Quem, durante o isolamento, não jantou com amigos numa qualquer plataforma online e não acabou a fazer um brinde que ponha o dedo no ar. A verdade é que, durante todo o tempo que durou o estado de emergência, esta foi a solução encontrada por muitos de nós para manter a conversa em dia e o coração apaziguado de saudades. Mas agora o momento é outro, as saídas já são possíveis e o tal tchim-tchim pode ser feito olhos nos olhos e com muitos sorrisos à mistura. Vinhos perfeitos para a ocasião é coisa que, felizmente, não falta em Portugal. E se lhe juntarmos a imensidão que o nosso país tem para nos oferecer – seja a comida boa, as paisagens de cortar a respiração ou os magníficos monumentos – o único problema será decidir por onde começar. Para ajudar nessa questão, reunimos algumas sugestões de enoturismo para o levar a descobrir (ou redescobrir) cinco regiões vitivinícolas perfeitas para este desconfinamento. Ficam bem perto de si – no centro de Portugal – pelo que são ideais para passeios curtos de um dia ou fins de semana descontraídos. Convide amigos e familiares e deixe-se ir. Nós dizemos-lhe para onde.

Descobrir as terras do Dão

É uma das regiões vitivinícolas mais importantes do país e alguns dos seus melhores vinhos são reconhecidos internacionalmente, havendo até quem lhe chame a Borgonha portuguesa, por se identificarem semelhanças com os famosos vinhos daquela região francesa. Para que possa explorar a região como ela merece – com tempo para degustações e passeios sem pressa – sugerimos-lhe um dos cinco roteiros organizados pela Rota dos Vinhos do Dão, todos com diversas propostas de adegas para visitar com provas de vinho e petiscos à mistura nos concelhos de Viseu, Mangualde, Nelas, Tondela, Sátão, Penalva do Castelo, Santa Comba Dão, Mortágua, Aguiar da Beira, Fornos de Algodres, Arganil, Tábua, Gouveia, Seia, Oliveira do Hospital ou Carregal do Sal. Pelo meio, garanta que não deixa a região sem visitar o Solar do Vinho do Dão, em Viseu.

Como e quando ir?

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Na página do Turismo do Centro de Portugal, encontra todas as informações de que necessita para programar a sua visita. Quanto à melhor altura para o passeio, é agora, com dias longos e solarengos, que convém aproveitar para compensar os que foram passados em quarentena. No entanto, para que tudo corra bem e em segurança, é importante cumprir algumas regras decorrentes da situação que se vive:

– Use máscara em locais fechados e onde estiver com pessoas que não pertencem ao seu agregado familiar;
– Em restaurantes e outros locais abertos ao público, cumpra as regras solicitadas, nomeadamente desinfeção das mãos, distanciamento social e uso de máscara durante a circulação dentro de estabelecimentos fechados, quando não estiver na sua mesa;
– Evite aglomerações de pessoas e, nas filas para acesso a museus ou monumentos, mantenha o distanciamento;
– Sempre que possível, marque previamente todas as atividades que pretende fazer, para evitar contratempos e conhecer as regras de segurança específicas adotadas por cada unidade ou estabelecimento.

Se preferir pernoitar no local onde faz a prova, reserve um quarto na Casa da Ínsua, em Penalva do Castelo, e não se vai arrepender. Este solar em estilo barroco, construído no séc. XVIII e convertido em hotel de charme, mantém uma tradição vitivinícola que remonta ao séc. XIX e é hoje uma das unidades de enoturismo mais importantes da região. Além de provas de vinhos, pode passear pelos trilhos da quinta, participar na ordenha logo pela manhã, fazer queijo e compotas e até, quando é altura, vindimar e pisar as uvas no lagar.

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A Região Demarcada do Dão foi a segunda a ser instituída em Portugal, encontrando-se rodeada pelas serras do Caramulo, Buçaco, Nave e Estrela. É esta condição única que lhe confere um clima temperado e protegido de massas húmidas ou ventos agrestes continentais, com a maior parte das vinhas a serem plantadas em solos graníticos com afloramentos xistosos. Como resultado, obtêm-se vinhos tintos complexos e estruturados e brancos frescos. Nos tintos, a casta emblemática da região é a Touriga Nacional, mas são também de realçar a Alfrocheiro, Jaen e a Tinta Roriz. Nos brancos destacam-se as castas Encruzado, Bical, Cercial, Malvasia Fina, Rabo de Ovelha ou Verdelho.

