O estudante de Hong Kong com passaporte português detido na China em 23 de agosto está há 12 dias sem poder contactar a família ou falar com um advogado, disse à Lusa o seu mandatário na antiga colónia britânica.

A mãe de Tsz Lun Kok, de 19 anos, com dupla nacionalidade portuguesa e chinesa, disse esta sexta-feira ao mandatário em Hong Kong que contratou um advogado chinês em Shenzhen, onde o filho está detido, por travessia ilegal, após ter sido intercetado na embarcação em que seguia com ativistas pró-democracia pela guarda costeira da província chinesa de Guandgong, mas que a polícia recusou o acesso. “A polícia chinesa disse ao advogado que a investigação do caso não está concluída, e que [Kok] não tem o direito de ver um advogado”, contou à Lusa o advogado em Hong Kong, que pediu para não ser identificado.

“Já são 12 dias em total isolamento”, acrescentou, manifestando preocupação com o seu cliente. “Não consigo imaginar o que ele sente neste momento, ele só tem 19 anos”, recordou. A família não tem quaisquer notícias do jovem, natural de Hong Kong, que estudava Engenharia naquele território. “A mãe, que tem estado em contacto comigo, e o pai, estão muito preocupados. Como foi detido no mar, pode ter sido ferido, e ela não sabe [do filho]. Ele não pode sequer fazer um telefonema para falar com a família e não pode falar com o advogado [na China]”.

Kok, que enfrenta acusações em Hong Kong relacionadas com os protestos pró-democracia no território, no ano passado, foi detido numa embarcação que teria como destino Taiwan. O jovem, cujo pai tem cidadania portuguesa, é “cidadão português” de pleno direito, frisou o advogado, apesar de a China só reconhecer o passaporte “enquanto documento de viagem não atributivo da nacionalidade”, o que limita a intervenção das autoridades portuguesas “ao domínio humanitário”, segundo nota do Consulado de Portugal em Macau e Hong Kong. “Além de ter um passaporte português, também tem cartão de cidadão português”, frisou o advogado. “Não se pode dizer que ele tinha um documento de viagem, ele é legal e tecnicamente um cidadão português”, acrescentou, lamentando que o consulado também não disponha de informações sobre o jovem.

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Tsz Lun Kok tinha sido detido em 18 de novembro, com outras centenas de estudantes, durante o cerco da polícia à Universidade Politécnica de Hong Kong (PolyU), que se prolongou de 17 a 29 desse mês, tendo terminado com a invasão dos agentes ao campus universitário, onde a polícia diz ter encontrado milhares de bombas incendiárias e armas. O jovem é acusado de motim, por ter participado alegadamente numa manobra para desviar as atenções da polícia que cercou as instalações do campus, com o objetivo de permitir a fuga de estudantes refugiados no seu interior.

Kok, que estudava noutra universidade, e foi detido na área de Mong Kok, perto da PolyU, enfrenta ainda acusações de posse de “instrumentos passíveis de uso ilegal”, disse o advogado, precisando que, ao contrário do que a polícia de Hong Kong afirmou na quinta-feira à Lusa, não está acusado de posse de armas. Por detrás desta acusação estará a posse de “pequenas contas de vidro” e de “um par de tesouras” de corte de metal, não tendo a acusação precisado de que forma poderiam ser usados, segundo o mandatário.

O advogado considerou ainda que o caso do jovem com dupla nacionalidade é “o mais simples” dos processos dos 12 detidos que seguiam na embarcação, apontando que, noutros casos, enfrentam acusações de tentativa de fogo posto, posse de materiais explosivos ou conluio com país estrangeiro, e que não há provas de que o seu cliente tenha participado no alegado motim, punido com pena de até 10 anos de prisão. “Ninguém pode dizer que o viu fazer coisas violentas”, afirmou.

O jovem deveria ser ouvido no tribunal de Tuen Mun, em Hong Kong, em 25 de setembro, mas o advogado desconhece se a polícia da China o vai manter detido por travessia ilegal. Nesse caso, “o processo pode levar cerca de meio ano a oito meses, e se forem considerados culpados terão de cumprir pena na China“, disse o advogado, caso em que o seu cliente poderá estar “um ou dois anos” sem “poder regressar a casa”.

Aprovada em 30 de junho, a lei da segurança nacional, considerada uma resposta de Pequim ao protestos pró-democracia em Hong Kong, sob administração chinesa desde 1997, levou vários ativistas a refugiar-se no Reino Unido e Taiwan, para onde fugiram muitos manifestantes em busca de asilo.

No barco onde seguia o jovem com passaporte português encontrava-se Andy Li, ativista pró-democracia detido no mesmo dia da detenção de Jimmy Lai, proprietário do jornal Daily Mail, numa operação da nova unidade policial criada pela lei de segurança, segundo o jornal South China Morning Post, que cita fontes policiais.