A Entidade Reguladora dos Serviços Energéticos (ERSE) alertou para o risco de a subsidiação dos custos de produção de gases renováveis poder afetar a sustentabilidade económica do setor, que já é delicada face aos esforços para a descarbonização.

“Prevê-se a possibilidade de reflexão de custos de política energética, de sustentabilidade ou de interesse económico geral (CIEG) no sistema tarifário do gás natural, também através de portaria. […] A ERSE é contrária à introdução destes mecanismos no setor do gás natural que tem permanecido, ao contrário do setor elétrico, imune à introdução de CIEG”, defendeu o regulador. A posição da ERSE foi transmitida num parecer enviado ao Governo, a propósito da transposição para o sistema jurídico português da diretiva europeia que estabelece regras comuns para o mercado interno do gás natural e que prevê a incorporação de gases renováveis, com data de 03 de julho, tornado público esta semana.

“A ERSE realça a sua preocupação com os aspetos da sustentabilidade económica do setor, já delicada no contexto da descarbonização e globalização. Qualquer introdução de novos custos que prejudiquem a competitividade do gás natural em Portugal, afeta decisivamente segmentos de consumo fortemente expostos a fatores concorrenciais, quer de concorrentes noutros países, quer também de outros vetores energéticos”, acrescentou. No documento enviado ao Governo, o regulador manifesta-se também contra a hipótese de ser um membro do Governo, neste caso o titular da pasta da Energia, a decidir sozinho sobre os apoios à produção de gases renováveis, onde se insere o hidrogénio verde. “A regulamentação de todos estes aspetos, inclusive de forma combinada, através de portaria de um único membro do executivo corresponde a um fenómeno de deslegalização e vem permitir, inovadoramente, a introdução de custos não respeitantes diretamente às atividades reguladas no sistema tarifário”, apontou.

O regulador da energia considerou ainda que as transferências do Fundo Ambiental ou outro externo ao setor, no âmbito daqueles apoios, são essenciais para evitar impactos nos custos de fornecimento de gás a clientes finais. No entanto, sublinhou que “não pode ser ignorado o risco da concretização do financiamento pelo Fundo Ambiental”, dependente das restrições anuais fixadas pelo Orçamento do Estado.

PUB • CONTINUE A LER A SEGUIR

No dia 14 de agosto, o Presidente da República, Marcelo Rebelo de Sousa, promulgou o diploma que estabelece o funcionamento do sistema nacional de gás, mas chamou à atenção para as observações do regulador, nomeadamente, quanto aos custos futuros. “O Presidente da República promulgou o diploma do Governo que estabelece a organização e o funcionamento do sistema nacional de gás e o respetivo regime jurídico e procede à transposição da Diretiva 2019/692”, lia-se numa nota publicada no ‘site’ da presidência. No entanto, Marcelo Rebelo de Sousa chamou à atenção para as observações da ERSE, “e nomeadamente quanto aos custos futuros do sistema nacional de gás, incluindo, naturalmente, a introdução de novas componentes de rendibilidade a ser comprovada”, uma matéria que defendeu carecer de ponderação “no momento de se aplicar o atual regime genérico”.

Em 09 de julho, o Conselho de Ministros aprovou o decreto-lei que estabelece o funcionamento do sistema nacional de gás, criando as condições para a produção de gases renováveis, com baixo teor de carbono e para incorporação destes no sistema. O diploma em causa cria as condições para o desenvolvimento e regulação das atividades de produção de gases de origem renovável, com baixo teor de carbono e para a incorporação destes no sistema nacional de gás. Adicionalmente, fica assegurada a neutralidade para os consumidores “da injeção de outros gases no sistema, através do fundo ambiental”, que é reforçado com as receitas tributárias que resultem da cessação das isenções ao imposto sobre produtos petrolíferos e energéticos e ao adicionamento sobre as emissões de carbono da utilização de gás natural.

“Com este decreto-lei, o Governo dá mais um passo na direção de atingir uma economia neutra em carbono em 2050, conforme previsto no roteiro da neutralidade carbónica para 2050, ao mesmo tempo que incentiva um novo setor de atividade, cria novas oportunidades de investimento e desenvolvimento económico sustentável e responsável e cumpre o seu desígnio de assegurar uma transição justa para todos”, lê-se no documento.