O dieselgate ainda está na memória de todos. Vários construtores, de grupos europeus e norte-americanos, abusaram e pisaram o risco, tudo para vender mais veículos com investimentos inferiores, reforçando os lucros dos administradores e accionistas. Valeu-nos os norte-americanos, que têm organizações com poderes e competência para investigar, julgar e punir, de forma a desencorajar os prevaricadores. A Volkswagen foi o caso mais conhecido, mas esteve longe de ser o único.

Mas o dieselgate é apenas um exemplo, nem sequer sendo o mais perigoso, pois o caso dos airbags da japonesa Tataka, que equipa carros dos dois lados do Atlântico, além do Japão e Coreia do Sul, é ainda mais flagrante, pois se nos EUA os fabricantes se viram obrigados a realizar recalls à oficina, com a urgência que merecia a vida dos condutores e passageiros, postas em risco por airbags que podiam explodir, na Europa a preocupação e o ritmo das reparações foi outro, apesar de em alguns casos utilizarem o mesmo equipamento defeituoso. A diferença é devida ao facto de o recall por cá não ser público, tornando difícil identificar o proprietário, caso se trate do segundo ou do terceiro utilizador.

Finalmente, a situação promete mudar pois, segundo a Reuters, a Comissão Europeia aprendeu com os erros e ganhou novos poderes para tentar parar com abusos. Desde a passada quinta-feira, a UE passa a poder chamar veículos para verificação e proibi-los de circular nas estradas da União caso infrinjam, por exemplo, os limites de emissões.

Mas nem só da capacidade de verificar veículos em circulação vive a nova directiva, uma vez que, fiel à estratégia do pau e da cenoura para desincentivar os construtores que pretendem contornar as regras, a UE pode ainda aplicar multas de até 30.000€ por veículo em incumprimento – o que pode atingir valores astronómicos capazes de fazer as multas do dieselgate parecerem castigos menores. Isto além de proibir os veículos de circularem e de serem comercializados.

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Como está apostada em manter a ordem, a protecção do ambiente e a defesa dos cidadãos, Bruxelas pode ainda sobrepor-se às decisões de qualquer dos países que integram a UE caso considere que estes estão a ser demasiado “simpáticos” para os fabricantes em falta, potencialmente por possuírem fábricas no país, impondo-se e multando os prevaricadores de forma mais exemplar.

Para que tudo esteja operacional, Bruxelas vai investir 7 milhões de euros em dois laboratórios de ensaios e no respectivo pessoal. Isto não retira responsabilidade aos diferentes países de participarem activamente no controlo dos modelos que circulam dentro das suas fronteiras.

Há muitos pormenores que ainda é preciso conhecer, mas se tivermos em conta que em 2021 vão entrar em vigor as medições de consumos e emissões em condições reais de utilização (RDE), sistema destinado a confirmar os valores declarados pelos fabricantes a Bruxelas, sobre os quais são calculados em muitos casos impostos, é bem possível que esta nova directiva vá mexer com a indústria mais do que seria de esperar.