A ministra da Cultura, Graça Fonseca, e o secretário de Estado do Cinema, Audiovisual e Media, Nuno Artur Silva, receberam esta quinta-feira representantes da Netflix e da Vancouver Media, no âmbito do trabalho da plataforma em Portugal, anunciou o ministério.

“A reunião assinalou o trabalho desenvolvido pela plataforma” no país, “nomeadamente, as rodagens da série ‘La Casa de Papel’, que decorrem neste momento na região de Lisboa”, lê-se no comunicado do Ministério da Cultura, que sublinha “o intuito de a Netflix estreitar a colaboração com Portugal nas várias fases da cadeia de produção do setor”.

Depois do Concurso de Escrita e Desenvolvimento de Argumento Netflix — ICA [Instituto do Cinema e do Audiovisual], que atribuiu 10 prémios a projetos de ficção e documentário, e do qual pode ainda resultar a avaliação de um ou mais projetos para futura produção pela Netflix, as rodagens desta semana, assim como a reunião de hoje, sinalizam o intuito de a Netflix estreitar a colaboração com Portugal nas várias fases da cadeia de produção do setor”, afirma o gabinete da ministra Graça Fonseca.

“La Casa de Papel” é primeira produção internacional da espanhola Vancouver Media para a Netflix, em Portugal, “e resulta da colaboração com este Ministério [da Cultura], que tem procurado articular a atividade de empresas como estas com os interesses dos profissionais e entidades do setor do cinema e do audiovisual no país”, lê-se no comunicado esta quinta-feira divulgado.

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A reunião no Ministério da Cultura aconteceu no mesmo dia em que profissionais do cinema e do audiovisual, ouvidos na comissão parlamentar de Cultura e Comunicação, alertaram para a prevista isenção de taxas a aplicar aos operadores dos serviços audiovisuais a pedido, na proposta de lei que transpõe a diretiva europeia para o setor, em fase de discussão na especialidade no parlamento, dando prioridade a investimento na produção.

Em causa está a diretiva europeia de 2018, que tem como objetivo regulamentar, entre os Estados-membros, a atividade dos serviços de televisão e dos serviços audiovisuais a pedido, conhecidos como VOD (video on demand), como as plataformas Neflix, HBO e Amazon.

Para a Plataforma do Cinema, que congrega 13 entidades do setor, a proposta de lei não consegue precaver “o esvaziamento orçamental” do ICA, “pelas duas vias em que é atualmente financiado e que sustentam o financiamento da produção cinematográfica em Portugal”: as taxas anuais pagas pelos operadores de televisão por subscrição, ou televisão por cabo, e as taxas de exibição de publicidade nos canais tradicionais.

O produtor Luís Urbano, dos Produtores de Cinema Independente Associados, alertou igualmente para estes fatores, recordando que a tendência de migração para a Internet é uma realidade e que, “se a questão não for resolvida agora”, alargando também a taxa de subscrição a serviços de internet e de dados, terá de o ser “daqui por três ou quatro anos”.

Para o produtor, devia ser aproveitada “a oportunidade para corrigir esta distorção e não retirar vantagem competitiva às televisões, que veem a sua principal fonte de receita migrar para estas plataformas, onde a publicidade é mais barata por não estar sujeita a taxas”.

A proposta de lei, apresentada pelo governo para a transposição da diretiva, privilegia o investimento na produção, pela parte de plataformas de streaming, mas a maioria das associações presentes na audição desta quinta-feira defendeu em particular um sistema combinado, de taxas e investimento, como acontece em França.

Em julho, em declarações à agência Lusa, o secretário de Estado do Cinema, Audiovisual e Media considerou ser “muito mais interessante” ter operadores televisivos estrangeiros empenhados em investirem diretamente em produções portuguesas do que a pagarem taxas.

Esta quinta-feira, o produtor Luís Urbano, que tem no seu percurso filmes como “Cartas da Guerra”, de Ivo M. Ferreira, e grande parte do derradeiro percurso de Manoel de Oliveira, alertou igualmente para a dimensão e natureza das plataformas de vídeo a pedido.

“Um operador como a Netflix tem de ser tratado como um operador produtor, que produz as suas próprias obras, que vai difundir”. Assim, prosseguiu, “as obrigações de investimento podem levar a distorções que, se não forem bem reguladas”, podem levar para fora o que uma grande plataforma está obrigada a investir em Portugal.

Os profissionais alertaram também para a necessidade de uma fiscalização eficaz para o cumprimento da lei, que ficará a cargo da Entidade Reguladora para a Comunicação Social (ERC) e do ICA, segundo a proposta de diploma, recordando, entre outras situações, a dificuldade experimentada em diferentes países para se conhecerem números como os dos subscritores das plataformas de vídeos a pedido.

A secretária-geral da Associação de Produtores Independentes de Televisão, Susana Gato, frisou a importância da ERC e a premência de esta entidade “ter vontade de ser autoridade”.

Luís Urbano sublinhou que o ICA, como regulador e suporte da política para o setor, tem de ter viabilidade financeira garantida a longo prazo.

O Cinema e o Audiovisual são áreas estratégicas para a cultura e para a economia nacional, e a diversificação dos agentes que operam no setor, das fontes de financiamento da criação cinematográfica e audiovisual, e das obras que resultam desta atividade, tem um retorno assinalável para o país”, conclui o comunicado do Ministério da Cultura.

A página da comissão parlamentar de Cultura e Comunicação, no site da Assembleia da República, tem disponíveis mais de 40 posições de outras tantas entidades, sobre a proposta de lei.