O telemóvel do independentista Roger Torrent, atual presidente do parlamento da região espanhola da Catalunha, pode ter sido comprometido. A notícia é avançada após uma investigação conjunta do jornal espanhol El País e do britânico The Guardian. Além de Torrent, pelo menos outros dois apoiantes pró-independência catalã foram avisados de que terão sido alvo de um “possível caso de espionagem política doméstica” na Europa.

Para cometer estes atos de espionagem doméstica terá sido usado o software Pegasus, feito pela NSO, uma empresa israelita do ramo do serviços de informação. Esta tecnologia, que foi revelada em 2019, aproveitava-se de uma falha do WhatsApp, detido pelo Facebook, e permitia aos detentores aceder às mensagens de quem queriam espiar. Os dois jornais escrevem que o alegado ato de espionagem terá sido perpetuado sem antes se ter pedido alguma autorização judicial.

Num comunicado em resposta à notícia, o gabinete do primeiro-ministro espanhol, Pedro Sanchez, defende-se: “O governo não tem provas de que o presidente do parlamento catalão, Roger Torrent, a ex-parlamentar Anna Gabriel e o ativista Jordi Domingo tenham sido alvo de hackers [piratas informáticos] através dos seus smartphones. Além disso, devemos afirmar que qualquer operação envolvendo um telefone móvel é sempre conduzida de acordo com a autorização judicial relevante“.

Torrent foi avisado deste ataque por investigadores do Citizen Lab,um grupo de investigação da Munk School of Journalism, da Universidade de Toronto, no Canadá, que descobriu a existência do Pegasus. Este grupo está a trabalhar com o WhatsApp, para perceber quantas pessoas poderão ter sido vítimas desta falha. De acordo com o líder catalão, parece-lhe claro que foi o “Estado espanhol” que esteve por detrás desta invasão ao seu telefone. A sustentar esta afirmação está o facto de a NSO vender os seus serviços a entidades governamentais.

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O WhatsApp, tem alegado que mais de 100 membros da sociedade civil, incluindo jornalistas na Índia, ativistas de direitos humanos em Marrocos, diplomatas e altos funcionários do governo, foram supostamente afetados. Por causa disso, a empresa interpôs uma ação em outubro contra a NSO por se ter aproveitado de vulnerabilidades do seu sistema. A NSO afirma que só o faz para ajudar a apanhar “terroristas e criminosos”.

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Numa entrevista, o líder independentista catalão já se tinha oposto ao uso destas tecnologias por parte do governo espanhol: “Parece-me errado que os políticos estejam a ser espiados numa democracia com o Estado de Direito. Também me parece imoral que uma enorme quantidade de dinheiro público seja gasta na compra de software que pode ser usado como uma ferramenta para a perseguição de dissidentes políticos“.

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Aos dois jornais, as entidades de inteligência espanholas afirmaram que operam “em total conformidade com o sistema jurídico e com absoluto respeito pelas leis vigentes”. Além disso, o Centro Nacional de Inteligência de Espanha (CNI, na sigla espanhola), afirma que o seu trabalho é supervisionado pelo Supremo Tribunal espanhol.

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Além de Torrent, Anna Gabriel, uma política independentista radicada na Suíça, e Jordi Domingo, outro ativista pró-independência, terão também sido espiados. Os dois foram alertados igualmente pelo Citizen Lab. Contudo, no caso de Domingo, o próprio assume que não é um ativista de relevo e que o verdadeiro alvo seria um advogado com o mesmo nome.

A NSO defende-se deste caso dizendo: “Mais uma vez, os comentários especulativos do CitizenLab servem apenas para destacar a sua agenda continuada, ingénua e oculta, que falha em lidar com os desafios enfrentados pelas autoridades de investigação”. Aos mesmo jornais, um porta-voz desta empresa adiantou ainda: “No entanto, agradecemos que tenham trazido esta questão à nossa atenção. De acordo com nossa política de direitos humanos, levamos as nossas responsabilidades a sério e, se necessário, iniciaremos uma investigação“.

Em outubro de 2019 foi conhecido que as intromissões através da tecnologia da NSO terão acontecido entre o final de abril e o início de maio desse ano. As vítimas terão sido tão díspares como um coletivo de jornalistas e ativistas mexicanos, um cidadão do Qatar ou ainda Omar Abdulaziz, um ativista saudita que está exilado no Canadá.