Pelo quarto ano consecutivo que o número de população estrangeira a viver em Portugal não para de aumentar. Em resultado disso, em 2019, registou-se o valor mais alto desde a criação do Serviço de Estrangeiros e Fronteiras (SEF), em 1976: mais de meio milhão. São agora 590.348 os cidadãos estrangeiros residentes em Portugal — um aumento de 22,9% face a 2018. Os números foram divulgados esta terça-feira no Relatório de Imigração, Fronteiras e Asilo (RIFA) de 2019, publicado anualmente.

Para o SEF, “os efeitos da conjuntura económica favorável verificada nos últimos anos, particularmente o crescimento do emprego, terão potenciado o crescimento da população estrangeira” nos últimos quatro anos. Em 2015 o número de imigrantes era de 388.731 — o que significa que houve um aumento de 201.617 até 2019.

Estrangeiros a viver em Portugal entre 2015 e 2019

Fonte: RIFA 2019

A nacionalidade brasileira continua a ser a principal comunidade estrangeira residente em Portugal — seguida da população cabo-verdiana. Dos mais de 590 mil estrangeiros a viver em Portugal, 25,6% são brasileiros. É o valor mais elevado desde 2012.

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Mas é o Reino Unido que ocupa um lugar destaque: subiu duas posições e tornou-se a terceira nacionalidade estrangeira mais representativa. Em 2016, por exemplo, ocupava a sexta posição com apenas 19.384 residentes em Portugal — um número que em 2019 passou a ser de 34.358. A explicação pode ser uma: o efeito do Brexit — uma “variável importante a considerar na análise dos dados”, aponta o relatório.

Nacionalidades mais representativas entre a população estrangeira

Fonte: RIFA 2019

Em Portugal, 68,6% dos imigrantes concentram-se em Lisboa, Faro e Setúbal. Nestes três distritos estão registados 405.089 cidadãos estrangeiros. “Sete dos dez concelhos com maior número de cidadãos estrangeiros registados, pertencerem à área metropolitana de Lisboa”, aponta o RIFA. Mas foi Castelo Branco a registar um maior aumento (36,4%) de residentes em 2019, apesar de estar entre os distritos com menor número de estrangeiros a ali residir.

“Os motivos mais relevantes na concessão de novos títulos de residência foram o reagrupamento familiar (38.204), a atividade profissional (31.511) e o estudo (13.356)”, explica o RIFA, adiantando que se verifica uma “forte preponderância da atividade profissional nas nacionalidades indiana e nepalesa“.

Em 2019, foram registados menos vistos gold e o investimento também foi menor

No que diz respeito ao regime especial de autorização de residência para atividade de investimento, conhecidos por vistos gold, registou-se uma diminuição em 2019 relativamente ao ano passado. Em 2018, tinha sido registados 1.409 processos favoráveis — um número que baixou para 1.245. Em 2019, foram ainda registados 2.192 processos favoráveis para reagrupamento de familiares.

Feitas as contas, as decisões favoráveis para estes vistos gold, traduziram-se em mais de 742 milhões de euros de investimento, vindos principalmente da China e Brasil. Do total, cerca de 660 milhões de euros foram investidos na compra de imóveis.

Pedidos de nacionalidade aumentaram 79,4% e a maioria vem do Brasil e Israel

O relatório destaca também a “consolidação da tendência do crescimento do número de pedidos de aquisição da nacionalidade portuguesa”. Em 2019, o SEF registou 74.116 pedidos, quando em 2018 esse número era de 41.324 — um “aumento expressivo” de 79,4%. Do total de 70.529 pareceres emitidos, 68.116 foram positivos e 2.413 foram negativos.

Número de pedidos de nacionalidade nos últimos cinco anos

Fonte: RIFA 2019

São os cidadãos brasileiros (22.928) e israelitas (18.433) que mais fizeram pedidos em 2019, sendo que os países de onde mais se nota um crescimento acentuado de pedidos são Israel e Turquia. Segundo o SEF, estará “associado à publicação do aditamento ao Regulamento da Nacionalidade Portuguesa, de 2015, relativo à naturalização de estrangeiros que sejam descendentes de judeus sefarditas portugueses“.

De facto, 68,9% dos pedidos feitos são relativos à naturalização, sendo o casamento a segunda razão apontada para o pedido. No caso dos estrangeiros que pedem nacionalidade portuguesa por casamento ou união de facto, a maioria dos pedidos chegam do Brasil (5.215), seguido da Venezuela (709) e Angola (610).

Quebra nas ações de inspeção e fiscalização do SEF. Maioria dos ilegais são brasileiros

Ao longo de 2019, o SEF levou a cabo 5.036 ações de inspeção e fiscalização — um decréscimo de 0,3% face ao ano anterior. “A quebra registada deve-se, sobretudo, a uma maior concentração de efetivos em ações direcionadas para o controlo de fronteiras e à necessidade de desenvolver a resposta nacional para a crise migratória”, justifica esta força policial no relatório.

Na sequência destas ações, foram identificados 52.776 cidadãos. Desses, 2.247 eram cidadãos de países terceiros e em situação irregular. No que diz respeito às nacionalidades, 23,4% dos estrangeiros identificados em situação ilegal eram brasileiros, 13,7% eram indianos e 12,1% nepaleses.

