“À porta fechada, que é como se jogam as partidas da Liga, hoje não se irão ouvir assobios contra o presidente do Barça nem cânticos de ‘Espanyol para a Segunda’ em Camp Nou. Um dérbi mudo resulta de forma surpreendente quando há tanto ruído à sua volta de duas equipas em situação de extrema necessidade. Ao Barça só vale a vitória para manter as aspirações ao título que parece reservado para o Real Madrid, líder com quatro pontos de vantagem quando faltam quatro jornadas para acabar a prova, sendo que o Espanyol descerá de divisão se sair derrotado do campo do Barça”. Se o Sport lançava o dérbi da Catalunha como “uma fórmula para crescer tendo em vista a Liga dos Campeões e a Marca falava em “dérbi definitivo”, o El País era mais cáustico: “Dérbi das lamentações”.

Griezmann abriu uma prenda, Piqué fez o gesto do laço e o Barcelona goleia a queixar-se do VAR a favor do Real

Havia contas por acertar, neste caso entre o maior clube da região e o grande rival. Contas com juros, porque já se passaram há 13 anos: na penúltima jornada, em pleno Camp Nou, dois golos de Lionel Messi não chegaram para o Barcelona vencer o Espanyol, que empatou por Raúl Tamudo em cima do minuto 90 e entregou assim o título de bandeja ao Real Madrid. Os periquitos, que contavam na altura com Kameni, Luis Garcia, Jarque, Rufete (atual treinador depois da saída de Abelardo, deixando o cargo de diretor desportivo) ou Ivan de la Peña, o médio formado nos blaugrana que marcou o golo da última vitória do Espanyol fora com o rival, em 2009, podiam não lutar pelo Campeonato mas tinham equipas para lugares europeus. Agora, nem por sombras.

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Numa temporada onde perdeu Borja Iglésias, Mario Hermoso ou Esteban Granero, aquele tipo de jogador que com mais ou menos anos ou utilização faz falta em qualquer plantel, o Espanyol investiu quase 60 milhões, dos quais 20 no mercado de inverno naquela que foi a sua maior contratação de sempre (e de longe): Raúl de Tomás, o avançado espanhol que não se adaptou à realidade nacional após seis meses de Benfica. Foi, em tudo, uma política errática, em termos desportivos e financeiros, com o proprietário do clube, os chineses do Rastar Group. Nem a dança de treinadores (vai no quarto) inverteu a péssima campanha que deu sinais de melhoria após a retoma com a vitória frente ao Alavés e o empate com o Getafe antes de cinco derrotas consecutivas e a condenação certa.

Carimbar essa descida do rival funcionava como um acerto de contas com o passado mas promover a tristeza dos outros não traz por si só felicidade própria e nem a exibição de encher o olho do Barcelona diante do Villarreal, que acabou numa goleada por 4-1 que poderia ter conhecido outros números, acalmou a tensão que se continua a viver num clube habituado a ganhar tudo e a todos mas que tem andado mais entre problemas do que soluções. Aliás, não é por acaso que o El País puxava como simbologia da presença de público os assobios ao presidente Josep Maria Bartomeu, um líder que continua a tentar apagar fogos e faz da contratação de grandes estrelas a tática de prevenção para aguentar a posição até e depois das eleições – e Pau Gasol, o poste que recupera de lesão e que não joga há 16 meses, é a mais recente perdição no basquetebol, assim como Neymar continua a ser no futebol.

Para já, com a ligeira acalmia na relação entre Quique Setién, equipa técnica e jogadores que a último vitória teve o condão de promover, o foco das atenções passava sobretudo pela questão do VAR e pelas queixas sobre os alegados benefícios a um Real que tem somado triunfos de grande penalidade pela margem mínima. E passava também porque houve novos desenvolvimentos naquilo que foi denominado de Barçagate – se Bartomeu assegura que não houve qualquer corrupção nem tentativa de difamação a jogadores e ex-dirigentes, teve de admitir que existiram algumas práticas censuráveis dentro do clube que passaram ao lado dos principais responsáveis. Como se faz para passar ao lado da turbulência que o caso cria? Ganhar. Na Liga, na Champions, no que for possível.

Quique Setién voltou a lançar a artilharia toda na frente com Griezmann, Messi e Suárez, mantendo também Sergi Roberto no meio-campo que teve Rakitic em vez de Vidal. No entanto, e antes do encontro começar, a novidade acabou por ser a chegada radical de Piqué ao Camp Nou, numa bicicleta elétrica de 10.000 euros e em alta velocidade até à zona das garagens. O central acabou por ser um dos protagonistas da partida, tendo estado na melhor oportunidade ao longo da primeira parte numa bola que acabou por bater no poste de Ter Stegen (que antes do primeiro quarto de hora tinha feito uma defesa apertada a remate cruzado de Embarba. Luis Suárez, de bola corrida, e Messi, em lances de bola parada, ameaçaram a baliza de Diego López mas, ao contrário do que se passou com o Villarreal, a exibição do Barcelona foi bem mais curtinha e houve alterações ao intervalo.

Aproveitando o facto de ter Sergi Roberto em campo e na tentativa de dar outro peso ofensivo à equipa, Sétien tirou Nelson Semedo no descanso e lançou o jovem Ansu Fati após os primeiros 45 minutos da temporada em que a equipa não conseguiu fazer um remate enquadrado sequer com a baliza em Camp Nou mas o avançado esteve só quatro minutos em campo ao atingir Calero numa disputa de bola onde deixou o pé alto e acertou com violência a perna do jogador do Espanyol (50′). O conjunto de Rufete tinha uma oportunidade de ouro para pelo menos adiar uma descida inevitável mas Pau Lozano começou a deitar tudo a perder pouco depois com uma entrada semelhante sobre Piqué que teve o mesmo destino através da confirmação do VAR (53′). De 11 para 11, o jogo passou a ser de dez para dez. De 0-0, o jogo passou para o 1-0: numa jogada que fez a bola girar entre corredores, Griezmann viu Messi na área, o argentino fez a assistência e Suárez marcou aquele que seria o único golo do jogo, sendo que Raúl de Tomás, em cima dos 90′, ainda viu Ter Stegen impedir o empate com uma grande defesa.