O Governo dos Açores garantiu “seis meses de trabalho árduo” para fechar o plano de negócios da SATA, acrescentando ainda não ter respondido a Bruxelas sobre a investigação em torno de recentes aumentos de capital da transportadora.
“Temos seis meses para trabalhar [o plano] com a União Europeia. Não vamos ter dois meses apenas porque há eleições [em outubro], é igual para todos. Não vejo ninguém a gritar a pedir o plano da TAP, por exemplo. (…) São seis meses de trabalho árduo”, declarou a secretária regional com a tutela dos Transportes, Ana Cunha.
A governante falava no plenário do parlamento açoriano, na Horta, e respondia a questões em torno da investigação aberta pela Comissão Europeia a apoios concedidos em anos recentes à transportadora aérea regional.
As consequências de tais apoios virem a ser considerados ilegais “são as que constam da legislação comunitária e são várias”, reconheceu a governante, acrescentando que “é absolutamente prematuro tecer considerações sobre se são ou não ilegais” porque “é um processo que corre”.
Bruxelas considera, “nesta fase”, que injeções de capital dos Açores na Sata são ajuda ilegal
Bruxelas deu à região um mês, a contar do fim de agosto, para responder às dúvidas levantadas, não tendo ainda o executivo respondido à Comissão. Foi também dado um prazo de seis meses a partir desse tempo para ser apresentado um novo plano de negócios para a SATA, trabalho que já estava a ser preparado antes da investigação e que a oposição pretende conhecer – mesmo sem as necessárias atualizações – antes das eleições nos Açores, marcadas para 25 de outubro.
Instada a comentar eventuais despedimentos na empresa, a governante reiterou: “Não está nos planos nem no propósito do Governo Regional dos Açores que haja despedimentos. É essa a certeza que podemos dar”.
As dificuldades financeiras da SATA perduram desde pelo menos 2014, altura em que a companhia aérea, detida na totalidade pelo Governo Regional dos Açores, começou a registar prejuízos, entretanto agravados pelos efeitos da pandemia do novo coronavírus, que teve umApes enorme impacto no setor da aviação.
O atual conselho de administração da transportadora açoriana tomou posse em janeiro e comprometeu-se a apresentar um plano estratégico e de negócios até ao final do primeiro trimestre do ano, mas a pandemia da covid-19 obrigou a uma reavaliação do documento.
Oposição critica contas e gestão da SATA, PS fala em situação complexa
A oposição açoriana criticou a gestão e as contas da transportadora aérea regional, com o PS, que apoia o executivo, a falar numa “situação complexa” e a lamentar que a SATA seja usada “como arma de arremesso político”.
O parlamento açoriano debate esta quarta-feira, a pedido do CDS, a situação dos transportes e acessibilidades no arquipélago, com a SATA a dominar boa parte do debate entre as várias forças políticas.
Pelo Governo dos Açores, tem falado no debate a secretária regional com a tutela dos Transportes, Ana Cunha, e também a secretária com a tutela do Turismo, Marta Guerreiro, tendo o deputado único do PPM, Paulo Estêvão, criticado a ausência no hemiciclo do chefe do executivo – e líder do PS/Açores -, Vasco Cordeiro.
“Vasco Cordeiro está ausente enquanto anda a apresentar listas do PS nas várias ilhas” com vista às próximas eleições nos Açores, marcadas para 25 de outubro, disse Paulo Estêvão.
O monárquico sublinhou que a “situação de falência da SATA é anterior à covid-19” e reiterou ainda outras preocupações específicas com a ilha do Corvo, por onde foi eleito, nomeadamente o transporte marítimo de mercadorias e o transporte de gado para fora da mais pequena ilha dos Açores. “Todas estas matérias não estão relacionadas com a covid, estão relacionadas com a vossa incompetência”, declarou, dirigindo-se ao executivo e ao PS.
O CDS, que agendou o debate, considerou hoje que o executivo regional, socialista, “falhou nas políticas de acessibilidades e transportes”, deixando neste campo um legado de “impreparação, desorientação e, muitas vezes, caos”. “Os açorianos sabem que este governo falhou nas políticas de acessibilidades e transportes. Este governo e esta maioria não foram, em mais de 20 anos, capazes de concretizar uma estratégia integrada de transportes que garantisse a mobilidade dos açorianos e respondesse aos desafios da nossa economia. Nos transportes e acessibilidades o legado deste governo foi, ao longo dos anos, a impreparação, a desorientação e, muitas vezes, o caos”, declarou o líder centrista, Artur Lima.
Já o PSD, pelo deputado António Vasco Viveiros, advogou que “a desastrosa situação financeira do grupo SATA no final de 2019, com um passivo de 465 milhões de euros” e “com capitais próprios negativos de 230 milhões de euros”, é “motivo de muita apreensão”.
“A responsabilidade pelos resultados decorre, sobretudo, das opções políticas de Vasco Cordeiro, que contam com sucessivos e graves erros. Neste contexto de desastre financeiro, o governo não conseguiu adiar por mais tempo o que todos sabiam há muito ser inevitável: um pedido de autorização a Bruxelas para ajudas de estado”, prosseguiu o parlamentar.
À esquerda, o líder do BE nos Açores, António Lima, voltou a defender que “esconder o plano” de negócios da SATA “é um golpe na democracia”, mais a mais antes de eleições na região. “Senhora secretária, faça aquilo que é a sua obrigação e divulgue o plano. Se há algo que os efeitos da pandemia vieram demonstrar é a importância de termos um setor público com capacidade de resposta às necessidades de cada momento. Isso também se reflete no transporte aéreo”, sublinhou o parlamentar.
O PCP, pelo deputado único João Paulo Corvelo, criticou por seu turno as “políticas de esquecimento, desinteresse e desinvestimento nas ilhas pequenas” dos Açores, que “têm consequências” como “a perda de população, nomeadamente da população mais jovem e mais qualificada a que urge por termo”. E concretizou: “A política de desinvestimento, de não pagamento das verbas devidas e de atirar a SATA para um buraco financeiro que permita ao Governo vir sustentar junto da opinião pública que a SATA é ingovernável enquanto empresa pública, e como tal apenas a sua privatização pode tornar viável a empresa, é para nós, PCP, não só uma política criminosa como conduzirá a breve trecho à ruína da SATA”.
O PS, que apoia o executivo e tem maioria absoluta no parlamento dos Açores, sublinhou que desde 2009 a SATA foi “30 vezes debatida” no hemiciclo e já mereceu duas comissões de inquérito. “A SATA nos últimos anos” é mais utilizada “como arma de arremesso político do que outra coisa qualquer”, declarou José Ávila. Contudo, o socialista reconheceu a “situação complexa da empresa”, na qual “nem tudo correu bem” recentemente.
“Mas queremos que se reconheça que uma parte do que correu mal se deveu a fatores externos à empresa”, acrescentou Ávila, dando como exemplos as oscilações do preço do petróleo, o impacto das greves, a crise das dívidas soberanas ou a atual pandemia de covid-19.
O plenário do parlamento dos Açores está esta semana reunido pela última vez antes das eleições regionais marcadas para 25 de outubro.