O vice-presidente brasileiro, Hamilton Mourão, afirmou esta quinta-feira que as queimadas que fustigam a Amazónia são como uma “agulha no palheiro”, tendo em conta a gigantesca dimensão daquela floresta, negando que esta esteja a arder.

Nós temos essas questões das queimadas. Os dados de 26 de agosto indicavam que nós tínhamos 24 mil focos de calor [incêndio] na Amazónia Legal. Ora, minha gente, a Amazónia Legal tem cinco milhões de quilómetros quadrados. Vinte e quatro mil focos de calor significa que tem um foco de calor a cada 200 quilómetros quadrados. Isso é agulha no palheiro”, disse Mourão, num debate organizado pelo Canal Rural.

“E o que está a ser colocado para o mundo inteiro? Que a floresta está queimando, que a Amazónia está a arder”, acrescentou o vice-presidente ao minimizar os incêndios que lavram na região, advogando que o país “não é um vilão ambiental”.

De acordo com dados do Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (Inpe), órgão vinculado ao governo brasileiro, foram registados até ao momento 24.633 focos de incêndio em agosto, o segundo maior número para o período dos últimos 10 anos.

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Os incêndios provocados por ações de desflorestação afetaram a saúde de milhares de brasileiros que vivem na região amazónica, segundo o relatório “O Ar é Insuportável: Os impactos das queimadas associadas ao desmatamento da Amazónia brasileira na saúde”.

O levantamento, divulgado na quarta-feira pelo Instituto de Pesquisa Ambiental da Amazónia (IPAM), o Instituto de Estudos para Políticas de Saúde (IEPS) e a Human Rights Watch (HRW), utiliza informações oficiais de saúde e meio ambiente para estimar que 2.195 internamentos hospitalares no Brasil por doenças respiratórias em 2019 são atribuíveis às queimadas na maior floresta tropical do planeta.

Deste total, quase 500 internamentos envolveram crianças com menos de um ano de idade, e mais de mil foram de pessoas com mais de 60 anos. Contudo, Mourão menosprezou o estudo, declarando não entender a origem desses dados.

“Eu vejo editores e formadores de opinião a dizer que a fumaça está a prejudicar as pessoas. Eu não consigo entender de onde essas pessoas conseguem extrair esses dados e conseguem ouvir isso”, disse ainda Mourão, que, além da vice-presidência do Brasil, lidera o Conselho Nacional da Amazónia Legal, entidade que coordena diversas ações direcionadas à preservação daquela que é a maior floresta tropical do mundo.

As queimadas na Amazónia brasileira geralmente atingem o seu pico nos meses secos na floresta, entre agosto e setembro. Com os incêndios, a população que vive na região inala fumo e poluentes ligados a doenças respiratórias e cardiovasculares, de acordo com o levantamento.

“Até que o Brasil efetivamente [tenha o] controlo da desflorestação, podemos esperar que as queimadas continuem a cada ano, impulsionando a destruição da Amazónia e intoxicando o ar que milhões de brasileiros respiram”, diz Maria Laura Canineu, diretora da Human Rights Watch no Brasil.

“O fracasso do governo [do Presidente brasileiro, Jair] Bolsonaro em lidar com esta crise ambiental tem consequências imediatas para a saúde da população na Amazónia, e consequências de longo prazo para a mudança climática global”, acrescentou.

Desde que Bolsonaro assumiu o governo brasileiro em janeiro de 2019, o país adotou uma política de enfraquecimento das agências ambientais. O executivo brasileiro decretou uma proibição de queimadas na Amazónia durante a estação seca deste ano, mas o seu impacto provavelmente será limitado se não houver uma fiscalização.

A Amazónia é a maior floresta tropical do mundo e possui a maior biodiversidade registada numa área do planeta, com cerca de 5,5 milhões de quilómetros quadrados, e inclui territórios do Brasil, Peru, Colômbia, Venezuela, Equador, Bolívia, Guiana, Suriname e Guiana Francesa (pertencente à França).