Uma biografia ilustrada sobre o músico António Variações, pensada para todos os públicos, é editada esta semana e revela uma nova interpretação do que foi a vida daquele artista, disse à Lusa o autor, Bruno Horta.
“O António Variações tem sido entendido como um artista que se expressou de forma criativa, que tinha definido um objetivo e que se inseria numa espécie de abertura cultural e estética que houve no início da década 1980, em Lisboa, sobretudo. E penso que isso não é inteiramente assim”, afirma Bruno Horta.
O jornalista foi desafiado pela Suma de Letras a escrever uma biografia sobre António Variações, para se juntar a outros títulos já lançados pela editora, pensados para jovens e adultos, e dedicados, por exemplo, ao guitarrista Zé Pedro e ao cantor Freddie Mercury.
Cruzando várias fontes documentais, pesquisas e depoimentos de pessoas que conheceram o músico, Bruno Horta concluiu que António Variações “procurou a expressão artística como algo fundamental para si, não inserido numa corrente estética nem em algo que pudesse ser visto”.
“Era uma pessoa muito solitária, arisca, não gostava de pensamento de grupo. Dificilmente ele fez parte deliberadamente dessa movida lisboeta da década de 1980, era uma pessoa muito à margem de tudo”, considerou Bruno Horta.
Com ilustrações de Helena Soares, António Variações — Uma biografia é “uma leitura possível sobre os factos” da vida do músico, narrados ao longo de 140 páginas, sublinha o jornalista.
“Temos tendência para a olhar para o António Variações como artista. É óbvio que é a faceta dele que se tornou pública. Eu tentei demonstrar que há um antes e um depois de 1976, ano em que regressa a Portugal depois de ter vivido em Amesterdão. É a partir dessa altura que o António Rodrigues Ribeiro dá lugar inteiramente ao António Variações, embora só venha a editar três ou quatro anos depois”, explica.
Na pesquisa para este livro, Bruno Horta encontrou ainda uma breve referência a António Variações nos arquivos da polícia política do Estado Novo, num documento de janeiro de 1968 sobre a “identidade completa e o porte moral e político” do pai do músico, por ter exercido funções públicas.
“Fui procurar se haveria algum registo da PIDE sobre o António Rodrigues Ribeiro, nada de extraordinário, embora a divulgação desse documento seja uma coisa nova. A família está referenciada. Há um relatório em que eles foram perceber qual era o calibre moral daquela família”, recorda Bruno Horta.
No livro, o autor recorda que o relatório faz referência a cada elemento da família, incluindo António Variações, concluindo que, aos olhos da PIDE, “não criam obstáculos à ação do Estado Novo”.
Na biografia, Bruno Horta entrelaça factos biográficos, declarações de António Variações recolhidas na imprensa da altura e letras de várias canções. O livro termina com uma cronologia e as fontes bibliográficas.
António Variações morreu a 13 de junho de 1984 e Bruno Horta recorda que houve uma redescoberta do trabalho do músico sobretudo depois da morte.
“Hoje, em 2020, olhamos para o António Variações como alguém que expressou a sua autenticidade, foi muito íntegra consigo mesma. Na época era descrito como excêntrico. Ele é visto hoje como uma pessoa que viveu com uma integridade muito grande”, resumiu Bruno Horta.