O movimento SOS Alcanena convocou uma manifestação para sexta-feira para a população mostrar a sua indignação pela persistência de episódios de poluição atmosférica no concelho e o desagrado por, apesar de “todos os discursos, tudo continuar na mesma”.

Ricardo Rodrigues, do SOS Alcanena, disse à Lusa que “as mudanças anunciadas” ao longo de décadas e as obras realizadas, com milhões de euros de investimento com fundos comunitários, não resolveram os problemas ambientais do concelho, pois no verão os cheiros “nauseabundos” intensificam-se, tornando “insuportável” a vida da população do concelho.

Segundo o movimento, os maus cheiros resultam da libertação de H2S (Sulfeto de Hidrogénio) no ar de Alcanena, “um gás particularmente prejudicial para a saúde” que leva “a população a uma morte lenta”.

A presidente da Câmara de Alcanena, Fernanda Asseiceira (PS), confirmou à Lusa a ocorrência de “outra crise”, entretanto resolvida durante o fim de semana, lamentando que continuem a existir industriais que não cumprem com as regras, pondo em causa todo o sistema.

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Segundo a autarca, foi possível detetar que as descargas de hidrocarbonetos na rede, ocorridas no início do mês, tiveram origem no emissário da Gouxaria (um dos três que conduz efluentes até à Estação de Tratamento de Águas Residuais), tendo sido realizadas análises que confirmaram a presença daquele químico, sem, contudo, ser possível identificar a ou as indústrias em concreto.

Em comunicado, o movimento SOS Alcanena lamenta a “falta de consideração da indústria poluente e a incompetência do poder autárquico”, salientando o “desânimo e saturação” da população, “que não parece disposta a tolerar mais um verão de maus-odores intensos e ar poluído” que provocam “vómitos, dores de cabeça ou garganta irritada”.

Lamentando viver “num concelho com um dos IMI mais altos da região”, os subscritores descrevem como, “com um calor insuportável”, têm de “circular de carro com os vidros fechados” e “fechar todas as janelas em casa e, mesmo assim, acordar com a casa empestada a ‘ovos podres’, ou ficar privados do que é um direito básico: respirar ar puro!”.

Fernanda Asseiceira afirmou ser “a primeira a reconhecer que a população só pode estar muito desagradada, inquieta e preocupada”.

Também sou população, vivo no centro da vila, não me vou embora todos os dias. Também eu não consigo dormir, pelo cheiro e pela preocupação de conseguir ultrapassar as situações e ter uma resposta imediata”, disse, recordando todos os esforços feitos desde que assumiu a presidência do município, em 2009.

A autarca disse que tem sido alvo de “ameaças e difamação”, o que a levou a apresentar uma queixa-crime, que se junta à que já apresentou em 2019 contra desconhecidos pela deposição de gorduras na ETAR (que esteve na origem de um outro episódio de maus cheiros) e à que apresentou agora pela descarga de hidrocarbonetos.

Da parte da Câmara Municipal tudo tem sido feito. Chega a ser triste”, disse, salientando que foi preciso “coragem” para retirar os utilizadores (na maioria indústrias de curtumes) da gestão do sistema de tratamento de águas residuais e criar uma entidade “imparcial e 100% pública”.

“Não somos poluidores. Não percebo porque as manifestações são sempre em frente à Câmara Municipal”, disse, referindo, entre as várias iniciativas do seu executivo, a criação de um observatório do ambiente e a contratação da empresa do investigador Saldanha Matos para se alcançarem soluções definitivas.

“Sou muito positiva e acredito que vamos ter resultados”, declarou.

A manifestação está marcada para as 20h30 de sexta-feira, em frente ao cineteatro São Pedro, onde se irá reunir a Assembleia Municipal de Alcanena.

O movimento SOS Alcanena tem em curso a recolha de assinaturas para uma petição a enviar ao comissário europeu para o Ambiente, Assuntos Marítimos e Pescas, exigindo a intervenção da Comissão Europeia para “resolver com efeitos imediatos o problema de saúde pública que se vive em Alcanena” e promover “a monitorização dos maus-cheiros e emissões de gases prejudiciais à saúde, nomeadamente sulfeto de hidrogénio, por um período de, no mínimo, cinco anos”.