Os números mais recentes compilados pela Quebrar o Silêncio apontam para um aumento nos casos de violência sexual envolvendo homens e rapazes. No primeiro semestre de 2020, a associação recebeu cerca de 10 novos casos por mês, contabilizando assim 59 novos pedidos de apoio de sobreviventes, o que representa um aumento de 18% face a 2019. Dão ainda conta que em três anos e meio de atividade foram 310 os homens a rapazes a procurarem apoio por estes motivos, sublinhando a subida de casos nas faixas etárias mais jovens.

“Apesar de a maioria dos nossos casos serem homens na casa dos 35 aos 40 anos, começamos a ver, cada vez mais, jovens na casa dos 20 que procuram apoio. São ainda a minoria é verdade, mas para nós este é um aumento simbólico, pois significa que estamos a chegar a mais sobreviventes”, avança, em comunicado, o fundador da associação Ângelo Fernandes.

A associação registou também um aumento nos pedidos de apoio por parte de famílias e pessoas amigas: cerca de 8 novos casos mensais, um aumento de 30% em relação ao ano de 2019, e admite ser ainda precoce estabelecer uma ligação entre os números mais recentes e a pandemia de Covid-19. “Ainda é muito cedo para compreender se o aumento gradual de novos pedidos se deve à pandemia do Covid19 e ao confinamento, mas sabemos que alguns dos novos casos prendem-se realmente com as atuais circunstâncias”, refere Ângelo Fernandes.

“Para muitos homens o trabalho e atividades fora de casa ajudam-nos a gerir o impacto traumático do abuso. São estratégias que, segundo os próprios homens, os ajudam a manterem-se ocupados e a evitar que a sua mente não seja assaltada por flashbacks do abuso, memórias indesejadas, pensamentos cíclicos e sentimentos dolorosos. Estar confinado em casa impede os homens de recorrerem a estas estratégias, o que os torna mais suscetíveis e vulneráveis. Para alguns homens este é um cenário que potencia sintomatologia depressiva e o aumento significativo de ansiedade, chegando a ficar em crise”, descreve o responsável da associação, que continuou a funcionar via videochamada durante o período da quarentena.

Durante a pandemia a Quebrar o Silêncio manteve os serviços a funcionar, não deixando nenhum homem e rapaz sem apoio. “Desde o início que temos apoio psicológico por videochamada, pelo que a transição do presencial para este registo ocorreu sem problemas. No entanto, para alguns homens nem sempre é fácil conseguir um momento a sós para ter o acompanhamento, pois vivem com as suas famílias. Mas os homens sobreviventes são bastante criativos e alguns articulam com outros momentos, como por exemplo dar um passeio de carro para ter privacidade ou mesmo passear o cão numa caminhada mais longa para poder ligar para a associação.”

Além do apoio prestado aos homens e rapazes, a Quebrar o Silêncio adianta ainda que está atualmente a preparar uma formação para profissionais na região do Alentejo sobre “Violência sexual contra homens e rapazes – teoria e intervenção”. No total serão 10 ações de formação a começar em outubro de 2020 e a terminar no final de 2021. O público alvo são profissionais da área da saúde, órgãos de polícia criminal e profissionais da área da proteção de crianças e jovens como as CAFAP, as CPCJ e as EMAT.

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