A premissa era simples: unir uma comunidade sob o mesmo credo — o do cesto e da bola — de norte a sul e devolver-lhe o espaço na cidade para que esta pudesse florescer. Mas, jogada após jogada, iniciou-se um movimento maior: a arte e a prática desportiva fundiram-se, os campos passaram a telas. A missão vai além do estético, é agora social. São pessoas, vizinhos, miúdos, artistas, jogadores, bairros e ruas que se juntam pelo amor ao basquetebol e à arte, pela mão da Hoopers, uma plataforma comunitária incubada na Startup Lisboa, cofundada por André Costa.

“O meu background está essencialmente ligado a duas áreas, a de consultoria estratégica e ao universo das startups, mas isto acabou por acontecer como um acaso”, esclarece. O avô, o pai e ele fizeram a bola rolar em campo e o jogo acabou sempre por estar presente. Foi essa, aliás, a razão que o levava sempre a procurar um campo, fosse onde fosse.

“No começo, olhámos para uma dificuldade que a comunidade sentia, que era encontrar campos para jogar. Isto começou quando vivi no Brasil e não conseguia encontrar um sítio onde jogar”, diz o corresponsável pelo projeto.

“Quando falámos com a comunidade em Portugal, percebemos que havia muita gente com o mesmo problema. Em Lisboa, por exemplo, toda a gente aponta para quatro ou cinco campos, mas há mais de 20. Isto é porque a informação não chega às pessoas.” Parte desse problema foi a solução que ele e Hugo Botelho, o segundo fundador, descobriram.

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Arrancaram com o projeto em outubro de 2019, focados em fazer da Hoopers um agregador de todos os que – -como eles — levavam aquele desporto ao peito. Notícias, conteúdos, e-commerce, um modelo de subscrição que nos entrega artigos ligados ao desporto em casa — começou tudo a erguer-se na plataforma pela mão dos dois e de todos os que têm trabalhado “de forma participativa e comunitária”.

Falta-lhes o investimento, aponta André, mas há interesse. “Estamos a falar com alguns investidores, nomeadamente business angels, para saber com o que podemos contar para desenvolver”.

A missão da Hoopers é unir os fãs de basquetebol de norte a sul do país

Isso não os impediu de avançar. Recorreram a capitais próprios e foram aos poucos sinalizando os campos que encontravam, partilharam a informação mas, com a epopeia, veio uma nova problemática, a do estado de conservação de cada recinto. “Muitos deles estão degradados ou muito degradados, o que é natural, mas isso era mais uma dificuldade com a qual teríamos de lidar”.

Aproveitaram a ideia que em 2009 deu a Paris um dos seus marcos artísticos, o campo Pigalle Duperré, resultado da colaboração entre o fundador da marca Pigalle, Stephane Ashpool, e a norte-americana Nike, e iniciaram atividade.

“Começámos a pensar numa forma de alterar esta situação e, ao mesmo tempo, dar sequência a um movimento que tem vindo a ser criado, de transformar campos icónicos, combinando a arte urbana com a prática desportiva”, explicou.

Tropeçam no trabalho de Pedro Campiche (AKA Corleone) no Campo Mártires da Pátria, em Arroios, já com a ideia bem delineada. Mas chegaram tarde. “A ideia já estava em prática e a intervenção também. Ajudámos na ativação do campo junto da comunidade mas ficámos com a ideia de que, pela projeção, fazia sentido iniciarmos nós esse caminho”. Volvido pouco mais de um ano, seria Braga o palco da primeira jornada de intervenção em espaço público da Hoopers.

Luís Rodrigues, diretor executivo da Startup Braga, foi a porta de entrada para o trabalho, esclarece André. “Ligou-nos pouco depois da intervenção de Lisboa e fomos visitar três espaços. Analisamos a documentação e avançou-se com a intervenção naquele que tinha sido o segundo”. Aí, a visão seria sempre uma mudança que abrangesse não só a vertente desportiva mas também a social do espaço, tornando o polidesportivo de São José nas Enguardas, freguesia de São Victor, no maior campo artístico contínuo da Europa.

Mil metros quadrados, sete tabelas, campos de 3×3, 4×4, 5×5, uma shooting line para treinar lançamentos e uma capacidade plena para 40 pessoas. “Quando me enviaram a fotografia do campo, percebi que tinha as dimensões de uma tela”, diz Rodrigo Guinea, o artista portuense que assina como Contra, parte do coletivo Rua. A estética foi de encontro às condições, segundo Rodrigo.

Foi Rodrigo Guinea, o artista portuense que assina como Contra e que faz parte do coletivo Rua que fez a arte do campo de Braga

“Sendo o campo num bairro, maioritariamente com cores mortas, escolhi cores vibrantes para fazer um contraste”, mas o trabalho do artista de 35 anos acabou por beber dessa simbiose.

“O meu trabalho foca-se na arte abstrata e fiz uma composição com isso em mente. E acabou por ser um trabalho de grandes dimensões, não tinha pintado nada acima dos 400 metros quadrados, portanto acabei por ficar contente com o convite e com o resultado.”

A comunidade saiu à rua, viu os trabalhos arrancarem, envolveu-se. Mas era preciso dar corpo musical à ideia. “Pedimos ao Maze que fizesse um beat de 30 segundos mas ele disse-nos que andava a preparar uma coisa e que esta era a oportunidade para lançar. Passaram-se uns dias e recebemos o resultado final. Ficámos extremamente contentes”.

[Veja o vídeo de lançamento do campo de Braga, com interpretação do músico MAZE]

A Câmara Municipal de Braga também percebeu o impacto. Com o polidesportivo em transformação, seguir-se-iam os espaços adjacentes, “coisas que originalmente nem estavam pensadas mas que tinham um cariz importante como transformar o espaço acessível a pessoas de mobilidade reduzida”, denota André Costa. O campo abriu portas oficialmente a 10 de setembro.