O ex-presidente da Associação de Utilizadores do Sistema de Tratamento de Águas Residuais de Alcanena (AUSTRA) Fernando Fernandes foi esta quinta-feira condenado pelo Tribunal de Santarém a cinco anos e quatro meses de prisão e ao pagamento de 960.000 euros.

No acórdão esta quinta-feira proferido pelo tribunal criminal de Santarém, Fernando Fernandes foi condenado pela prática de um crime de peculato, de que vinha acusado pelo Ministério Público, tendo ainda sofrido a pena acessória de inibição do exercício de cargos similares ao que ocupava na AUSTRA por um período de três anos e oito meses.

A juíza que presidiu ao coletivo, Raquel Rolo, afirmou que o tribunal ficou “impressionado” pelo crime e pela forma como foi praticado, com o arguido a apropriar-se de dinheiro da associação para financiar as suas próprias empresas, e mais ainda pelo comportamento de Fernando Fernandes.

Raquel Rolo sublinhou que, na declaração que quis fazer ao tribunal, no passado dia 1, o arguido defendeu a sua atuação no processo, não demonstrando qualquer interiorização da gravidade do seu comportamento nem vontade de pagar uma dívida que reconheceu ter para com a AUSTRA.

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Ex-presidente da AUSTRA assume que usou dinheiro da associação em investimentos próprios

A juíza referiu o facto de, ao invés de querer mostrar ser “um cidadão exemplar” que vai trabalhar e pagar o que lhe for possível, Fernando Fernandes ter declarado ao tribunal que se limitava atualmente a transportar os filhos da sua companheira, não trabalhando para que não lhe retirassem o que viesse a auferir.

Considerando este comportamento “completamente inaceitável”, a juíza afirmou não haver outra forma de o arguido compreender a gravidade do seu comportamento senão privando-o da liberdade, para refletir na maneira de servir melhor a sociedade ao invés de colocar o seu interesse pessoal acima do interesse público que deveria ter servido.

O tribunal criticou a “leviandade” com que os restantes membros do Conselho de Administração permitiram que fossem usadas verbas da instituição — mesmo que acreditando que se destinavam a obter rendimentos para a associação — sem o conhecimento dos associados nem da comunidade.

A crítica estendeu-se ao anterior presidente da Câmara de Alcanena Luís Azevedo pelo facto de ter continuado a assinar cheques da AUSTRA já depois de ter cessado funções no município, em sequência das eleições autárquicas de 2009, nas quais foi eleita a atual presidente, Fernanda Asseiceira, bem como ao banco que permitiu que isso acontecesse, num “conjunto de facilitismos” que considerou incompreensíveis.

A juíza realçou que a condenação ao pagamento dos 960 mil euros ao Estado acontece sem prejuízo do direito de a AUSTRA se ver ressarcida dessa verba e sem duplicar a condenação de que já foi alvo na ação cível.

Fernando Fernandes assumiu em 2007 a presidência da AUSTRA (associação que integra maioritariamente industriais de curtumes e também o município de Alcanena), tendo começado em 2008 a investir dinheiro da associação, com o acordo dos restantes elementos do conselho de administração, que, contudo, desconheciam como aplicava as verbas.

Fernando Fernandes contou que o dinheiro que ia solicitando era utilizado para negócios realizados pelas suas empresas, admitindo que esta era uma forma de não ter de recorrer à banca, evitando demoras e burocracias, mas que, até meados de 2009, devolvia o dinheiro e os respetivos juros, superiores aos que a associação obteria se colocasse o dinheiro em contas a prazo.

O antigo administrador afirmou que o valor em dívida decorre de um acordo feito em setembro de 2009, no qual ficou estabelecido que passaria a reembolsar o dinheiro num prazo de três anos.

Para o arguido, o ultimato que lhe foi feito pelo administrador António Carvalho (assistente no processo) em março de 2012, para devolver de imediato o dinheiro em dívida, aconteceu porque aquele estava preocupado por Fernanda Asseiceira estar a “querer saber mais”.

Foi a auditoria pedida pela administração em 2012 que esteve na origem da queixa apresentada pela associação junto do Ministério Público e que deu origem ao presente processo. A juíza referiu o facto de o crime ter sido praticado com dolo direto e revelar um “elevado grau de ilicitude”, havendo um “dever de prevenção enorme”.