005 e 2010, tal como a mediana do tempo de espera para algumas cirurgias eletivas.

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119 dias de espera para cirurgia às cataratas em 2018

Contudo — e ao contrário da Dinamarca —, Portugal não conseguiu manter estes tempos de espera, que voltaram a aumentar a partir de 2011. Por exemplo, num gráfico deste mesmo estudo, é possível ver que a mediana do tempo de espera para uma cirurgia às cataratas em 2006 era pouco mais de 150 dias, enquanto em 2011 era de 50 dias. O tempo de espera, no entanto, aumentou a partir desse ano: em 2016, ultrapassou a mediana dos 100 dias, situando-se em 2018 nos 119 dias.

Este aumento também é possível ver na cirurgia de colocação de prótese de joelho, ainda que com uma maior inconstância. Em 2006, a mediana do tempo de espera era superior a 250 dias, tendo chegado a menos de 150 dias em 2010 — valor mais baixo entre 2006 e 2018. A partir desse ano, porém, a mediana do tempo de espera subiu para os 200 dias, rondando sempre este tempo de espera até 2018 (204 dias, mais concretamente).

Relativamente à cirurgia de colocação de prótese de anca, outro exemplo da OCDE, a mediana do tempo de espera era praticamente de 100 dias em 2006 e em 2010 chegava perto dos 50 dias. Um tempo de espera que começou a subir nesse ano, sendo que em 2018 a mediana estava nos 126 dias.

O tempo médio de espera para tratamento cirúrgicos era de 2.9 meses em 2015, tendo aumentado aos poucos para 3.3 meses em 2018″, lê-se no estudo da OCDE, que refere ainda que, apesar de terem aumentado o número de cirurgias em 6%, isso não foi suficiente para o aumento de 7% do número de pessoas nas listas de espera.

Mais: a percentagem de doentes à espera há mais de três meses também aumentou nos últimos anos. Em 2008,a percentagem de pessoas que aguardava por uma cirurgia às cataratas há mais de três meses não chegava aos 40% e, dez anos mais tarde, já estava ligeiramente acima dos 50%.

Quanto às cirurgias de colocação de prótese de anca e de joelho, também se nota uma subida, apesar de não ser tão acentuada. No primeiro caso, quase 70% das pessoas estavam à espera há mais de três meses em 2018, sendo que essa percentagem, em 2013 e 2008, estava mais próxima dos 60%. Relativamente à colocação de prótese de joelho, 70% das pessoas estavam em lista de espera há mais de três meses, um pequeno aumento relativamente a 2008 e 2013.

Portugal entre os países da OCDE que dão prioridade aos tempos de espera

Apesar deste cenário, a OCDE aponta Portugal como um dos 16 países da organização cuja prioridade aos tempos de espera nas políticas de saúde é elevada, tal como a Grécia, a Dinamarca, a Irlanda, a Hungria e os Países Baixos. Já a Espanha, a Polónia e o Reino Unido, por exemplo, são destacados como países que atribuem uma prioridade média-alta a esta questão. A organização considera que os tempos de espera na Alemanha, na Suíça e nos Estados Unidos têm baixo nível de prioridade nas políticas de saúde.

Isto, contudo, não quer dizer que seja uma prioridade para todos os serviços: dos 24 países da OCDE, os tempos de espera nos tratamentos eletivos são vistos como um problema para 21 dos 24 países da OCDE e apenas 12 consideram o mesmo nos cuidados de saúde primários e nos cuidados cardíacos. No caso de Portugal, os tempos de espera são vistos como um problema nos tratamentos eletivos, nas consultas de especialidade, nos testes de diagnóstico, nos serviços de urgência, nos cuidados de saúde primários e nos cuidados cardíacos e oncológicos. Não são, contudo, considerados um problema nos serviços de saúde mental.

Outro dado destacado pela OCDE relativamente a Portugal tem a ver com o facto de Portugal ter investido significativamente, nos últimos anos, na formação de especialistas em Medicina Geral e Familiar e no recrutamento de médicos para as unidades de cuidados de saúde primários.