Ambientalistas alertaram esta quarta-feira no parlamento para alegadas ilegalidades e perigos associados ao alargamento do aeroporto Humberto Delgado e à nova construção no Montijo, garantindo que “não é uma questão de pássaros contra pessoas”.

Não é sustentável ter um aeroporto no coração da capital nem fazer um aeroporto com base em sérias violações ambientais e de segurança”, alertou Catarina Grilo, da Associação Natureza Portugal (ANP)/World Wildlife Fund (WWF) durante a audição na comissão de Ambiente, Energia e Ordenamento do Território.

A pedido de várias bancadas parlamentares, esta foi uma das seis organizações de defesa do ambiente que esta quarta-feira se fizeram ouvir sobre a avaliação de impacto ambiental do aeroporto do Montijo e alargamento do Aeroporto Humberto Delgado, e Lisboa.

Todos alertaram para os perigos que representam para o ambiente e populações assim como para alegadas inconformidades com a legislação nacional e internacional.

O ruído e poluição provocados pelo Aeroporto Humberto Delgado, em Lisboa, foram lembrados por Francisco Ferreira, presidente da Zero – Associação Sistema Terrestre Sustentável.

Francisco Ferreira recordou que o funcionamento do aeroporto de Lisboa tem momentos em que, já esta quarta-feira, “é impossível cumprir a legislação do ruído”, o que seria agravado com o seu alargamento.

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A inexistência de uma Avaliação Ambiental Estratégica (AAE) foi outra das falhas apontadas, com a Zero a lembrar que tem já um processo a decorrer em tribunal.

A AAE “não é opcional. É estritamente obrigatória”, acrescentou João Melo, da GEOTA — Grupo de Estudos de Ordenamento do Território e Ambiente, considerando que “há efetivamente alternativas que não foram estudadas ou pelo menos não estão em cima da mesa”.

Isto não é uma questão de pássaros contra pessoas. Este é um caso em que os interesses da avifauna são os mesmos que os das pessoas”, sublinhou João Melo, para quem o Montijo é “a pior solução” ao pôr em risco animais e população.

A opinião foi partilhada por Joaquim Teodósio, da Sociedade Portuguesa para o Estudo das Aves (SPEA), que também classificou o projeto do Montijo de “péssimo para as aves, mas também para as pessoas e para Portugal”.

O Estuário do Tejo é uma zona de rota migratória, por onde passam anualmente milhares de aves: “São entre 100 mil a 300 mil aves de cerca de 180 espécies que ali encontram refúgio e alimento”, lembrou.

Joaquim Teodósio defendeu ainda a necessidade de uma “abordagem mais pormenorizada” sobre o impacto nas colisões, lembrando que “os dados recolhidos no campo através de radares mostram claramente os milhões de movimentos contabilizados quer na zona do aeroporto quer na zona de passagem dos aviões”.

A construção do aeroporto do Montijo tem “consequências muito negativas e irreversíveis na saúde, ambiente, segurança e na avifauna”, sublinhou.

Já a vice-presidente da Liga Portuguesa para a Natureza (LPN), Inês Cardoso, alertou para o “claro desrespeito das diretivas europeias”, tendo em conta que estas diretivas e tratados internacionais “obrigam à manutenção e melhoria de biodiversidade”.

O estuário do Tejo não é um mosaico de habitat desconexos”, mas sim “um ecossistema complexo”, além de ser “altamente vulnerável”, alertou.

Sobre o Estudo de Impacto Ambiental (EIA) para o Montijo, a Zero referiu que encontrou erros como as previsões relativas às emissões de dióxido de carbono: “Contabilizando apenas as operações de aterragem e descolagem associadas ao aeroporto, as contas feitas pela Zero mostram que os valores seriam na ordem dos 121 mil toneladas por ano e não nas 31 mil como o EIA diz, ou seja, serão quatro vezes superiores” aos descritos no EIA, afirmou Francisco Ferreira.

Nós achamos que o aeroporto de Lisboa não pode ser encerrado agora, mesmo tendo os problemas de ruído, de qualidade do ar e de ordenamento, entre outros. Entendemos que tem de haver um período de transição, mas a aviação tem que ser olhada numa outra perspetiva” defendeu o presidente da Zero, sublinhando que é preciso pensar no futuro tendo em conta a emergência climática e os impactos na saúde.

Além disso, a Zero e a WWF apontaram o facto de o aeroporto de Montijo não estar previsto em nenhum programa: “O Aeroporto do Montijo não se encontra enquadrado em qualquer plano de ordenamento do território ou políticas setoriais”, alertou Catarina Grilo.

Só quando o Plano Nacional de Políticas de Ordenamento de Território (PNPOT) foi revisto, em agosto de 2019, é que passou a prever um novo aeroporto de Lisboa “mas sem indicar qualquer localização”, afirmou a representante da WWF.

Também não estava previsto no Plano Regional de Ordenamento de Território da Área Metropolitana de Lisboa, nem no Plano Estratégico de Transportes e Infraestruturas (PETI), nem no Plano de Expansão da ANA, ainda em vigor, enumerou.

Para Catarina Grilo, o processo seria “feito corretamente” se primeiro houvesse uma revisão do Plano Estratégico de Transportes e Infraestruturas (PETI), cuja vigência termina este ano.

O PETI iria apresentar um diagnostico das necessidades e delinear uma estratégia para perceber se é preciso um novo aeroporto e onde deverá ser localizado. “O que não foi feito até à data”, criticou, considerando que depois de definidas as prioridades estas seriam então vertidas no Programa Nacional de Investimentos (PNI).

Mas, para Catarina Grilo, o PNI parece ser apenas “uma lista de compras para a construção civil em Portugal, que não está alinhada com as prioridades estratégicas dos planos de ordenamento nem com os programas setoriais”.