O presidente da Confederação dos Agricultores de Portugal (CAP) disse esta quarta-feira, no Palácio de Belém, que a instituição “não aceita de maneira nenhuma” o possível “desmembramento” do Ministério da Agricultura.

“Ficámos muito preocupados com as notícias de um possível desmembramento do Ministério da Agricultura, desvalorizando o valor do ministério […], situação que a CAP não aceita de maneira nenuhuma”, disse Eduardo Oliveira e Sousa aos jornalistas após uma reunião com o Presidente da República, Marcelo Rebelo de Sousa, no Palácio de Belém.

De acordo com o presidente da confederação agrícola, nos últimos dias “foi mais ou menos dada a entender essa situação, que não é minimamente aceitável se vier a ser concretizada”.

Segundo Eduardo Oliveira e Sousa, esses indícios têm por base “afirmações de alguns deputados na Assembleia da República e das próprias afirmações do senhor primeiro-ministro [António Costa] no debate do Estado da Nação, na semana passada”.

PUB • CONTINUE A LER A SEGUIR

O presidente da CAP associou a recente demissão do Diretor-Geral de Alimentação e Veterinária (DGAV) a esse “rumor” de “desmembramento” do ministério, e também da própria DGAV.

“O desmantelar da DGAV é outro absurdo. Temos que perceber que essa direção-geral é um organismo certificado por Bruxelas [Comissão Europeia], faz controles de ajudas comunitárias, tem a sanidade animal a seu cargo, tem a segurança alimentar a seu cargo, é um organismo da maior importância”, considerou o representante da CAP.

Para Eduardo Oliveira e Sousa, a DGAV é um organismo que “está muito depauperado em termos de capacidade financeira e de meios que precisavam de ser reforçados”, a que “nunca” se devem “retirar competências”.

O diretor-geral da Alimentação e Veterinária, Fernando Manuel d’Almeida Bernardo, pediu a demissão do cargo, uma decisão que já foi aceite pela ministra da Agricultura, Maria do Céu Antunes, confirmou à Lusa fonte oficial da tutela na terça-feira.

“Confirma-se que a pedido do prof. Doutor Fernando Manuel d’Almeida Bernardo, a senhora Ministra da Agricultura, Maria do Céu Antunes, determinou a sua cessação da comissão de serviço no cargo de diretor-geral de Alimentação e Veterinária”, referiu a mesma fonte, questionada pela Lusa, mas sem esclarecer mais detalhes, nomeadamente o motivo do pedido. Fernando Bernardo assumiu o cargo de diretor-geral de Alimentação e Veterinária em 2016.

A Direção-Geral da Alimentação e Veterinária (DGAV) foi convocada para uma audição, a requerimento do grupo parlamentar do Bloco de Esquerda, na próxima quinta-feira, “a propósito dos acontecimentos ocorridos nos abrigos ‘Cantinho das Quatro Patas’ e ‘Abrigo de Paredes'” em Santo Tirso, lê-se na convocatória.

Os dois abrigos, onde morreram 73 animais devido a um incêndio eram ilegais e já tinham sido alvo de “contraordenações e vistorias” de “várias entidades fiscalizadoras”, revelou o Ministério da Agricultura, no dia 20 de julho.

Proibições à agricultura são “um exagero”

Eduardo Oliveira e Sousa considerou ainda “um exagero” as proibições à atividade agrícola devido ao risco de incêndio.

“A agricultura não para, não pode parar, foi um exagero a abrangência da proibição dos trabalhos que foram incluídos nesse despacho”, considerou o responsável da CAP à saída da reunião, em que um dos pontos focados foi o despacho relativo à proibição da atividade agrícola devido ao risco de incêndios.

O despacho foi produzido “inicialmente pelo senhor ministro da Administração Interna [Eduardo Cabrita] e pelo senhor ministro do Ambiente [João Matos Fernandes] e depois, numa segunda fase, já com a assinatura da senhora ministra da Agricultura, que parece que tentou parar a agricultura por causa de temperaturas elevadas durante um período curto de tempo”, disse Eduardo Oliveira a Sousa.

Eduardo Oliveira e Sousa defendeu que “o setor agrícola tem realidades diferentes, tem estruturas regionais que sabem gerir a perigosidade de determinadas tarefas ou equipamentos, por isso não é compatível com um despacho daquela natureza, que dá origem à proibição generalizada”.

Na terça-feira, em comunicado, a CAP já tinha apelado “às autoridades que tenham o bom senso que faltou a quem determinou esta proibição generalizada”, considerando que a decisão do Governo “deveria ser mais clara e atender aos diferentes tipos de atividades e de setores agrícolas”.

“As culturas precisam de ser cuidadas e os produtos agrícolas precisam de ser colhidos. Este despacho confunde tudo e, porque confunde tudo, proíbe tudo e trata tudo por igual”, sublinha a confederação presidida por Eduardo Oliveira e Sousa.

O despacho do Governo, publicado em Diário da República, declarou a situação de alerta “entre as 00:00 de 27 de julho de 2020 e as 23:59 de 28 de julho de 2020 para todos os distritos de Portugal continental” face às previsões meteorológicas que apontam para agravamento do risco de incêndio rural.

Segundo cita a CAP, o despacho determinou a “proibição de realização de trabalhos nos espaços florestais e outros espaços rurais com recurso a qualquer tipo de maquinaria”.

A confederação diz que falou com a ministra da Agricultura, Maria do Céu Antunes, antes da publicação do despacho, “tendo em vista partilhar conhecimento e argumentos técnicos, mas a governante “não tomou em consideração o conteúdo do que lhe foi transmitido”.

“Como tal, foi criada uma situação com consequências nefastas para a agricultura, para a economia e para o emprego, sem que exista qualquer acréscimo ou benefício para a segurança ou para a prevenção de riscos”, sublinhou a CAP no comunicado.

A confederação diz ter tomado conhecimento, pela comunicação social, de que as autoridades estão a considerar veículos como tratando-se de maquinaria e a impedir, por exemplo, a apanha de melão na zona de Elvas, do tomate no Ribatejo, ou de uvas na Vidigueira e no Redondo.

“Que sentido faz proibir o tratamento e a colheita destes bens perecíveis, cujo risco de incêndio associado é praticamente inexistente?”, questiona a confederação.