A criação artística nacional e a divulgação da história da dança são os “eixos fundamentais” da nova temporada da Companhia Nacional de Bailado (CNB), gerida apenas para os próximos três meses, numa situação “atípica” criada pelos constrangimentos da pandemia.

“A programação para 2021 já estava delineada, mas o Opart [Organismo de Produção Artística, que tutela a companhia nacional] optou por anunciar só até dezembro, de forma a gerir o contexto da pandemia, e também as expectativas do público”, explicou a diretora artística da companhia, Sofia Campos, entrevistada pela agência Lusa.

Forçados a uma paragem total desde março, devido ao confinamento decretado pelo Governo para travar a progressão do coronavírus, os bailarinos da CNB só voltaram ao palco em julho, no evento ao ar livre Festival ao Largo, no palácio da Ajuda, em Lisboa.

“É um ano atípico que nos obrigou a fazer reagendamentos de alguns espetáculos do início do ano agora para a rentrée, e para 2021, e também a repensar algumas fórmulas adquiridas”, apontou a responsável, dando o exemplo de “Planeta Dança – Segundo Capítulo”, remarcado para outubro e novembro, e “Dançar em Tempo de Guerra”, que subirá ao palco em fevereiro de 2021 porque os bilhetes já tinham sido vendidos ao público.

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Mesmo em circunstâncias adversas para o setor cultural que a pandemia causou, e em particular no setor da dança, pois os bailarinos precisam de muito espaço para manter o seu nível de qualidade física e técnica, Sofia Campos quis prosseguir o que considera serem os “eixos fundamentais” do trabalho da CNB.

Um deles é “o incentivo à criação artística nacional”, espelhado na nova temporada, agora divulgada até dezembro, e que contempla a estreia de cinco novas criações coreográficas, quatro delas assinadas por portugueses: Marco da Silva Ferreira, Filipe Portugal, Sónia Batista, Miguel Ramalho, Xavier Carmo e Luís Marrafa. “Estas escolhas que recaíram sobre novas criações praticamente todas de coreógrafos nacionais, são um sinal de confiança que queremos dar ao setor da dança, para dizer que estamos atentos ao que se está a passar no país”, sublinhou a diretora da CNB à Lusa.

Também simbolicamente o programa que irá marcar o regresso da companhia ao Teatro Camões intitula-se “Primeira Vez”, com um programa de novas criações dos coreógrafos Marco da Silva Ferreira e de Filipe Portugal, que será também apresentado em Faro, em novembro, no Teatro das Figuras.

“Queremos abrir as portas ao público novamente de forma muito segura, seguindo todas as exigências e normas da Direção-Geral da Saúde, o que será igualmente emocionante para os bailarinos, que anseiam subir ao palco”, salientou.

Sofia Campos comentou, sobre o estado emocional do elenco, que “estas paragens prolongadas, em espaços pequenos, têm consequências severas no corpo dos bailarinos, porque precisam de treino diário intenso para manter o seu desenvolvimento físico e técnico, além de gerarem alguma ansiedade”.

“A carreira de um bailarino é muito curta. Este é um momento muito exigente, porque uma paragem assim prolongada pode prejudicá-la bastante”, comentou, sobre o impacto do confinamento.

O regresso ao edifício – o estar juntos sem se poderem tocar – foi captado em imagens por Paul E. Visser, num documentário encomendado pela CNB, e coproduzido pela RTP, registando esse trabalho diário dos bailarinos em contexto de adaptação às novas regras de distância social, já designada “novo normal”.

Esse filme – intitulado “Bow” – será exibido no programa “Trabalhos de Casa”, em novembro, que junta criações da dupla de coreógrafos Xavier Carmo/Henriett Ventura (“Algo_Ritmo”) e Miguel Ramalho (“Symphony of Sorrows”), estreadas no Festival ao Largo, em julho, mas pela primeira vez agora no Teatro Camões, sendo que Miguel Ramalho assina o primeiro trabalho para a companhia nacional.

Outro eixo a que Sofia Campos pretendeu dar seguimento nesta temporada é a área da história da dança, “ainda tão desconhecida do público”, através do programa “Planeta Dança – Uma história da dança em capítulos”, criado por Sónia Baptista, destinado ao público infanto-juvenil e a famílias. O primeiro capítulo será apresentado em Almada, em outubro, no Teatro Municipal Joaquim Benite, e o segundo capítulo foi reagendado para outubro e novembro no Teatro Camões, em Lisboa. “A ideia é, assim que for possível, circular com estes espetáculos sobre o património da dança noutros pontos do país”, revelou.

Para o final do ano, também devido às atuais circunstâncias da pandemia e às incertezas quanto à sua progressão no inverno, a CNB não irá apresentar a sua tradicional produção de Natal clássica. “Infelizmente, neste quadro, não podemos este ano produzir um grande espetáculo clássico de Natal”, disse, acrescentando que a programação contempla, contudo, coreografia em “pas de deux”, através do programa “Noite Branca”. Neste programa de Natal estarão duas novas criações, uma de Luís Marrafa – “Snow” -, coreógrafo português sediado em Bruxelas, que pela primeira vez trabalha para a CNB, outra encomendada a Yannick Boquin – “Shostakovitch pas de deux” -, e um clássico do mestre de bailado norte-americano George Balanchine (1904-1983) (“Concerto Barroco”, 1941).