O Banco Central Europeu (BCE) já está a conceber aquilo que assumirá a forma de um “banco mau“, capaz de absorver crédito malparado na banca europeia provocado pela pandemia Covid-19. O objetivo, segundo a agência Reuters, é evitar que os bancos europeus fiquem atolados em créditos tóxicos que não só lhes imponham perdas perigosas para o seu capital como, também, prejudiquem a capacidade das instituições para financiar as empresas e as famílias na recuperação da crise. O Mecanismo Europeu de Estabilidade, o fundo de resgates da zona euro, pode ter um papel.

O Financial Times já tinha noticiado, a 20 de abril, que o BCE estava a pressionar a Comissão Europeia para que se avançasse com um plano deste tipo. Isto porque o BCE sublinha que não há planos europeus de recuperação económica que possam ser bem sucedidos se, no terreno, o sistema financeiro estiver em crise – e o impacto súbito da crise económica causada pelo coronavírus arrisca gerar uma crise bancária que só pode ser evitada, como têm defendido economistas, ajudando a que os bancos possam retirar dos seus balanços os créditos fracassados relacionados com pandemia.

BCE pressiona Comissão Europeia a criar “banco mau” para receber crédito malparado

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Em causa estarão, potencialmente, várias centenas de milhares de milhões de euros em créditos que ficaram em risco ou em incumprimento devido à pandemia, tanto por empresas que entraram em paragem ou em dificuldades como por famílias que viram os rendimentos diminuírem, como por consequência do desemprego. Alguns cálculos apontam para mais de 500 mil milhões de euros em dívidas que estarão em perigo devido a esta crise económica.

Em Portugal e noutros países, para já, os bancos estão a conceder moratórias de pagamento de dívidas, o que atrasa o reconhecimento de muitos desses créditos como incobráveis mas que gera muitas dúvidas sobre a capacidade que um conjunto alargado de mutuários terá de continuar a refinanciar os créditos, nas condições normais, quando as moratórias terminarem.

A ideia de um “banco mau” já tinha sido proposta em consequência de última crise, mas nunca avançou a nível europeu. Antes da pandemia, o sistema bancário europeu estava sob pressão para acelerar a redução dos níveis de crédito malparado, muitos ainda relacionados com a crise bancária que se verificou no início da última década. Mas a pandemia de Covid-19 veio interromper, por completo, esse processo porque a nova crise económica produziu uma nossa massa de créditos em risco, potencialmente elevando os rácios de crédito malparado dos bancos para níveis insustentáveis.

O plano em cima da mesa, que envolve o Mecanismo Europeu de Estabilidade (o fundo para o qual todos os países contribuem), implicaria que esse mecanismo assumisse o papel de “fiador” desse “banco mau”. Esse veículo teria a capacidade para emitir dívida no mercado, com a garantia do Mecanismo Europeu de Estabilidade, e com essa dívida comprava aos bancos os créditos tóxicos. Depois, os bancos usavam esses títulos como colateral para obter financiamento junto do banco central.

Andrea Enria, responsável máximo pela supervisão bancária europeia, comentou recentemente que se considera um fã deste tipo de soluções de centralização de ativos tóxicos, salientando que na última crise vários destes veículos acabaram, no final, por dar lucro – tendo numa fase inicial sido decisivos para “desentupir” os bancos comerciais destes créditos problemáticos.

Enria disse que os bancos europeus têm mais de 600 mil milhões de euros em capital, o que deverá ser suficiente para responder a esta crise. A menos que haja uma segunda vaga de infeções e medidas restritivas.