Uma situação que se mantém “genericamente estável” e com características muito diferentes da do início da epidemia em Portugal, sobretudo devido à idade dos doentes infetados. Foi assim que a diretora-geral da Saúde, Graça Freitas, explicou a situação em Lisboa e Vale do Tejo, que regista uma série de focos e surtos localizados, nomeadamente nos concelhos da periferia da capital.

Na conferência de imprensa diária desta quinta-feira, a diretora-geral da Saúde deu mais pormenores sobre os surtos mais mediatizados, quer na Azambuja, quer no Bairro da Jamaica, e explicou quais os concelhos mais afetados. Ao contrário do que aconteceu há cerca de dois meses no norte do país, com maior número de casos e infetados de idade mais avançada — o que se traduziu num aumento da mortalidade —, a DGS destaca agora que a maioria destes casos dizem respeito a pessoas mais jovens. Contudo, admite que são também, na maioria, pessoas de classes sociais mais baixas, o que exigirá “uma estratégia diferente” da que foi tomada até agora.

Instado a comentar pelos jornalistas as declarações do deputado do PSD Ricardo Batista Leite — que, à saída da reunião do Infarmed, afirmou que está a ser equacionado aplicar medidas de desconfinamento diferentes para a zona de Lisboa e Vale do Tejo — o secretário de Estado da Saúde António Lacerda Sales começou por dizer que não iria “comentar essas declarações” e remeteu esclarecimentos para o Conselho de Ministros de amanhã. Fez questão, porém, de acrescentar a seguinte frase: “Este Governo não tende a adiar nada, toma as decisões certas, nos momentos certos”.

Surtos na Azambuja e no Jamaica estão “estáveis” e até já têm “recuperados”

Quanto aos casos na zona da Azambuja, Graça Freitas destacou que foram testados 833 trabalhadores do centro de produção da Sonae, dos quais 175 foram positivos: “São pessoas jovens, saudáveis, assintomáticas ou com sintomas muito ligeiros. Vão fazer a sua recuperação em casa”. Há um caso de um infetado jovem, mas com fatores de risco, que está internado.

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Graça Freitas confirmou ainda que, na Azambuja, para além da Sonae, foram ainda encontrados mais 7 casos em três outras empresas. E que há também casos registados no setor da construção civil e depois nos domicílios de vários destes trabalhadores.

Quanto ao Bairro da Jamaica, Graça Freitas disse que a situação “é estável e começa até a ter recuperados”, mas confirmou o encerramento de cafés, pedido pela ARS local, “porque se juntavam muitas pessoas nesses locais”.

A diretora-geral da Saúde fez questão de dar ainda mais pormenores sobre um foco de infeção específico num lar de idosos em Queluz, onde 6 funcionários e 32 utentes foram infetados. “Há uma intervenção em curso neste lar, quer por parte das entidades gestoras do lar, quer por parte das autoridades de saúde”, assegurou, destacando o plano de contingência da instituição. No entanto, “em nome da transparência”, fez questão de transmitir que dois dos utentes morreram com Covid-19.

Grande Lisboa com situação “mista”. Estratégia terá de ser “diferente” da que foi adotada no Norte do país

Os casos da Azambuja, do Bairro da Jamaica e do lar de Queluz ilustram a situação na região de Lisboa e Vale do Tejo, que Graça Freitas diz ser “mista”, “com várias tipologias.

Para além destes três casos, a diretora-geral da Saúde confirmou ainda que existem “alguns casos esporádicos” nos concelhos de Seixal, Odivelas, Loures e Queluz. “Se os puséssemos todos no mapa, os surtos maiores estão na zona suburbana, mais atingida, e depois há surtos mais pequenos que interessam mais a nível local.”

Graça Freitas destacou que a situação agora em Lisboa e Vale do Tejo é bastante diferente da que se registou no Norte do país, no início da epidemia. “Refletem momentos diferentes da epidemia e realidades diferentes, o que tem de ser bem medido”, avisou.

“A zona Norte foi atingida mais precocemente e alguns dos casos importados deram origem a cadeias de transmissão”, com muitos “casos importados de Itália, com um determinado padrão sócio-cultural”, especificou a diretora-geral de Saúde, relembrando que muitos dos casos na zona Norte se tratavam de comerciais e industriais que tinham estado em feiras comerciais no Norte de Itália. “

Também o padrão inicial foi distinto do que agora existe no que diz respeito às idades afetadas: tivemos mais casos e mais casos em pessoas idosas, nomeadamente acarretando consequências em internamentos e taxa de mortalidade”, afirmou Graça Freitas.

Agora, na região de Lisboa e Vale do Tejo, são sobretudo casos “de pessoas jovens, infetadas em ambiente laboral” portanto “a taxa de mortalidade não é tão elevada”, o que pode ser um sinal positivo. Contudo, o perfil dos infetados também é em tudo diferente: são na maioria pessoas com “condições sócio-económicas mais desfavorecidas, trabalhadores precários e populações migrantes”, o que implica a adoção de “uma estratégia diferente” da que foi aplicada para os surtos no Norte do país.

Infarmed e DGS vão emitir parecer sobre hidroxicloroquina

O secretário de Estado da Saúde, António Lacerda Sales, quis ainda destacar nesta conferênci de imprensa o aumento da capacidade de testagem nacional: “Mais de 45% dos testes de despiste da Covid-19 foram feitos em maio. Trata-se do mês em que foram feitos mais testes desde o início da pandemia em Portugal, 363 mil testes — e ainda falta contabilizar os dados de ontem”, afirmou.

Outro dos temas mais relevantes abordados na conferência de imprensa trata-se da posição oficial das autoridades de saúde nacionais perante o uso da polémica hidroxicloroquina no combate à Covid-19. A diretora-geral da Saúde esclareceu que está a ser analisada a situação em conjunto pela DGS, o Infarmed e a Agência Europeia do Medicamento e prometeu que será emitida uma recomendação em breve: “Estamos literalmente a fazer a esta hora essa avaliação”, garantiu.

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