Vários soldados malianos da guarnição de Kati, no sul do Mali, detiveram esta terça-feira o Presidente, Ibrahim Boubacar Keita, e o primeiro-ministro, Boubou Cissé, bem como vários responsáveis governamentais e militares do país num aparente motim, suscitando receios de um possível golpe de Estado após meses de contestação contra o presidente.

“Podemos dizer-vos que o Presidente e o primeiro-ministro estão sob o nosso controlo. Prendemo-los na sua casa [do chefe de Estado, em Bamako, capital]”, disse à agência noticiosa France-Presse um dos líderes do motim, sob anonimato.

Um outro soldado afirmou que os dois líderes estão “num veículo blindado, a caminho de Kati”, a cerca de 15 quilómetros da capital e onde teve início o motim.

O Presidente da Comissão da União Africana, Moussa Faki Mahamat, já condenou as detenções. “Condeno veementemente a detenção do Presidente Ibrahim Boubacar Keita, do Primeiro-Ministro e de outros membros do Governo do Mali e apelo à sua libertação imediata”, escreveu no Twitter.

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Na capital, Bamako, a cerca de 15 quilómetros de Kati, vários funcionários do governo abandonaram os seus escritórios após a entrada de homens armados, que começaram a deter responsáveis, como o ministro das Finanças maliano, Abdoulaye Daffe. “Os funcionários estão a ser detidos. É uma confusão total”, afirmou um funcionário do Ministério da Segurança Interna, sob anonimato.

Nas ruas de Kati podiam ser vistos carros blindados e veículos militares. Na plataforma Twitter, a embaixada francesa em Bamako aconselhou os residentes na capital e em Kati a permanecerem dentro de casa.

Segundo a AP, os acontecimentos de esta terça-feira assemelharam-se aos que em 2012 desencadearam um golpe militar que deu início a uma espiral de caos no Mali. A 21 de março de 2012, um motim teve início no campo militar de Kati, quando soldados se revoltaram e invadiram o arsenal militar do campo.

Após obterem as armas necessárias, os revoltosos dirigiram-se para a sede do governo, liderado pelo então capitão Amadou Haya Sanogo. Eventualmente, Sanogo foi forçado a entregar o poder a um governo de transição civil, que organizou as eleições de 2013.

Eleito em 2013, o atual Presidente, Ibrahim Boubacar Keita (IBK), tem enfrentado uma pressão crescente, com a sua popularidade a diminuir, havendo atualmente um movimento dedicado a afastar o chefe de Estado maliano.

Em resposta ao motim, os Estados Unidos da América (EUA), através do seu enviado ao Sahel, Peter Pham, opuseram-se a qualquer mudança no governo que não cumpra a Constituição maliana.

“Estamos a seguir com preocupação o desenvolvimento da situação no Mali. Os EUA opõem-se a qualquer mudança de governo extra-constitucional, quer seja pelos que estão nas ruas, quer pelas forças de defesa e segurança”, escreveu Pham na plataforma Twitter.

Um dos catalisadores da atual crise política no Mali foi a invalidação, no final de abril, de 30 resultados das eleições legislativas pelo Tribunal Constitucional, incluindo cerca de uma dezena em favor da maioria parlamentar.

A decisão, aliada a fatores como o clima de instabilidade e insegurança sentido nos últimos anos no centro e norte do país, a estagnação económica e a prolongada corrupção, instigaram várias manifestações contra IBK.

Portugal tem desde 1 de julho uma Força Nacional Destacada no Mali, no âmbito da Minusma, que inclui 63 militares da Força Aérea Portuguesa e um avião de transporte C-295.

O objetivo do destacamento português é assegurar missões de transporte de passageiros e carga, transporte tático em pistas não preparadas, evacuações médicas, largada de paraquedistas e vigilância aérea, e garantir a segurança do campo norueguês de Bifrost, em Bamako, onde estão alojados os militares portugueses.