Foi das regiões dos Açores (-93,0%), da Madeira (-87,4%) e da Área Metropolitana de Lisboa (-73,8%) que os turistas portugueses mais “desistiram” em junho, por comparação com o mesmo mês de 2019.

Os números do Instituto Nacional de Estatística (INE), revelados na estimativa rápida desta segunda-feira, não podiam ser mais claros — entre Madeira (com 7 mil dormidas) e Açores (13,7 mil), o turismo de portugueses em junho ficou 10 vezes aquém face ao mesmo mês do ano passado no conjunto das duas regiões autónomas, quando tinham sido registadas quase 200 mil dormidas de turistas nacionais.

Tendo em conta que, no conjunto dos dois arquipélagos, se juntam pouco mais de 4 mil dormidas de estrangeiros às 20 mil dormidas de portugueses, o turismo nas ilhas foi em junho nada mais do que residual, com quebras totais superiores a 99%.

As duas regiões são altamente dependentes do transporte aéreo e impuseram restrições fortes à entrada de turistas, o que ajuda a explicar o descalabro nesse mês.

No caso da Madeira, os turistas foram obrigados na altura a uma quarentena de sete dias (chegaram a ser duas semanas antes disso). E nos Açores — mesmo depois de o tribunal ter ordenado a libertação de um turista que se encontrava em quarentena obrigatória num hotel —, os constrangimentos à entrada não desapareceram totalmente. As autoridades regionais deixaram quatro opções: apresentar um teste à Covid-19 à chegada; fazer um teste na altura do desembarque; cumprir quarentena voluntária num hotel; ou regressar para onde veio.

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Turismo. Alojamento tem ligeira melhoria em junho, mas quebra ainda é superior a 80% face a 2019

No total, entre nacionais e estrangeiros, os números do INE mostram que Portugal passou de 6,5 milhões de dormidas, em junho de 2019, para 1,07 milhões, um ano depois. E, como o turismo do exterior quebrou quase por completo, deste milhão de turistas, os residentes em Portugal representam agora, de longe, a maior fatia, com 869 mil dormidas — quatro vezes mais do que as dormidas de estrangeiros. Mas houve discrepâncias fortes em junho entre as diferentes regiões no mercado made in Portugal.

Apesar de tudo, face aos arquipélagos, a procura de portugueses foi um pouco melhor (ou menos má) pela Área Metropolitana de Lisboa, a região mais populosa do país (2,9 milhões de habitantes) — que abrange a capital, Sintra, Cascais, Setúbal e outros 14 concelhos na área de influência do Tejo. Ainda assim, teve uma quebra muito acentuada, de 73,8%.

Passando de 365,5 mil dormidas de portugueses para apenas 96 mil, o tombo foi nesse mês suficientemente grande para que a Área Metropolitana de Lisboa tivesse sido ultrapassada pelo Centro (um total de 155 mil dormidas) e até pelo Alentejo (142 mil) na preferência dos portugueses — apesar de ninguém ter escapado ileso nesse capítulo.

Centro, Norte e Algarve perdem metade dos turistas nacionais

A seguir aos arquipélagos e a Lisboa seguem-se Centro, Norte e Algarve, que perderam cerca de metade dos turistas nacionais. O Centro — que abrange a região Oeste, o Médio Tejo, as regiões de Aveiro, Coimbra e Leiria, as diferentes regiões das Beiras e Viseu Dão Lafões, num total de 2,2 milhões de habitantes —, teve uma quebra de 57,5% entre os clientes portugueses (e uma quebra total de 73,7%).

É aqui que se encontram alguns dos “oásis” do interior, que têm captado o interesse do mercado nacional. A Associação dos Empresários de Turismo do Castelo de Bode revelou ao Observador que toda a zona envolvente da barragem, ao longo de mais de 60 km de comprimento (nos distritos de Santarém e Castelo Branco), tem os alojamentos, por regra, “cheios ao fim de semana” e com “muito boa procura” aos dias úteis. O feriado do 10 de junho foi “a alavanca” para a procura nacional neste região.

E a Agência para o Desenvolvimento Turístico das Aldeias do Xisto — que abrangem parte dos distritos de Castelo Branco e de Coimbra — indica que a região teve o melhor junho de sempre este ano, ficando a maioria dos alojamentos “lotados até final de agosto”.

No entanto, é o mesmo Centro em que o litoral está a enfrentar dificuldades. Pedro Machado, que lidera a entidade regional de turismo, nota ao Observador que as unidades hoteleiras em centros urbanos estão “a ser prejudicadas pela falta de eventos, como casamentos e batizados”.

No Norte, a quebra do mercado nacional é de 53,6% face a junho do ano passado (e de 78,7% no total, incluindo o turismo do exterior). A região está a ser prejudicada este verão pelo menor fulgor de Porto, Braga e outras cidades, de acordo com Luís Pedro Martins, presidente do Turismo do Porto e Norte de Portugal.

Cidades desertas e oásis do interior “lotados”. O turismo a duas velocidades no primeiro verão da pandemia

Já o Algarve, habituado a ter como visitantes em junho o equivalente a cinco vezes a população da região (num total de 2,4 milhões de turistas no ano passado), este primeiro mês da época alta não foi além dos 335 mil turistas, entre portugueses e estrangeiros. Deste valor, 273 mil correspondem a residentes em território nacional, o que significa que 81% do turismo no Algarve em junho foi made in Portugal (ao contrário dos habituais 25%).

A região tem, na verdade, a maior perda de dormidas de portugueses em termos absolutos (menos 356 mil), mas na comparação percentual está longe das quebras registadas por Lisboa ou pelas regiões autónomas, atingindo uma redução de 56,2%.

As praias do Algarve estão um pouco mais despidas do que o habitual neste verão — sobretudo nos dias úteis — mas várias localidades mais pequenas (como Aljezur, Vila do Bispo e Tavira) têm tido “procuras muito interessantes”, de acordo com o presidente do Turismo do Algarve, João Fernandes. Só que não compensam a perda dos turistas britânicos nem as restrições aos estabelecimentos noturnos, atividade que tem sido fundamental para a economia de várias cidades algarvias.

Os números do INE mostram que foi o Alentejo a região que mais resistiu à quebra de procura de portugueses — ainda assim, caindo 31,2%. O presidente do Turismo do Alentejo garantia ao Observador, antes destes números serem divulgados, que tem havido “excelentes taxas de ocupação” e um “verão muito interessante” para a região, “face às perspetivas” da era Covid. Os números de junho mostram que não há, para já, região que aguente mais — quer no mercado de residentes (menos 31,2% face a junho de 2019) como no total (menos 84,7%).