Longe vão os dias de excessos, pelo menos daqueles que até há três décadas justificaram um providencial pedido de ajuda. É pelo menos isso que admite e agradece Elton John, vários anos depois desse momento decisivo: são 30 de sobriedade, para sermos mais precisos, limpo dos nocivos combustíveis que nos tempos áureos do palco desbloqueavam um perfil tímido e reservado a braços com a fama.

O músico utilizou as suas redes sociais para partilhar o marco com os mais de três milhões de seguidores, refletindo sobre este “dia mágico” que fica marcado por um bolo, pelos inúmeros postais e cartões oferecidos pelos filhos, pelo seu companheiro, David Furnish, e ainda pelos seus colegas do programa de desintoxicação.

“Sou mesmo um homem abençoado”, admite Elton John. “Se não tivesse finalmente dado o grande passo de pedir ajuda há 30 anos, estaria morto. Obrigado do fundo do meu coração a todas as pessoas que me inspiraram e apoiaram ao longo do caminho”, continuou o músico, que já em 2015 recorrera ao mesmo Instagram para assinalar os 25 anos sóbrio, na ocasião coma imagem de um bolo com o respetivo número e a frase “Um dia de cada vez”, numa alusão a velhos fantasmas e ao esforço e dedicação permanentes que um processo de desintoxicação exigem, por mais que o tempo passe.

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Poucos anos antes, o música reconhecia em entrevista à NPR que continuava a sonhar “pelo menos duas vezes por semana, que cheirava cocaína e que ainda a tinha no nariz”. “É um sonho muito vívido e muito perturbador mas pelo menos é um sinal de alerta”, acrescentava.

Elton John Partying

Elton John, Neil Sedaka e o letrista Bernie Taupin numa festa em Londres, em 1975. © Michael Putland/Getty Images

Um regresso aos anos 70 e 80 devolve-nos a imagem de uma estrela elevada ao estatuto de lenda, com uma garrida personagem como Elton John a contagiar multidões. Mas longe desses holofotes e ruído dos aplausos, o músico era conhecido pelo perfil reservado e extrema timidez, fatores que terão precipitado os perigosos consumos de álcool e drogas, que o acompanharam de forma excessiva ao longo de mais de 15 anos. Uma fase explorada no biopic “Rocketman” e na recente biografia que revisita o trajeto do britânico, que em 2010, numa entrevista a Piers Morgan, descrevia a sua fervilhante e pouco saudável rotina.

“Eu acordava, fumava uns charros, bebia uma garrafa de Johnnie Walker e depois ficava a pé uns três dias; depois dormia um dia e meio, acordava cheio de fome, porque entretanto não tinha comido nada, e então comia umas três sandes de bacon, uma embalagem de gelado, e no fim vomitava tudo, porque me tornei bulímico. Depois fazia tudo de novo”.

E 2017, de novo em entrevista, o músico recordava o papel desempenhado por Ryan White na sua decisão de mudar de vida. Foi o adolescente americano hemofílico que contraíra Sida na sequência de uma transfusão de sangue que motivou o clique. “Tive a sorte de conhecer Ryan e a sua família. Ele foi a faísca para me tratar dos vícios e lançar a minha fundação na luta contra a Sida. Em seis meses, depois da morte de White, estava sóbrio e limpo, e assim tem sido”.

Lester Cohen Archives

Ryan White, o jovem que inspirou Elton John, em Los Angeles, Califórnia, EUA. © L. Cohen/WireImage

A celebração da efeméride dos 30 anos surge numa altura em que os efeitos económicos da pandemia estão na ordem do dia, com o eterno Rocket Man a ser um exemplo de como nem a indústria do entretenimento musical escapou à atual crise. Aos 73 anos, o músico viu-se obrigado a cancelar a sua digressão de despedida dos palcos, perdendo cerca de 67 milhões de euros. O rombo corresponde às receitas esperadas da agenda de espetáculos até ao final deste ano. Entretanto, e através do seu canal de YouTube, apostou na recuperação de algumas das mais célebres atuações ao vivo das últimas décadas.