Nacionalidade dos cidadãos ilegais detetados pelo SEF

Fonte: RIFA 2019

Ao contrário da tendência de decréscimo que se verificava desde 2016, foi registado um aumento de 33,9% de notificações para abandono voluntário do país. Em 2016, o número era de 5.470 e tinha vindo a diminuir desde então: situava-se nos 3.661 em 2018, mas em 2019, subiu para 4.834. Do total, 2.666 eram brasileiros.

Já o número de processos de expulsão do país continua a diminuir — uma tendência que se verifica desde 2017. Registou-se, em 2019, uma diminuição de 10,9% face ao ano anterior.  “As nacionalidades mais representativas são a brasileira (264), a cabo-verdiana (75), a guineense-bissau (54), a angolana (45) e a indiana (26)”, lê-se no RIFA.

Em 2019, o SEF cumpriu mais 4,7% de mandados de captura do que no ano anterior e impediu mais 15,8% de pessoas de entrar em Portugal do que em 2018, tendo também impedido também de sair 164 — um aumento de 5,1%.

SEF registou 587 crimes. Falsificação de documentos e auxílio à imigração ilegal são a maioria

Há também a notar que em 2019 o SEF registou 587 crimes associados a fenómenos migratórios. É a falsificação de documentos que ocupa a maior fatia, de 282 crimes, mas em grande destaque está também o auxílio à imigração ilegal,  com 126 casos registados. Segue-se o casamento de conveniência e tráfico de pessoas.

Tipologias dos 587 crimes registados pelo SEF

Fonte: RIFA 2019

Na sequência das investigações realizadas pelo SEF, 345 pessoas foram constituídas arguidas: a grande maioria de nacionalidade portuguesa (114) e brasileira 76). Nestes casos, os crimes que predominam são o de auxílio à imigração ilegal (97), casamento de conveniência (79), uso de documento falso/falsificado (45), tráfico de pessoas (33) e falsificação/contrafação de documentos (32). Do total, apenas 18 destes arguidos ficaram em prisão preventiva.

Número de vítimas de tráfico de pessoas aumentou 45,8%. Maioria é traficada para exploração laboral e sexual

Foram sinalizadas 86 vítimas de tráfico de pessoas em 2019. O que significa que houve um aumento em relação a 2018, altura em que o número era de 59 — mais 45,8% sinalizadas.

É para fins de exploração laboral que as vítimas mais são traficadas. De 2018 para 2019 o número quase duplicou, passando de 36 vítimas identificadas em 2018 para 64. Já o número de vítimas de tráfico de pessoas para exploração laboral mais que duplicou, de 5 para 11.

Vítimas sinalizadas pelo SEF e forma de exploração

Fonte: RIFA 2019

Do total de vítimas sinalizadas, as nacionalidades mais relevantes são a moldava (45), a romena (12) e a angolana (7).

Estrangeiros impedidos de entrar aumentaram 32,9%. Maioria por falta de visto ou de motivos para entrar no país

Se as ações de fiscalização do SEF diminuíram 0,3%, os controlos nas fronteiras sofreram um aumento de 14,6%. A grande maioria, cerca de 18 milhões, foram controladas em fronteiras aéreas e cerca de dois milhões em fronteiras marítimas, com mais de 54 mil embarcações controladas.

O número de estrangeiros impedidos de entrar em Portugal sofreu um aumento de 32,9%. Em 2019, 4.995 pessoas foram impossibilitadas de passar a fronteira. “Cerca de 79,4% das recusas de entrada incidiram sobre cidadãos nacionais do Brasil (3.965), sendo as restantes nacionalidades mais relevantes a angolana (202), a guineense-bissau (72) e a senegalesa (54), não tendo sido possível determinar a nacionalidade de 36 pessoas”, lê-se no RIFA.

Motivos de recusa a entrada de estrangeiros

Fonte: RIFA 2019

Do total de quase cinco mil pessoas impedidas de entrar, a grande maioria (2.618) viu a sua entrada recusada por não ter visto ou por o visto ter caducado. Ou ainda por não apresentarem motivos válidos que justifiquem a entrada no país (1.848).

Pedidos de asilo aumentaram, especialmente os feitos por cidadãos do continente americano

Depois de uma descida em 2018, em 2019 voltou a registar-se um aumento dos pedidos de asilo: foram feitos 1.849, um aumento de 45,3%. Do total, 73,1% dos pedidos foram apresentados por homens e 87,3% dos requerentes tinham menos de 40 anos de idade. Quanto à origem dos requerentes, o continente Africano foi o mais representativo (76,7%), seguido do americano (8,7%) e do asiático (7,4%). No entanto, foi o continente americano a registar uma grande subida de 56,3%.

“Portugal tem participado no acolhimento voluntário de migrantes resgatados em operações de salvamento realizadas no Mediterrâneo, por barcos humanitários, e desembarcados em Malta e em Itália”, lembra o SEF. E, em 2019 Portugal acolheu 100 requerentes de proteção internacional: 52 a partir de Malta e 48 de Itália. “Destacam-se enquanto nacionalidades mais representativas: Somália (17), Nigéria (15), Sudão (11), Costa do Marfim (8), Mali (8), República da Guiné (7), Eritreia (6), Camarões (6), Guiné-Bissau (5), Egito (4), Senegal (4)”, lê-se no RIFA.

Durante o ano de 2019, foram registados 46 pedidos de asilo de menores não acompanhados — mais dez do que no ano anterior. O que inverte a tendência de diminuição que se vinha a registar desde 2017.

Já o número de estatutos de refugiado concedidos diminuiu, passando de 286 para 183 — uma descida de 36%. Do total, predominam os cidadãos provenientes de países asiáticos.