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Por Lisboa de prova em prova

A variedade de paisagens e climas nesta região vitivinícola torna-a uma das mais diversificadas do país, mas também uma das mais produtivas. Um verdadeiro tesouro para apreciadores de vinho, que querem aproveitar estes dias de calor para fazer enoturismo à beira-mar, pelo meio de florestas frescas ou em busca de castelos encantados.

Para começar a explorar a região, sugerimos uma visita ao Museu do Vinho de Alenquer, que além da exposição sobre a evolução das técnicas e instrumentos relacionados com a arte de fazer vinho, permite ainda provar e adquirir a produção dos associados das Rotas dos Vinhos de Lisboa. Aliás, uma destas rotas é o que sugerimos que faça na mesma ocasião, podendo escolher um de três percursos: Quintas de Alenquer, Linhas de Torres ou Óbidos. A Quinta do Sanguinhal, no Bombarral, é uma das paragens obrigatórias, com um programa vasto e que merece atenção: é a própria família que recebe os visitantes, dando a conhecer a história de mais de um século a vinificar, seguindo-se visitas não só às vinhas, mas também aos jardins do século XIX, às destilarias da mesma época, com passagem por caves de envelhecimento – das mais antigas da região de Lisboa – e visita a um dos maiores e mais antigos lagares da Península Ibérica, terminando com prova exclusiva de seis vinhos da quinta.

E, já que está por Lisboa, não deixe de provar a famosa aguardente da Lourinhã, local icónico quando se fala nesta bebida. O solo da Lourinhã esconde segredos bem guardados, como os vestígios da era dos dinossauros ou as uvas que dão origem à única aguardente vínica portuguesa como região demarcada exclusiva. Constitui a primeira e única região demarcada do país somente para a produção de Aguardentes Vínicas, sendo uma das três regiões no espaço europeu, em posição de igualdade com as célebres aguardentes francesas – Cognac e Armagnac. Vá até à Adega Cooperativa da Lourinhã e conheça toda a história desta região vínica.

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Em busca de Baco na Beira Interior

Chegados à região da Beira Interior, o melhor é começar por percorrer as aldeias históricas da região, podendo seguir a rota turística sugerida pela Comissão Vitivinícola Regional da Beira Interior, que passa por Castelo Mendo, Castelo Novo, Castelo Rodrigo, Idanha-a-Velha, Marialva e Sortelha. Ali perto, já no concelho Belmonte, visite as caves da Quinta dos Termos e participe numa degustação dos vinhos ali produzidos, apreciando a envolvente da quinta, composta não só por vinhas, mas também por terras de cultivo de centeio e casas de quinteiro.

E, já que está nesta região, pode aproveitar para visitar o Solar do Vinho da Beira Interior, um museu num edifício magnífico onde pode conhecer os vinhos e, ainda, a região. Aproveite também para fazer provas de vinho na Adega de Castelo Rodrigo, excelente local de provas, e conheça o vinho Pinking, uma categoria de vinho “única no mundo”, que teve origem num trabalho de investigação de mestrado em Enologia. Aproveite ainda para conhecer a Adega 23, uma adega que está situada no extremo sul da Beira, entre a Gardunha e o Rio Tejo. Da varanda, avista-se a Serra de Mamede. Aqui, pode fazer provas de vinhos, piqueniques e workshops de iniciação à prova de vinhos.

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Na região da Beira Interior, os vinhos são fortemente marcados pela altitude que os envolve – os 16 mil hectares de vinha são rodeados pelas serras da Estrela, Marofa e Malcata – mas também pelos solos graníticos ou xistosos e ainda pelas grandes oscilações de clima, entre invernos gélidos e rigorosos e verões curtos e muito secos. Se a isto juntarmos a experiência destas gentes, que sabe vinificar desde o tempo dos romanos, temos o enredo perfeito para o fabrico de vinhos memoráveis, ideais para acompanhar um cabrito assado em Castelo Branco ou uma dobrada à moda da Covilhã, entre muitas outras iguarias, para compensar os jejuns do isolamento.

Para a frescura que caracteriza toda a produção vinícola, muito contribuem as castas mais comuns da região, como sejam a Rufete, Touriga Nacional, Touriga Franca e Tinta Roriz nas tintas, enquanto nas castas brancas pontuam a Síria, Fonte Cal, Malvasia e Arinto. Quando programar uma viagem até à Beira Interior para provar alguns destes néctares, não se esqueça de os casar com o que é devido, como o cabrito assado.

Com o Tejo ali tão perto

Continuando pelo centro de Portugal, o que não nos falta é vinho bom para brindar. E tudo nos pode servir de pretexto, assim haja imaginação e empenho, que é algo que caracteriza quem, na região do Médio Tejo e lezíria do Tejo, se dedica a produzir vinho. Numa área delimitada pela serra de Aires e Candeeiros encontramos outra região vitivinícola que recebe o nome do rio que a percorre e a cujos vinhos vale a pena prestar atenção.

