O maior desafio do primeiro dia de aulas a sério em Vinhais foi esta sexta-feira fazer chegar os alunos a horas à escola num concelho com mais de 30 circuitos onde faltam transportes para cumprir as regras da pandemia.

O dia começou quase de madrugada, nomeadamente para alunos e transportadores que tiveram de se desdobrar em viagens para garantir que todas as crianças e jovens estavam antes das 9h00 na escola.

No concelho de Vinhais, no distrito de Bragança, há 500 alunos que têm de ser transportados e que caberiam em uma dúzia de autocarros, mesmo cumprindo o distanciamento físico e a redução de lotação imposta pela contenção da pandemia de Covid-19.

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Mas neste, como noutros concelhos do Nordeste Transmontano, pesam na equação matemática outros fatores, como a dispersão da população e as distâncias, que obrigam a uma logística complexa. Às dificuldades de sempre, juntou-se neste ano letivo a pandemia, que obriga o taxista Mário Jorge a fazer duas vezes de 50 quilómetros cada para transportar cinco crianças das aldeias de Santa Cruz, Fresulfe e Dine para a sede de concelho.

O taxista faz circuitos escolares há mais de uma década numa viatura com sete lugares, que este ano só pode transportar um máximo de três crianças por viagem. Leva primeiro três e depois tem de ir buscar mais duas.

A estrada, como partilhou com a Lusa, “é difícil”, com curva contra curva entre a imensidão de soutos a anunciarem as castanhas no concelho que é um dos maiores produtores nacionais.

Mário Jorge tinha adjudicado o serviço para um percurso e agora tem de fazer o desdobramento, pelo que o que espera é receber pelas duas viagens que faz.

Na primeira viagem desta nova época, faltava um quarto de hora para as 8h00 quando apanha a primeira aluna, em Santa Cruz, e segue para Fresulfe onde o esperam mais dois alunos observados pela mãe, que não esconde a apreensão com a situação atual.

“Tenho medo”, desabafa Cristina Afonso, visivelmente emocionada. Não é o transporte que a preocupa, é este “vírus”, o novo coronavírus que cria um dilema nos pais. “Não é fácil” deixar os filhos ir para a escola, mas “ficar em casa também não há condições”.

Ainda não eram 7h00 quando dois pequenos da zona de Lomba saíram de casa no autocarro onde aguardaram durante meia hora num cruzamento por outros colegas transportados em táxis. É neste cruzamento que o autocarro fica à espera que três táxis e uma carrinha da Câmara Municipal façam as várias viagens e desdobramentos necessários para reunir os alunos que hão de seguir para a sede de concelho, a 30 quilómetros.

Neste território as distâncias em quilómetros são sempre multiplicadas pela curvas que rasgam as montanhas e não deixam andar depressa. As duas primeiras crianças que esperaram pelos colegas no autocarro desde as 7h00 serão as últimas a chegar a casa, depois das 19h00.

Este primeiro dia de aulas começou também quase de madrugada para o presidente da Câmara de Vinhais, Luís Fernandes, que foi para o terreno garantir “empenho para que tudo corra bem” e verificar eventuais necessidades de reajustamentos.

“Com o sacrífico de todos, dos encarregados de educação, dos pais, dos alunos, dos transportadores, dos professores e do agrupamento, conseguimos criar condições para que seja possível que os alunos cheguem a horas, apesar de todas estas dificuldades”, afirmou.

Ao todo, estiveram em viagens até às 9h00 cinco autocarros e 24 táxis, numa “operação logística com bastante dificuldade tendo em atenção os desdobramentos que é preciso fazer para cumprir as normas da lotação”, como salientou o autarca.

“Estamos a conseguir cumprir as normas com muita dificuldade porque temos aqui muita dificuldade ao nível de transportadores, são muitos circuitos, é um concelho muito grande, obriga-nos a uma grande logística e a uma operação para conseguir cumprir essas normas”, vincou.

O autarca e a Comunidade Intermunicipal (CIM) Terras de Trás-os-Montes já comunicaram ao Governo estas dificuldades, sem que ainda tenham obtido resposta.

O desdobramento dos transportes escolares para cumprir as regras sanitárias da pandemia quase que duplica o custo do município com este serviço, tendo em conta que nos anos anteriores a despesa rondava os 200 mil euros e este ano ultrapassará os 350 mil euros. “Era fundamental que o Governo nos ajude porque isto acarreta para estes municípios encargo financeiros muito superiores àquilo que era normal”, considerou.

O acréscimo nas despesas com a educação vai para além dos transportes escolares e reflete-se também no pessoal e refeições escolares. Tudo somado, Vinhais calcula que os cerca de 300 mil euros anuais para a educação irão disparar para “perto de meio milhão de euros”. “Para um município como o de Vinhais é muito significativo”, sublinhou.