Às vezes há jogos assim, em que dois ou três lances ilustram bem o que foram os 90 minutos e o que são os diferentes futebóis jogados por duas equipas em campo — como se verificou esta quinta-feira, no encontro entre Sporting e Aberdeen para a terceira pré-eliminatória da Liga Europa, vencido pelos leões (1-0).

Aos 28 minutos, vendo uma bola chegar ao lado direito da sua defesa e mesmo sem grande pressão, Tommy Hoban, defesa-central do Aberdeen de 1.89m e mais de 80 quilos, tenta um alívio com um chutão. Sai uma rosca à antiga.

Dez minutos depois, continuando em vantagem por 1-0 numa eliminatória de jogo único, o Sporting está instalado no meio-campo dos escoceses. Os centrais trocam a bola sem grandes pressas e sem pressão, junto à linha de meio-campo. E o adversário, em desvantagem, vai assistindo à “bola cá bola lá” com toda a equipa recolhida ao meio-campo defensivo.

Acrescentem-se outros dez minutos e aos 48′, já a segunda parte a disputar-se, o lateral-esquerdo escocês de 33 anos, Andrew Considine, apoia-se num adversário do Sporting para subir nas alturas e cabecear. O árbitro marca falta e todo o conjunto escocês, agastado pelo apito que já soara várias vezes em lances do tipo, indigna-se em protestos.

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Sporting CP v Aberdeen FC - UEFA Europa League Third Qualifying Round

Vietto (Sporting) e Hoban (Aberdeen) na luta pela bola (@ Pedro Fiúza/NurPhoto via Getty Images)

É possível que na Escócia, com árbitros escoceses e frente a adversários escoceses, este futebol resulte: os duelos corpo a corpo permanentes, a força e a ausência de rodriguinhos técnicos como estilo de jogo, os passes longos e em muitos casos aéreos, o contra-ataque com o galês Ryan Hedges a fazer uso da boa canhota e da velocidade para ferir os adversários.

Esta quinta-feira, no Estádio José Alvalade e em jogo a contar para a terceira pré-eliminatória de acesso à fase de grupos da Liga Europa, o futebol português e o futebol escocês chocaram. Uma equipa tentou trocar a bola de pé para pé, com passes curtos, tabelas e paciência à procura de espaços no reduto adversário; a outra sentiu-se confortável sem bola, aproveitando o contra-ataque e momentos esporádicos para acelerar rumo à baliza de Antonio Adán.

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Por um lance, a estratégia escocesa quase dava frutos, quando no fim da partida, aos 87 minutos, Hedges deu suores frios à equipa do Sporting. Depois de uma série de ressaltos aéreos, a bola acaba por sobrar à entrada da área para o galês, que recebe a bola e, antes de Neto se aproximar para intercetar, dispara violentamente de pé esquerdo. O remate quase rasou a baliza do guarda-redes do Sporting, contratado este verão a custo zero depois de terminar contrato com o Atletico de Madrid.

Até aí, a tranquilidade do Sporting foi mais ou menos constante — ainda que com pequenos sustos na segunda parte, período em que o Aberdeen finalmente abeirou-se mais regularmente da área de António Adán e obrigou os leões a cuidados. Na primeira parte, não foi nada disso que se viu: o Sporting reclamava a gestão do jogo com bola para isso (acabou com mais de 70% de posse) e usava muitas vezes o corredor direito e os vai-vem do espanhol Pedro Porro para pôr a defesa do Aberdeen em sentido.

A vantagem leonina ficou definida desde muito cedo, o que pode ter complicado a estratégia de um Aberdeen que, com seis jogos disputados no campeonato escocês e vendo um Sporting estrear-se em jogos oficiais esta época logo com nove jogadores impedidos de jogar por Covid-19, sonhava chegar à próxima ronda de acesso à Liga Europa, o playoff final que antecede a fase de grupos.

Surgindo com a surpresa Tiago Tomás no onze em detrimento de Sporar — mas com Jovane em posição mais central, rodeado de perto pelo jovem “TT” à direita e por Vietto à esquerda —, a primeira oportunidade resultou logo em golo. Aos 7 minutos, depois de uma recuperação de bola de Wendel no meio-campo ofensivo, a bola sobra para Vietto que temporiza até ver Tiago Tomás pedir-lhe o passe nas costas dos defesas. Servido sem mácula, “TT” recebeu com um toque e rapidamente armou o remate no interior da área, desviando do alcance do guarda-redes Joe Lewis.

Quem esperava uma reação contundente do Aberdeen após o golo enganou-se. Os escoceses continuaram com um bloco baixo, não pressionando os defesas do Sporting e deixando os leões fartarem-se de trocar a bola entre si. Sem grandes pressas, o Sporting ia circulando ao esférico e aproveitando a dinâmica ofensiva dada por Pedro Porro no flanco direito para desconcentrar os escoceses e abrir espaços na sua defesa.

Aos 40 minutos surge a segunda grande oportunidade do jogo, para o Sporting e curiosamente num lance de bola parada, onde os escoceses pareciam levar vantagem. Após canto batido por Nuno Mendes, a bola ressalta na sequência de um toque do defesa-central dos leões Feddal (contratado ao Bétis) e sobra para Jovane. O avançado, quase em cima da linha de baliza, tenta empurrar para o fundo das redes, mas o guarda-redes do Aberdeen estava muito perto e intercetou.

Sem grandes sustos para os dois guarda-redes, com tentativas de cruzamento infrutíferas de parte a parte, nova oportunidade surge aos 62 minutos mas desta vez para o conjunto escocês. Após subida pelo corredor esquerdo, Jonny Hayes abeira-se da área do Sporting e mal entra dispara de pé esquerdo à procura da baliza. Adán, contudo, só teve de defender com o olhar, dado que a bola saiu por cima da trave e sem perigo clamoroso.

Aos 68′, na área, Jovane esteve em boa posição para rematar e fazer o 2-0 mas apanhou mal a bola e fez a chamada rosca. Três minutos depois, o ala do Sporting Nuno Mendes pedia penálti num lance que as imagens televisivas não foram capazes de esclarecer, mas o árbitro nada assinalou.

Sporting CP v Aberdeen: UEFA Europa League Third Qualifying Round

Jovane num dos lances de perigo dos leões frente ao Aberdeen, esta quinta-feira, no Estádio José Alvalade (@ Carlos Rodrigues/Getty Images)

O desgaste (ou seria a desconcentração?) pareceu começar a apoderar-se dos jogadores do Sporting, com o duo Matheus Nunes e Wendel a deixar de controlar as operações no meio-campo com sucesso e com os três avançados a não conseguirem definir com qualidade nem partir em contra-ataque. E nem as substituições (Plata no corredor direito em troca com Porro, Daniel Bragança em vez de Wendel e Sporar em vez de um desgastado Tiago Tomás) resolveram o problema.

Os jogadores do Aberdeen ainda acreditaram e Coates e Feddal ainda tiveram tempo para dois cortes vistosos, no limite. Ainda assim, houve pouco Aberdeen para as fragilidades de um Sporting que não poderá ter as mesmas veleidades na segunda-feira, na Mata Real, quando enfrentar o Paços de Ferreira para o campeonato português.