Sem perder tempo, vamos já para a Quinta Casal da Coelheira, em Abrantes. Na primeira metade do séc. XX, a dedicação à produção agrícola de diversas culturas, fez com que nascesse um ambicioso projeto no Ribatejo, que é nos dias de hoje uma paixão familiar de três gerações, que cresce nas margens do rio Tejo, junto à Vila de Tramagal, e que se estende por uma área com cerca de 250 hectares. É no paralelo 39 Norte, num clima mediterrâneo temperado e de baixa altitude, que as vinhas se distribuem. Passe por lá e aproveite para provar um vinho consistente e perfeito para uma tarde bem passada. Depois, pode pernoitar no Solar dos Loendros, uma quinta com experiências de Enoturismo que deve conhecer e, sugerimos ainda, visitar a Quinta S. João Baptista, Brogueira, em Torres Novas, uma casa do século XIX rodeada por jardins e próxima da Reserva Natural do Paúl de Boquilobo. Os seus vinhedos estendem-se por 110 hectares de solos calcários.

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A arte de fazer vinho nesta região é intemporal, mas sabe-se que o apogeu do comércio destes vinhos aconteceu no século XIII, sendo que, por volta de 1250, se exportavam cerca de 30 mil pipas para Inglaterra. Hoje, a região volta a conhecer um novo dinamismo, através dos seus tintos, brancos e frisantes.

Bairrada e o seu espumante

Ir à região da Bairrada e não experimentar um dos muitos espumantes de qualidade que por aqui são produzidos é algo quase tão inconcebível como não provar o leitão assado que nesta zona – sabe-se – também é divinal. Para descobrir a região, pode optar por um dos cinco percursos propostos pela Rota da Bairrada. Mas seja qual for o caminho escolhido, não deixe de visitar o Museu do Vinho da Bairrada, na Anadia. Já agora, aproveite o embalo para, ali bem perto, em Sangalhos, mergulhar (quase literalmente) no Aliança Underground Museum, o primeiro museu subterrâneo em Portugal a combinar arte com vinho. O Espaço Bairrada da Curia, a funcionar na antiga estação de comboios da estância termal com o mesmo nome, pede também uma passagem, já que mantém intacta a traça original, incluindo as antigas salas de espera e os respetivos bancos de madeira.

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Depois de tanto passeio, propomos-lhe que relaxe na Quinta Vale do Cruz, uma unidade de enoturismo que conjuga alojamento com visitas guiadas, prova de vinhos, vindimas e até um museu.

Sabe-se que os espumantes são elaborados na região da Bairrada desde 1890, pelo método clássico. Mas aqui também se encontram os vinhos tintos de boa qualidade, destacando-se pelo frutado quando jovens, evoluindo depois para uma sólida e mais complexa estrutura com o tempo. Entre as castas mais comuns destaca-se a Baga, uma casta tinta presente nesta região e que ocupa um lugar de destaque. Em solos argilosos e com boa exposição solar, a Baga consegue amadurecer e produzir vinhos muito escuros, concentrados em relação ao aroma e que podem envelhecer em garrafa durante muitos anos.

E, claro, é essencial falarmos de um vinho que tem tanto de sabor como de história: o Buçaco. Trata-se de um vinho icónico que foi servido a reis, a rainhas e a chefes de estado, como comprovam as ementas, orgulhosamente guardadas no Hotel Palace Bussaco. Beber um Buçaco é viajar no tempo, é recuar até às invasões francesas e à Ordem dos Carmelitas Descalços. Ou, ainda, à construção por D. Carlos I, do palácio do Bussaco,  é beber um vinho glorioso, criado por Alexandre Almeida.  Por isso, não perca a oportunidade para provar este vinho que é tido como um dos símbolos de Portugal.

Na Bairrada, há ainda outras castas magníficas presentes na região, como Castelão, Alfrocheiro, Tinta Pinheira e Touriga Nacional. Os vinhos brancos pontuam igualmente, com frescura e aroma frutado e reflexos esverdeados. As castas mais frequentes são a Arinto, Fernão Pires, Bical, Cercial e Rabo de Ovelha.

O próximo passeio que fará neste desconfinamento está aqui, com certeza, para que possa espairecer e respirar ar puro, enquanto descobre os nossos vinhos e reencontra o país – o nosso país – num centro aqui tão perto.

Saiba mais sobre este projeto
em https://observador.pt/seccao/centro-de-portugal/