Há exatamente três anos, Bruno Fernandes assinava pelo Sporting. O nome não era propriamente estranho, pelos encontros (e exibições) que fazia na seleção Sub-21 de Portugal, mas nunca tinha feito qualquer jogo na Primeira Liga apesar da formação entre Pasteleira e Boavista. Por cá, era aquele miúdos de cabelo mais comprido que andou no Novara, que brilhou na Udinese, que deu nas vistas depois pela Sampdória. O miúdo que não tinha medo de rematar à baliza nem de arriscar nos passes longos mesmo quando não saíam bem à primeira, à segunda ou à terceira. Ainda assim, o miúdo, na altura com apenas 22 anos. Um miúdo que foi a quarta contratação mais cara de sempre do clube de Alvalade (atrás de Bas Dost, Acuña e Elias), que ficou com uma cláusula de rescisão de 100 milhões mas que, dois anos depois, tornou-se na maior transferência de sempre dos leões.

O rapaz que sonha muito antes dos jogos e reclama a dormir que lhe passem a bola

Logo na primeira temporada, o médio justificou a contratação. Aliás, nos primeiros jogos oficiais já mostrava que não tinha sido um custo mas sim um (bom) investimento. “Sou um jogador de sacrifício. Por vezes sei que exagero nas corridas que dou e na pressão porque quero ocupar o campo todo. O mister tem insistido comigo na perceção dos momentos de pressão e, a nível ofensivo, diz para não andar tanto nas alas porque acredita que posso ser mais influente na zona central”, salientava em agosto de 2017, quando se começava a destacar na equipa de Jorge Jesus jogando mais próximo do avançado ou como ‘8’, consoante as necessidades coletivas. “Não durmo mal, sonho é muito, principalmente com futebol. A minha prioridade também se revela aí, sou muito focado (…) Ainda hoje a minha mulher diz que reclamo durante o sono ‘Passem-me a bola!’. É como se estivesse mesmo dentro do jogo”, acrescentou em entrevista aquele que se tornou rapidamente num dos elementos chave da equipa.

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Ao todo, e em ano de estreia, fez 56 jogos entre Campeonato, Taça de Portugal, Taça da Liga, Liga dos Campeões e Liga Europa, marcando 16 golos e fazendo outras tantas assistências em 4.706 minutos. No entanto, aquilo que em termos individuais deveria ser uma grande temporada (no plano coletivo os leões falharam todos os objetivos a não ser a entrada na fase de grupos da Champions) terminou da pior forma, a rescindir com o Sporting em vésperas de início do Mundial de seleções na Rússia após a invasão à Academia, em Alcochete. Após o Campeonato do Mundo, e com propostas milionárias na mão (por ser um jogador “livre”, assim ganhasse depois em tribunal a disputa), seguiu o coração e deu uma segunda oportunidade ao clube que lhe abrira as portas de Portugal e da Seleção, fazendo um novo contrato com a formação verde e branca tal como Bas Dost e Battaglia.

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Se a primeira época tinha sido boa, a segunda duplicou esse rendimento em todos os adeptos. Literalmente: em 53 jogos feitos nas várias competições, passou de 16 para 32 golos, naquela que foi a melhor prestação de um médio numa dos principais países europeus numa só temporada. Mais do que isso, mais do que jogar a ‘8’, ’10’ ou falso ala, assumiu redobrado protagonismo no próprio clube, ascendendo a capitão após a saída de Nani e sendo a cara dos sucessos e insucessos num ano que acabou com uma Taça de Portugal e uma Taça da Liga. A saída era algo inevitável, embora não tenha acontecido para o Tottenham no verão mas sim para o Manchester United no mercado de inverno, com um recorde leonino de 55 milhões de euros (mais 25 milhões por objetivos).

55+5+5+15 e 10% da mais-valia: os números oficiais da venda de Bruno Fernandes ao Manchester United

Três anos depois, encontra-se ao nível dos melhores médios do mundo. Mais: segundo o Observatório do Futebol (CIES), é mesmo o médio com maior valor de mercado das cinco principais ligas europeias, ultrapassando outros pesos pesados como Frenkie De Jong ou Rodri com uma avaliação de 104,9 milhões de euros, quase o dobro do que foi pago ao Sporting em janeiro. E também no Manchester United não demorou a mostrar a sua influência, ao ponto de, entre oito alterações promovidas por Solskjaer em relação à equipa que derrotou o Sheffield United na Premier (incluindo Diogo Dalot), ter sido um dos três resistentes a par dos defesas Maguire e Luke Shaw. No entanto, e entre todas essas alterações, o encontro para os quartos da Taça com o Norwich foi tudo menos fácil.

Com os visitados a conseguirem colocar as linhas defensivas muito juntas para não permitirem aqueles espaços que são mais procurados pelo médio português, os red devils sentiram dificuldades em chegar à área contrária e até foi o Norwich a ter lances de perigo não concretizados junto da baliza de Romero. No entanto, e após o intervalo, a lei do mais forte imperou em Carrow Road com um golo logo a abrir o segundo tempo de Ighalo a aproveitar uma bola perdida na área após remate cortado de Juan Mata para bater Tim Krul e inaugurar o marcador (51′). O empate por Cantwell à entrada do último quarto de hora obrigou Solskjaer a mexer, o regresso de Matic e Pogba ao meio-campo com Bruno Fernandes permitiram que a equipa recuperasse o equilíbrio no corredor central mas a pressão teve como único resultado a expulsão do central Klose antes de tudo ficar adiado para o prolongamento.

Mesmo com uma exibição em quebra, a falhar mais passes e a ter perdas de bola pouco habituais, Bruno Fernandes não desistiu, foi continuando a colocar-se em terrenos de construção no cerco montado à baliza de um Norwich que deixou de ter capacidade de saída com menos uma unidade mas o golo surgiu quando já se pensava nas grandes penalidades, com Maguire a aproveitar um lance confuso na área que começou com um passe de Pogba para Ighalo para rematar de pé esquerdo e carimbar a passagem do Manchester United às meias-finais da Taça (118′).

Contas feitas, Bruno Fernandes leva 13 jogos desde que chegou a Old Trafford entre Campeonato, Taça e Liga Europa. Nunca perdeu, ganhou nove vezes, já marcou quatro golos, fez outras tantas assistências. E é o próprio que assume que, dentro do clube, é muitas vezes comparado com Ronaldo nas pequenas coisas do dia a dia. “Quando cheguei ao Manchester United, as pessoas que trabalham no refeitório disseram-me: ‘Sabias que o Cristiano passava por aqui e dizia bom dia a toda a gente?’. Há duas senhoras que vêm ter comigo todos os dias e dizem: ‘O Cristiano fazia isso e tu também precisas de fazer o mesmo'”, contou em entrevista ao portal SoccerBible. Com as devidas diferenças salvaguardadas, o português vai fazendo o seu caminho seguro como os maiores.