A fabricante de calçado Ecco vai dispensar até dezembro 110 trabalhadores, denunciou esta quarta-feira a coordenação distrital de Aveiro do BE, classificando de “despedimentos encapotados” o que a empresa de Santa Maria da Feira considera “rescisões por mútuo acordo”.

Segundo revelaram à Lusa deputados do partido, a administração da Ecco Portugal tem estado a “pressionar” parte dos seus 1.165 funcionários para que aceitem rescindir os seus contratos laborais e quer com isso “disfarçar um despedimento coletivo” na unidade de São João de Ver, o que os parlamentares consideram particularmente grave tendo em conta que a marca dinamarquesa “é rentável” e, “só em 2016”, usufruiu em Portugal de “445.000 euros em benefícios fiscais”.

É por isso que o BE defende que “esta empresa tem obrigações especiais para com o Estado e para com o país. É uma empresa lucrativa que tem sido constantemente apoiada pelo Estado português e por isso não deve poder voltar aos despedimentos massivos, principalmente na situação que o país vive atualmente”.

O partido nota que a Ecco Portugal também beneficiou de benefícios comunitários, “chegou muitas vezes a receber verbas do Estado para criar postos de trabalho após os despedimentos” e, face à Covid-19, “já recorreu ao layoff parcial, recebendo assim apoios públicos com o objetivo de manter os empregos”.

PUB • CONTINUE A LER A SEGUIR

O BE alega, portanto, que os cortes previstos no âmbito de um processo “encapotado de acordos de rescisão” têm que ser travados pelo Governo, considerando que em causa está “uma empresa lucrativa que tem recebido milhões de apoios diretos do Estado”.

O partido já solicitou informação sobre o caso, aliás, ao Ministério do Trabalho, exigindo dados sobre as mais recentes ações inspetivas levadas a cabo na fábrica, a forma como a pandemia afetou os contratos laborais da empresa e quais os apoios de que essa está a beneficiar para retoma da sua atividade.

O Estado deve intervir para salvaguardar todos os postos de trabalho, o que se torna ainda mais imperativo em empresas que receberam apoios públicos, seja para instalação e desenvolvimento da sua atividade, seja para proteção do emprego”, conclui o BE, insistindo que, no atual contexto de crise, quaisquer ajudas às empresas devem ter na manutenção dos postos de trabalho “uma contrapartida obrigatória”.

Contactada pela Lusa, a administração da Ecco Portugal declara que apresentou “um plano de rescisões amigáveis com o objetivo de reduzir, até ao final do ano de 2020, cerca de 10% do número total dos seus colaboradores” – o que envolve 110 pessoas num universo atual de 1.165.

Realçando que a atividade dessa unidade se dedica apenas a produção e desenvolvimento, não abrangendo a rede de lojas gerida por outra empresa do grupo, a mesma fonte oficial realça que a fábrica da Feira nunca deixou de laborar desde o início do surto de Covid-19, mas reconhece dificuldades devido à pandemia.

A Ecco Portugal trabalhou três meses a 50% da sua capacidade, com pessoal do staff [administrativo] em teletrabalho, (…) e apenas recorreu ao regime de layoff simplificado parcial durante 30 dias. O impacto da situação atual nas vendas do Grupo ainda não é claro, mas na ECCO Portugal, face ao ano anterior, estimamos para 2020 quebras de aproximadamente 25% nas encomendas e de 30% no volume de negócios”, explica a administração.

O plano de rescisões amigáveis visa garantir a sustentabilidade da empresa face a essas quebras, até porque, embora a normalidade da laboração já esteja “praticamente reposta de forma a completar-se a entrega atempada da linha outono/inverno 2020” aos clientes, na unidade portuguesa ainda se mantém “a incerteza relativamente à próxima coleção”.