Uma equipa de investigadores norte-americana acompanhou a tripulação de um navio de pesca antes e depois de estarem em alto mar. Depois de um surto com SARS-C0V-2 que infetou 85% da tripulação, a equipa concluiu que o os anticorpos neutralizantes encontrados em três pessoas os tinha protegido de uma nova infeção. Os resultados foram tornados públicos, mas ainda não foram revistos por outros cientistas, nem aceites numa revista científica.
Os investigadores da Universidade de Washington e do Centro de Investigação em Cancro Fred Hutchinson, em Seattle, fizeram uma parceria com a empresa American Seafoods que gere a embarcação American Dynasty para monitorizar as pessoas a bordo.
Os testes antes do embarque permitiram perceber que 120 das 122 pessoas testaram negativo para o vírus (o resultado dos outros dois elementos não é conhecido) e que seis pessoas apresentavam anticorpos contra o SARS-CoV-2 — o que quer dizer que tinham tido contacto com o vírus antes. Mas destes seis, apenas três tinham anticorpos neutralizantes, aqueles que se pensa serem capazes de eliminar o vírus no organismo.
O barco voltou para terra ao fim de 18 dias porque um dos membros da tripulação adoeceu e teve de ser hospitalizado. Os restantes membros foram novamente testados e seguidos ao longo de 50 dias.
Dos 122 elementos, 103 testaram positivo, revelando uma taxa de infeção de 85%, apesar de o diretor executivo empresa, Mikel Durham, garantir que foram tomadas as devidas medidas de proteção. Entre as três pessoas que tinham anticorpos, mas não os neutralizantes, algumas ficaram infetadas, o que para os investigadores mostra que não basta ter contacto com o vírus e desenvolver um tipo de anticorpos para se ser automaticamente imune ao vírus.
Mas a observação que deixou os investigadores mais satisfeitos foi o facto de nenhum dos três elementos que tinha os anticorpos neutralizantes ter sido infetado, pelo menos não no barco. Enquanto foram seguidos, dois testaram sempre negativo e um deles chegou a ter alguns testes positivos — mas os investigadores não explicou o que pode ter motivado estes testes positivos.
Ainda assim, considerando que entre as pessoas com anticorpos neutralizantes (três), zero testaram positivo no regresso, e que entre as restantes 103 testaram positivo, então a diferença é suficiente para se acreditar que os anticorpos neutralizantes tiveram aqui um papel, dizem os responsáveis pelo estudo. No entanto, os autores do trabalho não apresentam qualquer justificação para a falta de infeção nas restantes 16 pessoas.
Os investigadores admitem também que não sabem se estas três pessoas com anticorpos neutralizantes, e que não ficaram infetadas, tiveram contacto com algum dos tripulantes doentes ou não.
Os especialistas ouvidos pelo jornal The New York Times, que não participaram no estudo, mostraram-se entusiasmados com os resultados. “Olhando para os números, torna-se claro que é pouco provável que estas três pessoas tenham sido protegidas por acaso”, diz o Florian Krammer, imunologista na Escola de Medicina Icahn, em Mount Sinai (Nova Iorque).
Uma das investigadoras ouvida pelo jornal El Pais destaca que há uma limitação no estudo: os investigadores só se focaram nos anticorpos e deixaram de parte a resposta imunitária baseada nas células T que também pode ter um papel importante na proteção contra a infeção.